1 Introdução
O setor logístico terrestre encontra-se em uma das atividades mais exploradas pelo brasileiro na entrega de bens e transporte de pessoas, passando-se a ganhar um espaço cada vez mais importante na economia local, estadual e federal. E o que se ganha destaque, merece atenção, especialmente para que não sejam cometidos abusos, nem mesmo ilegalidades nos serviços prestados pelo empregado ao empregador, como, também, sejam regularizadas as atividades do empregado com uma postura fiel e de boa-fé à frente do posto de trabalho.
Um dos pontos mais importantes que merece ser tratado no presente artigo é quanto a obrigatoriedade de cumprimento dos tempos, elencados pelo legislador ao longo da jornada do motorista, e as consequências do seu descumprimento.
O Estado ao longo do tempo encontrou-se na situação de aperfeiçoar as normas reguladoras da atividade de motorista empregado, para que o motorista pudesse zelar pelo seu direito constitucional ao lazer, como, também, permitir o acesso às vias públicas em condições de segurança, pois em análise científica, foi apurado que os excessos de trabalho dos motoristas podem provocar acidentes, consequências na saúde do empregado, e gerar lesões que podem reduzir sua capacidade laboral.
Com a finalidade de reduzir esses impactos pejorativos, o Estado criou a lei 13.103/15, que estabelece normas e regras de condução e fiscalização da jornada de trabalho do motorista empregado, que deve ser fiscalizado e cumprido com todos os critérios estabelecidos.
2 Análise da fixação de jornada do motorista empregado
Antes de tecer uma análise exauriente da fixação de jornada do motorista empregado, deve-se fazer um esboço sobre a Lei do Motorista, que se encontra em uma lei pouco explorada pelo setor e pelo Poder Judiciário na aplicação da lei ao caso concreto.
A priori, a Lei do Motorista foi pensada em um cenário de buscas na minimização de riscos que o excesso do labor pudesse trazer como consequência na vida pregressa do empregado, e como tal, o legislador decidiu retirar a exceção do controle de jornada, previsto no artigo 62, I da Consolidação das Leis do Trabalho, da categoria do motorista que exercesse trabalho externo sem a fiscalização do empregador, para uma categoria com a fixação de jornada com alterações no Código de Trânsito Brasileiro e na Consolidação das Leis do Trabalho.
Conforme determina o artigo 7, XIII, da Constituição Federal c/c artigo 71 da Consolidação das Leis do Trabalho, a jornada de trabalho do empregado urbano e rural se limita a 8 horas diária e 44 horas semanais, com o intervalo denominado intrajornada de no mínimo 1 hora nas atividades acima de 6 horas diárias.
Repetindo-se o contexto da Constituição Federal, o legislador decidiu limitar as atividades do motorista ao mesmo critério acima exposto, com o acréscimo de intervalos de paradas e controle do horário pelo próprio motorista.
Tal previsão de controle da jornada pelo próprio motorista facilitou o cumprimento das normas de segurança, bem como permitiu ao próprio empregado usufruir dos intervalos de paradas no melhor tempo ao longo da jornada.
Quanto ao que aludido, importante a menção ao artigo 67-C, §1º do Código de Transito Brasileiro, que assim determina:
Art. 67-C. É vedado ao motorista profissional dirigir por mais de 5 (cinco) horas e meia ininterruptas veículos de transporte rodoviário coletivo de passageiros ou de transporte rodoviário de cargas.
§ 1º Serão observados 30 (trinta) minutos para descanso dentro de cada 6 (seis) horas na condução de veículo de transporte de carga, sendo facultado o seu fracionamento e o do tempo de direção desde que não ultrapassadas 5 (cinco) horas e meia contínuas no exercício da condução.
Ou seja, a partir da vigência da referida lei, o motorista que antes não tinha um controle de jornada fiscalizado pelo Estado e pelo empregador, passou a usufruir de tempo de descanso ao longo de jornadas superiores a 5 horas e 30 minutos. Registre-se que tal determinação é dever e não mera liberdade de cumprimento pelo profissional.
