Os avanços tecnológicos e a popularização da internet ao longo dos anos culminaram na modernização do arcabouço legislativo, com a regulamentação da assinatura eletrônica e seus mecanismos de autenticidade, integridade e validade jurídica.
Foi assim que a medida provisória 2.200-2, editada em agosto de 2001, instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP Brasil, organização ligada ao ITI – Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, autarquia com sede na Capital Federal, que assegura autenticidade da assinatura digital. Melhor explicando:
As diversas Infraestruturas de Chaves Públicas existentes hoje no mundo conseguem assegurar a autenticidade de assinaturas digitais utilizadas atualmente na rede mundial de computadores de modo a possibilitar, com elevadíssimo grau de segurança, de que um usuário de email por exemplo seja realmente o emissor da mensagem e de que o receptor seja realmente quem ele diz ser.
No caso brasileiro a ICP-Brasil se caracteriza pela presença de um sistema hierárquico ou vertical, onde há a presença de uma AC-raiz (papel realizado pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação), que credencia e audita as ACs pertencentes ao sistema.
(fonte: Clique aqui, 03.05.20)
Com a edição da medida provisória acima citada, portanto, passou a existir a figura jurídica do documento eletrônico, cuja validade e autenticidade fica assegurada através das diversas Infraestruturas de Chaves Públicas, atribuíveis a uma assinatura eletrônica identificável e confirmável - a “assinatura digital”, mediante o uso de Certificado Digital.
Portanto, tivemos a criação de uma nova modalidade de assinatura, que é gênero da qual a “assinatura digital” com o uso de Certificado Digital é espécie.
Importante citar que a medida provisória MP 2.200-2 que representou grande passo para a modernização das operações interpessoais e empresariais, permanece em vigor até os dias atuais, pois foi promulgada antes da emenda constitucional 32, que determina prazo para conversão de medida provisória em lei, sob pena de perda de eficácia.
Mas afinal o que é o Certificado Digital?
A Certificação Digital é uma tecnologia que usa mecanismos de segurança no intuito de garantir a autenticidade de uma assinatura eletrônica. No centro dessa Certificação está o Certificado Digital, arquivo eletrônico que fica armazenado em uma mídia digital — que pode ser um cartão (chamado smart card) ou um token (similar a um pen drive). Esse arquivo contém o nome do usuário, uma chave pública (código usado para validar a assinatura realizada) e uma chave privada (de conhecimento exclusivo do proprietário, usada para cifrar o documento e garantir a autenticidade da assinatura). O cruzamento desses dados atua na forma de uma assinatura digital com validade jurídica para todos os fins, garantindo autenticidade, confidencialidade, integridade e não repúdio.
(fonte: Clique aqui, 03.05.20)
A cronologia do documento eletrônico no sistema registral
O Sistema Registral Brasileiro regulado pela Lei de Registro Públicos (“LRP”), lei 6.015/73, é composto por vários princípios norteadores da boa prática registral. Dentre eles, o princípio da “legalidade” tem a finalidade de controle formal dos títulos registrados, impedindo o ingresso de documentos inválidos, que não cumpram os requisitos legais. Conforme nos ensina o Ilustre Dr. Flauzilino dos Santos:
A noção do princípio da legalidade, no Registro de Imóveis, diz respeito ao comportamento do Registrador, ao permitir o acesso ao álbum registral apenas para os títulos juridicamente válidos para esse fim e que reúnam os requisitos legais para sua registrabilidade e a conseqüente interdição provisória daqueles que carecem de aditamentos ou retificações e definitiva, daqueles que possuem defeitos insanáveis.
Essa subordinação a pautas legais previamente fixadas para manifestação de condutas que criem, modifiquem ou extingam situações juridicamente postas não é exclusiva da temática registral, mas resulta da própria aspiração humana por estabilidade, confiança, paz e certeza de que todo o comportamento para obtenção de um resultado regulamentado para a hipótese terá a legalidade como filtro, vetor e limite. Em matéria registral, na medida em que essa confrontação é praticada pelo Registrador, exsurge daí um juízo de aprovação ou de desqualificação do negócio jurídico que trafega com destino ao álbum registral em perseguição da publicidade erga omnes, decorrente de sua inscrição (...).
(fonte: Clique aqui, 06.05.20)
A cronologia do avanço tecnológico dentro do Sistema Registral iniciou-se com a lei 11.977/09, instituindo, após 8 anos da edição da MP 2.002/01, o sistema de registro eletrônico, dispondo:
Art. 38 – Os documentos eletrônicos apresentados aos serviços de registros públicos ou por eles expedidos deverão atender aos requisitos da infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP e à arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico), conforme regulamento.
