Migalhas de Peso

Inconstitucionalidade da multa por compensação não homologada

Validade da multa prevista no artigo 74 da lei 9.430/96 será julgada pelo STF no Plenário Virtual do dia 17 de abril.

14/4/2020

Em tempos atípicos de crise econômica decorrente da pandemia causada pela covid-19, contribuintes brasileiros vêm tentando encontrar formas de reduzir o impacto causado pela paralisação ou redução de suas atividades frente à pesada carga tributária a que estão sujeitos.

Apesar das medidas fiscais já adotadas pelo Governo brasileiro para evitar o colapso da economia - tais como a postergação do vencimento de alguns tributos e obrigações acessórias -, os prejuízos causados pela crise atual serão certamente sentidos ao longo dos próximos anos.

Nesse contexto, a utilização de créditos fiscais para pagamento de tributos federais via compensação constitui ferramenta relevante a favor dos contribuintes, especialmente porque evita o desembolso de dinheiro para pagamento de obrigações, representando, consequentemente, um importante alívio no fluxo de caixa para empresas cujos ingressos financeiros estão sendo negativamente impactados durante a crise.

No entanto, apesar da compensação retratar direito legítimo, o artigo 74, § 17, da lei 9.430/96 impõe multa de 50% sobre o valor do débito originado da não homologação do respectivo crédito invocado pelo contribuinte, o que acaba por intimidá-lo quanto ao emprego deste instrumento para pagamento de tributos federais.

Há tempos a validade desta multa vem sendo amplamente debatida pelos contribuintes. O capítulo final pode estar próximo de ser redigido com a inclusão do tema na sessão do Plenário virtual do STF marcada para o dia 17 de abril.

A controvérsia será julgada no RE 796.939/RS, de relatoria do ministro Edson Fachin, que conta com parecer da Procuradoria-Geral da República opinando pela inconstitucionalidade da norma por afronta ao artigo 5º, XXXIV, alínea "a", da Constituição, que assegura o direito de petição.

De fato, a constitucionalidade da multa prevista no artigo 74, § 17, da lei 9.430/96 é bastante questionável.

Sua aplicação chega a ser compreensível nos casos em que o contribuinte lança mão de artifícios ardilosos, como forma de extinguir ilicitamente os tributos que lhe são exigidos (utilizando créditos inexistentes ou expressamente vedados por lei, por exemplo). Esta foi inclusive a justificativa apresentada na exposição de motivos da MP 472/09, convertida na lei 12.249/10, que dava a redação do dispositivo em tela antes da entrada em vigor da lei 13.097/15.

Contudo, a aplicação da multa sem que se verifique previamente a existência de má-fé por parte do contribuinte viola o seu direito de petição, uma vez que é penalizado por simplesmente estar se socorrendo a instrumento legítimo e previsto em lei.

Além disso, nunca é demais lembrar que a não homologação da compensação implica a cobrança dos respectivos débitos descobertos, acompanhada de multa de mora de 20% sobre o montante exigido.

Assim, como a indisponibilidade do dinheiro no tempo para o Fisco já é recompensada com os consectários legais da mora (correção monetária, juros e multa), a adição da multa isolada de 50% sobre o débito exigido, além de flertar com o confisco, transgride os Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade.

O Princípio da Razoabilidade deve garantir a perfeita correlação entre a medida tomada e a conduta que se pretende punir ou coibir, enquanto o Princípio da Proporcionalidade se apresenta como um limite à atuação da administração, que deve levar em conta a finalidade pública da norma em questão.

Vale acentuar, por fim, que a jurisprudência consolidada no âmbito dos TRFs da 3ª e da 4ª regiões, - neste último, respaldada inclusive por pronunciamento de sua Corte Especial -, aponta para a inconstitucionalidade da multa em apreço desde que ausente dolo ou fraude.

Assim, a cominação da multa prevista no artigo 74, § 17, da lei 9.430/96, sem amparo em prévia análise da conduta praticada pelo contribuinte revela-se contrária às aludidas garantias constitucionais, de modo que deve ser afastada pelo STF no julgamento que se avizinha.

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*João Pedro Rezende é advogado no escritório Trench Rossi Watanabe.

*Ricardo Sitrângulo é advogado no escritório Trench Rossi Watanabe.

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