De igual modo, o cumprimento do intervalo mínimo de 1 hora para os motoristas requer uma análise mais explorada, visto que o próprio legislador determinou o dever de fiscalização e cumprimento pelo próprio profissional, não podendo, sob interpretação literal e teleológica, o descumprimento de tal norma recair em um dever de indenização do empregador.
A legislação pátria divide a jornada de trabalho do motorista nos seguintes critérios: 1- Tempo de Direção; 2- Tempo à disposição; Tempo de Descanso; 4 – Tempo de Refeição; 5 – Tempo de Repouso; e 6 – Tempo de Espera.
O tempo de direção compreende-se o período em que o motorista se encontra na condução do veículo, enquanto o tempo à disposição, o motorista está aguardando ordens do empregador para iniciar o labor.
O legislador prescreve que “são considerados tempo de espera as horas em que o motorista profissional empregado ficar aguardando carga ou descarga do veículo nas dependências do embarcador ou do destinatário e o período gasto com a fiscalização da mercadoria transportada em barreiras fiscais ou alfandegárias, não sendo computados como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias”
Em relação ao tempo de repouso, o legislador definiu os critérios em dois padrões, sendo um diário, compreendendo-se o tempo entre uma jornada e outra, que na vertente material do direito do trabalho, denomina-se intervalo interjornada; e a segunda, semanal, compreendendo-se o tempo total usufruído pelo motorista ao longo da semana.
Sob análise teleológica do legislador pátrio, o dever de controle do tempo de condução é dever do próprio motorista que deverá registrar por meio de registrador instantâneo inalterável de velocidade e tempo (tacógrafo) e, ou por meio de anotação em diário de bordo, ou papeleta ou ficha de trabalho externo, ou por meios eletrônicos instalados no veículo, conforme norma do Contran (Resolução CONTRAN Nº 525 DE 29/04/2015).
O legislador ainda acrescenta que “a não observância dos períodos de descanso estabelecidos no art. 67-C sujeitará o motorista profissional às penalidades daí decorrentes, previstas neste Código”.
Nesse diapasão, percebe-se que o motorista é obrigado a cumprir os horários determinados em lei, e o seu não cumprimento, por mera e livre espontaneidade não pode gerar o dever de indenização ao empregador.
Isso também não significa que o empregador não pode ser punido pelo descumprimento do dever de fiscalização nas atividades do empregado.
Para que isso não ocorra é fundamental que o empregador fiscalize as atividades do empregado motorista, especialmente quanto ao cumprimento dos intervalos obrigatórios, para que não haja impactos na vida social e pessoal do empregado.
3 Considerações finais
Com a previsão de tais critérios, o Estado construiu instrumentos de fiscalização da jornada do motorista e concedeu ao empregador o direito de fiscalização, algo que até então, se encaixava como uma exceção na legislação pátria.
Tais previsões se revelam fundamentais em um dever de cooperação entre empregado e empregador, como também, no dever de cumprimento da boa-fé assegurado no contrato de trabalho, que permite as partes o direito assegurado pela legislação e o ônus pelo seu descumprimento.
Ainda que a lei do motorista não estatui o ônus ao empregador pelo descumprimento dos horários de cada tempo, sob interpretação sistemática, o empregador é o gestor do negócio, devendo-se assumir no papel de fiscalizador na jornada de trabalho do motorista empregado.
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Para Leis.
______. Lei do Motorista. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13103.htm> Acesso em 19 de março de 2020.
______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. >. Acesso em 19 de março de 2020.
______. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <_https3a_ _www.planalto.gov.br2f_ccivil_032f_decreto-lei2f_del5452.htm="">. Acesso em: 19 de março de 2020.
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*João Victor Silva Costa é advogado trabalhista do escritório MoselloLima Advocacia. Especialista em Direito e Processo do Trabalho e Direito e Processo Penal, pela Damásio Educacional.