Migalhas de Peso

A aplicação da suspensão do contrato de trabalho nos termos da MP 936/20 às gestantes e aos trabalhadores com contrato por prazo determinado

As empresas, principalmente, as pequenas e de médio porte, na tentativa de preservar os empregos, têm adotado as alternativas constantes nas medidas provisórias 927 e 936/20.

29/5/2020

O art. 1º da Constituição Federal declara a dignidade da pessoa humana e a função social do trabalho e da livre iniciativa, dentre outros, objetivos principais da república. Assim, é dever do Estado a proteção da saúde física da população, a busca do pleno emprego, a diminuição dos índices de desemprego, concedendo, inclusive, amparo emergencial quando necessário.

Frente a esta questão, independente das possíveis críticas quanto à redação das medidas provisórias trabalhistas editadas pelo governo a partir de março/20, todas elas visam, sem sombra de dúvidas, a manutenção dos postos de trabalho e a estabilidade da economia.

Posto isto, as empresas, principalmente, as pequenas e de médio porte, na tentativa de preservar os empregos, têm adotado as alternativas constantes nas medidas provisórias 927 e 936/20.

No que compete à suspensão do contrato de trabalho nos termos da MP 936 para as gestantes e os trabalhadores contratados por prazo determinado, como não há vedação constitucional, este tipo de medida é permitida também para estes empregados, entretanto, é preciso ter cautela ao adotar o artigo 3º, inciso III da MP 936/20.

Com relação à empregada gestante, é preciso lembrar que esta tem direito à licença maternidade de no mínimo 120 dias, nos termos do art. 7º, XVIII da Constituição Federal.

Tal determinação também está prevista na CLT, em seu artigo 392, parágrafo único. Vale lembrar que segundo a lei 11.770/08, que instituiu o Programa Empresa Cidadã, a duração da licença-maternidade para aquelas empresas que aderirem ao programa, fica prorrogada por mais 60 (sessenta) dias, em troca de incentivos fiscais. O acordo ou a convenção coletiva de trabalho da respectiva categoria da empregada também pode dispor de período maior.

No que compete ao salário maternidade a previsão legal está nos artigos 71 e seguintes da lei 8.213 de 1991, sendo que o art. 72 dispõe especificamente sobre a gestante empregada, nos seguintes termos:

Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.

§ 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.

§ 3º O salário-maternidade devido à trabalhadora avulsa e à empregada do microempreendedor individual de que trata o art. 18-A da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, será pago diretamente pela Previdência Social.

Conforme pode-se inferir do artigo acima, o salário da gestante, salvo a empregada do microempreendedor individual, será pago pela empresa em valor igual aquele percebido antes do afastamento, para posterior abatimento dos valores pagos a título de contribuição previdenciária devidos pela empresa.

Com relação àquelas empresas que aderiram ao Programa Empresa Cidadã, os 4 (quatro) primeiros meses de licença-maternidade serão compensados e os demais (2 meses) serão pagos pelo empregador.

Quanto à empregada doméstica, conforme determina o art. 73 da lei acima mencionada, o pagamento do salário maternidade será pago diretamente pelo INSS, no valor correspondente também ao seu último salário de contribuição, in verbis:

Art. 73. Assegurado o valor de um salário-mínimo, o salário-maternidade para as demais seguradas, pago diretamente pela Previdência Social, consistirá:

I - em um valor correspondente ao do seu último salário-de-contribuição, para a segurada empregada doméstica;

II - em um doze avos do valor sobre o qual incidiu sua última contribuição anual, para a segurada especial;

III - em um doze avos da soma dos doze últimos salários-de-contribuição, apurados em um período não superior a quinze meses, para as demais seguradas.

Parágrafo único. Aplica-se à segurada desempregada, desde que mantida a qualidade de segurada, na forma prevista no art. 15 desta Lei, o disposto no inciso III do caput deste artigo.

Ainda conforme a lei 8.213 de 1991, para a empregada gestante, incluindo a trabalhadora avulsa e a empregada doméstica, a concessão do salário-maternidade independe de carência, segundo determina o art. 26, vejamos:

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, salário-maternidade, auxílio-acidente e pecúlios

VI – salário-maternidade para a segurada empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica.

