Migalhas de Peso

Saídas tributárias para enfrentar o coronavírus

O Estado, por fim, deve se preocupar com seus deveres para “passarmos a régua” nas dívidas passadas e criarmos um sistema de inclusão das pequenas e médias empresas que podem contribuir para o desenvolvimento e arrecadação de tributos no Brasil e enfrentamento desta e crises vindouras.

6/4/2020

A crise do coronavírus que afeta o mundo tem mostrado um Fisco mais tolerante, realista e extremamente ativo perante o contribuinte. Reforma fiscal à parte, afinal precisamos avançar em um modelo de taxação menos agressiva e mais efetiva, o momento atual é de “atacar” o vírus na economia/empresas.  

Essa forma do Estado reagir, diferente dos tempos anteriores à crise atual, tem demonstrado um Fisco que prefere evitar a quebra de empresas, que enfrenta de forma efetiva os problemas fiscais sofridos em especial pelo pequeno empreendedor e esperamos tão logo o industrial e empresas de porte médio/grande.

Nas palavras do sempre cientista político José Cantero, “precisamos de uma reinvenção em nosso sistema” – Sim, precisamos ainda, em uma das maiores crises da história (para nós que não vivemos uma guerra mundial deve ser a maior), criar soluções objetivas para encontrar saídas tributárias viáveis com o fim da retomada do crescimento e mantença das empresas e empregos. Eis as saídas:

(i)A primeira portanto, já adotada pelo Comitê Gestor do Simples Nacional aprovou a prorrogação dos tributos federais das empresas do chamado “Simples” ( IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, IPI e Contribuição Previdenciária Patronal), é dizer, os vencimentos de março, abril e maio, passarão respectivamente para outubro, novembro e dezembro. Acreditamos que essa medida será mais efetiva se abranger todas as empresas em todos os regimes de tributação (lucro presumido e lucro real) além da adoção das mesmas medidas nas esferas estaduais, distrital e municipais. Quanto à “isenção” dos tributos nesse período, aguardemos um cenário futuro para tal decisão pois o Estado também deve se manter.

Para empresa com dívida ativa junto a PGFN, existe a Portaria 7.820/2020 que prevê parcelamento em 81meses da dívida fiscal, com pagamento inicial de 1% do valor total dividido em 3 parcelas, sendo que, tais parcelas se estendem a 97 para pessoas naturais e jurídicas de pequeno porte, microempresas ou individuais. Já as dívidas previdenciárias se limitam a 57 meses. Na Receita não!

A mesma portaria ainda prevê que no prazo de 90 dias será suspensa impugnação ou recurso fiscal, bem como, protesto de CDA e exclusão de parcelamento. Não nos esqueçamos que tal adesão prevista até 25/03/2020 implica em desistência de ações e impugnações. Muito pouco enquanto medida inicial! Mas seguimos.

(ii)Ainda, a Reforma Tributária deve ser um norte, afinal, um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) demonstra que 41,37% do rendimento dos brasileiros é destinado ao pagamento de tributos. Não obstante, o brasileiro tem que gastar 1.958 horas por ano para lidar com sistemas burocráticos da Receita Federal o que encarece demais o “produto Brasil”. É no mínimo extravagante um país continental ser o pior do mundo em burocracia fiscal! A crise do Coronavírus deve suspender prazos e exigências absurdas e desnecessárias que a empresa enfrenta perante o Fisco para readequar a empresa brasileira no cenário mundial de redução de custos e sobrevivência no mercado globalizado. A prorrogação de 90 dias de apresentação de obrigações acessórias durante essa crise é necessária, bem como, a readequação dessas obrigações para um futuro a curto prazo.    

(iii) Uma outra saída é a redução de gastos, afinal uma “máquina estatal enxuta” não só enfrentará essa crise, senão demonstrará também a curto prazo soluções de caixa e combinada com a medida anterior terá mais eficiência na prestação do serviço ao contribuinte, bem como, uma simplificação de obrigações que apenas gastam literalmente as horas e utiliza mão de obra desnecessária de funcionários públicos e colaboradores nas empresas. Para tanto, deixemos de atuar como Fisco arrecadador que anualmente “caça” os contribuintes através de auditorias absurdas (lembremos que ainda existe autuações milionárias com transferência de mercadorias entre matriz e filial em outro Estado mesmo com Súmula do STJ que impede tal atuação – Súmula 166) e passemos a fazer às vezes do Fisco tolerante que não protestará as certidões de dívidas ativas nos próximos 90 dias. Sequer deveria voltar a protestar por configurar sanção política – ADI 173/DF – STF.

Nesses “tempos estranhos” parafraseando Min. Marco Aurélio, precisamos criar soluções vantajosas ao país, e otimizar ao máximo a mão de obra e capacidade intelectual dos servidores públicos, não ao contrário, conforme dito por José Cantero, incentivar uma verdadeira “máquina de destruição de recursos financeiros”. 

(iv) Vamos ainda, investir o dinheiro público e não gastar, é dizer, a falta de infraestrutura no país não só facilita a expansão do vírus, senão eterniza a mácula de uma carga tributária alta e afasta o bom pagador de tributos pois cria “asco” naquele contribuinte que enxerga um sócio ineficiente e gastão! O Estado, caso queira ser sócio, deve ser aquele que te auxilia, ajuda, estende as mãos e não alguém cruel que te denuncia por prática criminosa quando declara o imposto e por problemas financeiros não efetua o pagamento. Ainda entendemos que a decisão de declarar o imposto e não pagar afasta qualquer crime tributário, em que pese a decisão do STF seja contrária.

