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Uma lei para resolver tantos problemas? Análise crítica da extinção da contribuição social de 10% sobre o FGTS pela lei 13.932/19

Apesar de ser uma boa notícia para as empresas empregadoras, o impacto dessa extinção na economia parece bastante reduzido.

21/1/2020

Desde a edição da LC 110/01, as empresas brasileiras têm sido oneradas com a exigência da contribuição social adicional de 10% sobre o saldo de 40% do FGTS toda vez que dispensam sem justa causa seus empregados.

Recentemente, muito tem se discutido sobre a excessiva tributação incidente sobre a folha de salários e a necessidade de implementar uma reforma estrutural que a torne mais coerente, adequada e justa: nesse contexto, algumas propostas sugeriram, dentre vários outros pontos, a extinção da referida contribuição social.

Em meados de 2019, começaram as notícias de que o Governo Federal iria propor a extinção da contribuição prevista na LC 110/01. A estimativa de arrecadação em 2019 era de R$ 5,7 bilhões e quase R$ 6 bilhões no ano seguinte de 2020 – um montante relativamente baixo para o Governo Federal abrir mão.

O boato se mostrou verdadeiro e, na ausência de uma, a proposta de extinção constou em duas Medidas Provisórias: no texto original da MP 905 – muito divulgada por introduzir uma série de flexibilizações em âmbito trabalhista e previdenciário, inclusive com a implementação do chamado “Contrato Verde e Amarelo”, dentre outras medidas – e no texto final da media provisória 889, que já foi convertida em lei.

A recente lei 13.932, objeto de conversão da mencionada MP 889 e publicada em 12/12/19, determinou a extinção da contribuição social de 10% com efeitos a partir de 1/1/20. Assim, segundo o seu artigo 12, a partir deste novo ano as empresas estão autorizadas a deixar de pagar o adicional de 10% sobre o FGTS nas próximas demissões sem justa causa.

A princípio, uma ótima notícia. Mas o problema da carga excessiva sobre a folha de salários continua? Claro que sim. Afinal, a extinção a partir de 2020 apenas torna a demissão menos custosa, de modo que a lei 13.932 possivelmente acaba, no final do dia, apenas estimulando mais demissões. Logo, apesar de ser uma boa notícia para as empresas empregadoras, o impacto dessa extinção na economia parece bastante reduzido.

Um segundo problema também fica pendente. É o enorme contencioso que foi gerado nos últimos anos decorrente do questionamento quanto à constitucionalidade dessa cobrança instituída pela LC 110/01. Há tempos as empresas contestam a legitimidade da contribuição social perante o Poder Judiciário, o que gerou um volume considerável de processos judiciais sobre o tema.

Em resumo, os contribuintes defendem a inconstitucionalidade da cobrança, considerando que a LC 110/01 perdeu sua finalidade – afinal, a contribuição social de 10% foi criada expressamente para financiar os prejuízos sofridos com os planos econômicos Verão e Collor I da década de 1990 nas contas vinculadas ao FGTS, finalidade esta já alcançada há anos, desde que os recursos vem sendo destinados para outros fins, como para financiar projetos sociais como Minhas Casa, Minha Vida – e considerando também que, tratando-se de contribuição social geral, a base de cálculo deveria ser um das hipóteses do § 2º artigo 149 da Constituição Federal, e não o saldo do FGTS.

A disputa entre Fisco e empresas tem sido tão grande que em 2015 o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral da matéria, elegendo o RE 878.313 como leading case. No entanto, anos se passaram e até agora o Supremo não resolveu a questão.

Embora a extinção da contribuição trazida pela lei 13.932/19 não retroaja para atingir o período passado, é certamente um argumento adicional nos processos judiciais em curso e poderá impactar a decisão do STF quando do julgamento do mencionado leading case, na medida em que, inegavelmente, o Governo Federal reconheceu que a cobrança não era mais devida.

No entanto, até que o STF venha a julgar definitivamente a matéria, o problema persiste, e inclusive a recente extinção da contribuição tende a estimular ainda mais o contencioso do tema, dado o receio das empresas de eventual modulação de efeitos caso o STF venha a julgar o leading case de forma favorável.

Assim, ao nosso ver, a tendência é que as empresas que ainda não tenham ações judiciais em curso busquem a restituição da contribuição social de 10% paga nos últimos 5 anos, aumentando ainda mais o tamanho do contencioso.

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*Cristiane I. Matsumoto é sócia da área previdenciária do escritório Pinheiro Neto Advogados.

*Mariana Monte Alegre de Paiva é advogada associada da área previdenciária do escritório Pinheiro Neto Advogados.








*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico. 
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