Parágrafo único. Os serviços de registros públicos disponibilizarão serviços de recepção de títulos e de fornecimento de informações e certidões em meio eletrônico”.
Ainda, a lei 11.977/09 alterou a legislação de Registros Públicos para incluir expressamente o acesso ou envio de informações aos Registros Públicos por meio eletrônico, mediante o uso da assinatura digital (art.17, § único), e ao mesmo tempo determinou que os atos registrais praticados a partir de sua vigência seriam inseridos no sistema de registro eletrônico no prazo de até 5 (cinco) anos da data em vigor daquela lei:
Art. 17. Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido.
Parágrafo único. O acesso ou envio de informações aos registros públicos, quando forem realizados por meio da rede mundial de computadores (internet) deverão ser assinados com uso de certificado digital, que atenderá os requisitos da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP.
A Lei da Liberdade Econômica (lei 13.874, de 2019), por sua vez, também trouxe alteração na Lei de Registro Públicos ao dispor:
Art. 1º Os serviços concernentes aos Registros Públicos, estabelecidos pela legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei. (....) §3º Os registros poderão ser escriturados, publicitados e conservados em meio eletrônico, obedecidos os padrões tecnológicos estabelecidos em Regulamento.
Além da lei anteriormente citada, vários provimentos editados pelo CNJ - Conselho Nacional de Justiça - regulamentaram o uso do documento eletrônico. O primeiro deles foi o de número 47/15, normatizando o intercâmbio de documentos eletrônicos e informações entre os Ofícios de Registro de Imóveis, Poder Judiciário, Administração Pública e público em geral, tendo estabelecido em seu artigo 3°, § 2, a criação das Centrais de Serviços Eletrônicos compartilhados, em cada um dos Estados e no Distrito Federal.
Procedimentos antes presenciais foram facilitados com o surgimento dos processos judiciais e extrajudiciais eletrônicos, como dito anteriormente. Foi a resposta natural para a demanda de informatização da sociedade, culminando na modernização do Poder Judiciário e demais órgãos da Administração Pública.
Com o Provimento 89, de 18 de dezembro de 2019 do CNJ, regulamentou-se o Código Nacional de Matrículas – CNM, o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis – SREI, o Serviço de Atendimento Compartilhado – SAEC, o acesso da Administração Federal às informações do SREI e diretrizes para o estatuto do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico – ONR, assim definido:
O ONR será responsável por implementar e operar, em âmbito nacional, o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), na forma do artigo 76 da Lei 13.465/2017, mediante integração das unidades registrais brasileiras. O operador será constituído como uma pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, sob a forma de serviço social autônomo. Sua sede e foro serão na cidade de Brasília, mas poderão ser abertos escritórios, filiais, agências e representações em todo país.
(fonte: Clique aqui, 03.05.20)
Já os provimentos 94/20 e 95/20 CNJ estabeleceram regras e diretrizes de utilização do documento eletrônico no sistema registral brasileiro em época da pandemia do covid-19, do qual abordaremos adiante.
É válido lembrar que a nossa realidade antes da pandemia já não existe mais. Foi necessário apressar a modernização para o Registro de Imóveis adequar-se às prerrogativas desse momento singular, e não congelar suas atividades diárias e essenciais para quem delas depende. Portanto, a LRP (Lei de Registros Públicos) rendeu-se à modernização e registro de documentos no formato eletrônico, representando um marco para o ingresso à era digital e agilidade na prestação dos serviços registrais.
No que tange as normas locais, a Corregedoria do Estado de São Paulo previu, no artigo 366, os requisitos para utilização dos documentos eletrônicos:
Art. 366. Os documentos eletrônicos apresentados aos serviços de registro de imóveis deverão atender aos requisitos da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) e à arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico) e serão gerados, preferencialmente, no padrão XML (Extensible Markup Language), padrão primário de intercâmbio de dados com usuários públicos ou privados Cap. – XX 516 e PDF/A (Portable Document Format/Archive), ou outros padrões atuais compatíveis com a Central de Registro de Imóveis e autorizados pela Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo.
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*Kelly Durazzo é sócia do escritório Durazzo Medeiros, especializada em Direito Imobiliário e Fundiário. Pós graduada em Direito Contratual pela PUC- SP e Direito Empresarial Imobiliário. Membro da Comissão de Loteamentos da OAB-SP e Conselho Jurídico da AELO (Associação das empresas loteadoras), Docente na Universidade Secovi.
*Augusto Sottano é especializado em Direito Imobiliário e Registral. Pós-graduado em Direito Contratual pelo Centro de Extensão Universitário e coordenador de projetos no CORI-BR e na ARISP.