A renda decorrente da redução de custos não só enfrentará esse vírus que nunca vimos anteriormente, mas também auxiliará a rede pública inteira no combate à dengue, chikungunya, Zika e sistema arrecadatório, pois tributo menor para nós, é sinônimo de maior arrecadação, já que, como já alertou nosso xará Arthur Laffer, menos imposto é mais arrecadação. A curva criada por este economista americano demonstra, ao nosso ver, que a tributação acima de 33%, como é no Brasil, estimula a sonegação ao invés do pagamento. Tempos melhores virão se seguirmos uma Reforma Tributária com patamares máximos de 15% a 25% a alíquota e Imposto Único.

(v) Um sistema tributário equalizado, transparente e simplificado estimula um país sair da crise atual do coronavírus como também, em um cenário global, demonstra segurança jurídica e atrai investimento estrangeiro. Sabemos que as empresas estão saindo do Brasil e uma cooperação real do Mercosul e demais blocos atrai capital ao nosso país e por consequência faz com que passamos o mais rápido possível por qualquer crise a curto e médio prazo. A ideia de fornecer apenas commodities no mercado internacional não basta! Precisamos de incentivo do Governo nas indústrias locais, para uma maior tecnologia e capacitação e por consequência melhor arrecadação e demonstração para o investidor estrangeiro que o Brasil é um país com grande capacidade de se tornar um país desenvolvido. Deixemos de ser subdesenvolvidos em uma mera oferta de contraprova de coronavírus (isso não pode faltar e está faltando), bem como, na imagem país que é o próximo tópico.  

(vi) O coronavírus deve ser tratado com a maior responsabilidade dos governantes em nosso país. A imagem do país deve ser preservada e não podemos ser tratados no mercado internacional como uma balança, que às vezes é interessante investir e às vezes é interessante tirar os investimentos do país. Um país sério, com pessoas sérias coordenando inclusive a imagem do sistema tributário do país, afasta o efeito “gangorra” de vai e vem de grau de confiabilidade internacional e faz com que mereçamos um reconhecimento mundial devido ao reconhecimento da segurança jurídica do país. Passemos essa imagem!    

(vii) Não podemos, por fim, com uma crise sem precedentes nessas três últimas gerações, deixar de falar da preocupação das responsabilidades vindouras, futuras, o chamado dia de amanhã. O Governo deve criar uma sistemática de compensação da dívida antes do coronavírus, com títulos já emitidos pelo próprio Estado (precatórios, debêntures, cautelas), enfim, todos os títulos que estão na “praça”, passar uma “vassoura” em tudo que hoje não se aceita, para criar um parcelamento pagável do passado. Resolvamos o passado de forma simples, afinal, mais de 90% das dívidas passadas são irrecuperáveis, conforme dito pela própria Fazenda Nacional no último parcelamento. Pensemos no futuro 

O futuro, pós coronavírus, inclusive para o Estado se precaver de crises futuras, deve contemplar um sistema único, simples, transparente e acima de tudo viável, para aí sim afastarmos a sonegação e crimes tributários que atrapalham o dia a dia no país.

Antes de tudo, vamos tratar de deveres, é dizer, o dever que o próprio Estado tem de arcar com a dívida um dia emitida em desfavor do contribuinte e, não paga, para depois falarmos de direitos. O dever de cumprimento das obrigações parte do Estado (dívidas, bons serviços públicos essenciais), para que os contribuintes enxerguem o exemplo e auxiliem o “caixa” estatal sem a sensação de ser literalmente enganado pelo Estado que sequer arca com as próprias obrigações.

Mais de 90% das empresas no Brasil representam pouco mais de 5% da arrecadação, ou seja, a “massa” de arrecadação está direcionada somente às grandes empresas. Façamos já a curto/médio prazo que essas empresas sejam protagonistas e auxiliem o sistema de arrecadação com o fim de dividir responsabilidades e maior contribuição aos cofres públicos. A ânsia de arrecadar está afastando todos. Façamos que o velho ditado “menos é mais” seja aplicado na sistemática de arrecadação e enfrentamento de crises, é dizer, menor carga – maior arrecadação!

É possível, contudo, implementar nessa crise sem precedentes, um sistema com simplificação de obrigações fiscais, a redução de impostos para fomentar a economia, estruturação das instituições públicas para otimizar o serviço público prestado ao contribuinte sem excessos e gastos desnecessários, assim como, é fundamental que a infraestrutura no país seja baseada em investimentos e não em gastos, para uma atração de investidores estrangeiros e confiabilidade no país com a imagem internacional.

O Estado, por fim, deve se preocupar com seus deveres para “passarmos a régua” nas dívidas passadas e criarmos um sistema de  inclusão das pequenas e médias empresas que podem contribuir para o desenvolvimento e arrecadação de tributos no Brasil e enfrentamento desta e crises vindouras.

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*Artur Ricardo Ratc é doutor em Ciências Jurídicas e Sociais; especialista em Direito Administrativo pela PUC/SP; especialista em Direito Constitucional pela UNISUL; Especialista em Ciências Processuais pela UNAMA; especialista em Direit o Processual Civil pela UNISUL; especialista em Direito Tributário pela UNISUL; membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/SP; membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Buenos Aires.

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