Um novo marco regulatório para as franquias no Brasil foi aprovado pelo Congresso e sancionado pelo Presidente da República resultando na publicação da lei 13.966 de 26/12/19 (a “nova Lei de Franquias”), a qual revogou a lei 8.955 de 15/12/94 (a “antiga Lei de Franquias”) que regulava este mesmo tema.
A nova lei de franquias trouxe novidades diversas em seu texto, as quais passaremos a expor no presente artigo. Entre as referidas novidades está a inclusão de dispositivos novos, sem disposição similar ou idêntica na antiga Lei de Franquias, acerca de temas enfrentados na prática pelo mercado em razão dos negócios desenvolvidos pelos franqueadores e resolvidos por especialistas em propriedade intelectual e, em alguns casos, também já decididos pelos Tribunais nacionais.
A nova lei de franquias dispõe expressamente que não há relação consumerista entre o franqueador e o franqueado, afastando a aplicação ao contrato de franquia das normas da Lei 8.078/90 (o Código de Defesa do Consumidor), consolidando no novo texto legal aplicável às franquias a posição já sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça em sua jurisprudência acerca desta questão (STJ – REsp 632958-AL, AgRg no REsp 992528-RS, RESP 1198176-DF, REsp 687322-RJ, REsp 930875-MT, AgRg no REsp 1336491-SP).
Outra importante inovação da nova lei de franquias foi a inclusão de disposição expressa acerca da possibilidade de licenciamento de pedidos de registro de marcas e desenhos industriais por meio do sistema de franquia, sem que estes estejam previamente registrados perante o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual. De acordo com a redação do dispositivo acerca deste tema, a mesma lógica aplica-se às patentes licenciadas por meio de contrato de franquia, as quais não precisam ter sido previamente concedidas para ser objeto de contrato de franquia, sendo possível ao franqueador licenciar ao franqueado pedido de patente ainda não concedido.
De toda forma, o recomendável é o franqueador e o franqueado terem assessoria jurídica especializada para compreenderem os possíveis riscos relativos ao licenciamento de pedidos de marca, desenho industrial e patente que têm mera expectativa de direito e não se tratam de direitos de exclusiva, assim como ocorre com os registros de marca e desenho industrial e as patentes já concedidas.
A nova lei de franquias previu expressamente a possibilidade de empresas privadas e, inclusive, empresas estatais, como no caso dos Correios, e, ainda, entidade sem fins lucrativos, serem franqueadores e adotarem o sistema de franquia como forma de negócio para a expansão de sua rede mediante a licença de marcas e outros direitos de propriedade intelectual. Entretanto, em relação à possibilidade dos franqueadores empresas estatais, houve veto pelo Presidente da República a um dos dispositivos legais regulando este tema.
Os requisitos para a Circular de Oferta de Franquia (COF) foram reforçados, garantido maior rol de informações ao franqueado sobre direitos e deveres decorrentes do contrato de franquia, conforme listado abaixo:
- informações sobre a situação da marca franqueada e outros direitos de propriedade intelectual relacionados à franquia, cujo uso será autorizado em contrato pelo franqueador, incluindo a caracterização completa, com o número do registro ou do pedido protocolizado, com a classe e subclasse, nos órgãos competentes, e, no caso de cultivares, informações sobre a situação perante o Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC);
- indicação da existência ou não de regras de transferência ou sucessão e, caso positivo, quais são elas;
- indicação das situações em que são aplicadas penalidades, multas ou indenizações e dos respectivos valores, estabelecidos no contrato de franquia;
- informações sobre a existência de cotas mínimas de compra pelo franqueado junto ao franqueador, ou a terceiros por este designados, e sobre a possibilidade e as condições para a recusa dos produtos ou serviços exigidos pelo franqueador;
- indicação de existência de conselho ou associação de franqueados, com as atribuições, os poderes e os mecanismos de representação perante o franqueador, e detalhamento das competências para gestão e fiscalização da aplicação dos recursos de fundos existentes;
- indicação das regras de limitação à concorrência entre o franqueador e os franqueados, e entre os franqueados, durante a vigência do contrato de franquia, e detalhamento da abrangência territorial, do prazo de vigência da restrição e das penalidades em caso de descumprimento;
- especificação precisa do prazo contratual e das condições de renovação, se houver;
- local, dia e hora para recebimento da documentação proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, quando se tratar de órgão ou entidade pública.
Embora somente a partir da nova lei de franquias os requisitos acima listados sejam obrigatórios na COF, isto não quer dizer que os contratos de franquia já não tratavam destas questões, mesmo porque cláusulas contratuais relativas à situação da propriedade intelectual licenciada, à sucessão ou cessão do contrato, à aplicação de multas e indenizações, à compra de cotas pelo franqueado, à existência de conselho ou associação de franqueados, à aplicação dos fundos de contribuição obrigatória pelos franqueados, à concorrência entre franqueador e franqueado, ao prazo contratual e à renovação, são corriqueiras em contratos de franquia.
Há, ainda, outras alterações trazidas pela nova lei de franquias como a aplicação de sanções ao franqueador que omitir informações ou veicular informações falsas na COF; e dispositivos sobre direito internacional privado acerca da língua do contrato de franquia que deverá ser o português quando o mesmo se aplicar somente no Brasil e que no caso de se tratar de contrato de franquia internacional este deverá ser redigido ou traduzido para o português por tradutor juramentado.
A nova lei de franquias representa um avanço no marco legal das franquias incluindo no texto legal normas presentes em outros dispositivos legais do ordenamento jurídico brasileiro e alguns direitos e obrigações já de praxe do mercado de franquias.
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*Daniel Moraes Freire é advogado do escritório Moraes Freire Advocacia.