Quanto ao início do afastamento, o parágrafo 1º do artigo 392 da CLT dispõe que o início do afastamento para empregadas com carteira assinada, MEIs, autônomas e facultativas pode ocorrer entre o 28º dia antes do parto e a data do nascimento do bebê, e deverá ser requerido ao empregador mediante atestado médico, vejamos:

Art. 392. A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário.

§ 1º A empregada deve, mediante atestado médico, notificar o seu empregador da data do início do afastamento do emprego, que poderá ocorrer entre o 28º (vigésimo oitavo) dia antes do parto e ocorrência deste.

Importante mencionar que foi proferida decisão pelo plenário do STF em 03.04.20 que referendou a liminar concedida na ADIn 6.327/20, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 392, § 1º, da CLT e ao art. 71 da lei 8.213/91 e determinar que para aquelas mães que precisem ficar internadas após o nascimento do bebê por mais de duas semanas, fica prorrogado o benefício, visto que o termo inicial da licença-maternidade será a data da alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe, o que ocorrer por último.

Por conta destas questões, é aconselhável que o empregador realize a suspensão do contrato de trabalho da empregada gestante desde que ela retorne da suspensão um mês antes do parto, para que possa receber o salário-maternidade integral, ou seja, em valor correspondente aquele percebido antes do período de afastamento e não reduzido conforme previsto no art. 6º, inciso II, alíneas “a” ou “b” da medida provisória 936/20.

Contudo, se mesmo assim o empregador quiser realizar a suspensão do contrato, sendo que o término do período coincida com o início do período da licença-maternidade, visando por exemplo, a preservação da saúde da empregada, o empregador deve continuar a recolher sua contribuição previdenciária para que esta possa receber o salário-maternidade integral, para que a empregada não sofra nenhum prejuízo financeiro, uma vez que com a suspensão do contrato, seu recolhimento fica suspenso.

Já no que compete aos trabalhadores contratados por prazo determinado, é pertinente lembrar que a medida provisória 936/20 determina que caso sejam realizados acordos para suspensão do contrato ou para redução de jornada previstos nesta medida, os empregados terão estabilidade no emprego por igual período daquele acordado, segundo seu art. 10 da medida.

Assim, para aqueles trabalhadores contratados por prazo determinado, em que estão presentes as situações previstas no art. 443, quais sejam, serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; atividades empresariais de caráter transitório; ou de contrato de experiência, é prudente que o empregador verifique se o período da suspensão e consequente da estabilidade no emprego, vai ser maior que o prazo do contrato a termo (período total do contrato) porque, desta forma, virá a ser considerado contrato por prazo indeterminado. Uma opção para realização de tais acordos para estes empregados seria constar no acordo escrito que período acordado não contará como tempo de trabalho para o respectivo contrato, aplicando-se por analogia o art. 472, §2º da CLT e, conforme permissão constante no art. 2ª da medida provisória 927/20.

Importante lembrar que para aqueles contratos com prazo determinados “típicos”, quais sejam, trabalhador temporário, nos termos da lei 6.019/20 e contratos de aprendizagem, segundo o art. 492 da CLT, não há estabilidade, posto que com a cessação da condição específica imposta, há automaticamente o término do contrato. Cita-se como exemplo, a rescisão natural do contrato de trabalho do trabalhador temporário quando encerrado o contrato da empresa de trabalho temporário com o tomador e no caso do aprendiz, quando este já completou a idade máxima prevista na lei (24 anos) ou quando o período do curso de aprendizagem já se encerrou, nos termos do art. 443, §2º da CLT.

Diante do exposto, certo é que os empregadores têm que ter grande cautela antes de realizar quaisquer medidas constantes nas MPs citadas acima, já que, em tempos da covid-19, certamente faltará uniformidade de entendimento em todas as áreas do Direito.

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*Isabela Chiarini Peixoto é advogada do escritório Peixoto Advogados de Piracicaba – SP.

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