Viver sob democracia significa aceitar diferenças, pressupõe submeter-se à regra da maioria, observados controles democráticos necessários para que essa maioria não se transforme em aniquilação dos demais.
A maioria, expressa no ciclo eleitoral, é a magia desse sistema, que permite ao Estado ir se conformando às demandas da sociedade, reconfigurando seu papel, continuamente, porque o Estado não é um fim em si mesmo, mas expressão do Direito para organizar a vida em conjunto.
Os controles sobre o poder, portanto, são fundamentais para evitar que maiorias – transitórias por natureza – assenhorem-se do Estado com finalidades indevidas. Devemos cuidar para que esses controles operem com altivez e independência, guiados pelo Direito, para que os desviantes sejam coarctados.
Somente o Direito pode controlar e conduzir a força. A Constituição não é uma pessoa, nem uma seita: ela representa um consenso mínimo que nos faz a todos integrantes de um mesmo país. A interpretação de suas regras nos compete a todos; mas a última palavra é da Suprema Corte. E a revisão de suas decisões se faz por intermédio das próprias regras do Direito. Não podemos transigir com essas regras básicas.
Um sistema com essa conformação resiste à mudança. E resistir não é ruim, sobretudo quando se trata de limitar o poder.
Quando cessa o diálogo, cessa a razão, irrompe a intolerância. Matilhas salivam contra honras e reputações. Mudam ao sabor do vento a direção de seus ataques. Esse estado de coisas necessita de um basta. BASTA!
O exercício diário da tolerância – sobretudo do diálogo – é o que permite convivermos com aquilo que não nos é familiar. Toleramos posição contrária à nossa na expectativa de que logo será a nossa vez, ou, ao menos, o momento de tentarmos, mediante eleições livres e justas, escolhermos os nossos pontos de vista.
Quais nossos pontos de vista? Os mais diversos possíveis que se apresentem numa sociedade aberta. Com uma exceção: essa tolerância não pode admitir que atentem contra esse sistema, para ficar numa palavra em voga. Nisso reside o paradoxo da intolerância, formulado por Karl Popper: há uma fronteira para aceitar a diferença, e essa fronteira se estabelece justamente quando se coloca em risco a pluralidade que as nossas instituições, mesmo com todas suas falhas e defeitos, significam para nos garantir.
Não aceitaremos que esses limites sejam esgarçados, a que pretexto seja.
O poder do Estado, que funciona como um guia para produzir a força de uma nação, se mal-usado a conduzirá ao precipício. Assistimos atônitos a essa condução até este momento. Até.
Ombreemos as instituições – e seus representantes – que buscam confrontar o abuso. Confiremo-lhes apoio; façamo-lo às iniciativas de contenção da barbárie. Quis a história que fossem essas mulheres e homens que, investidos de autoridade, estivessem à frente dessa batalha. Estejamos com eles e ao lado de quem mais se dispuser a controlar o poder.
Pois há tempo de reversão, antes das “consequências imprevisíveis”.
BASTA!
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*Sebastião Botto de Barros Tojal é advogado do escritório Tojal | Renault Advogados.
*Sérgio Rabello Tamm Renault é advogado do escritório Tojal | Renault Advogados.
*Pierpaolo Cruz Bottini é advogado do escritório Bottini & Tamasauskas Advogados.
*Igor Sant’Anna Tamasauskas é advogado do escritório Bottini & Tamasauskas Advogados.