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Transação em matéria tributária - MP 899/19

Acreditamos que a medida provisória não vai estimular a inadimplência, e poderá diminuir a quantidade de processos tributários que se acumulam nos tribunais, mas certamente precisaremos de esforços mais robustos para enfrentar as dificuldades nesta área.

27/12/2019

Consta da página da Procuradoria da Fazenda Nacional na internet (Clique aqui) que aquele órgão teria alcançado valores extraordinários em termos de recuperação da dívida ativa. Segundo a notícia, foram recuperados no primeiro semestre de 2019 algo em torno de R$ 11,4 bilhões, cerca de 23% acima do esperado, ou melhor, daquilo que foi previsto na lei orçamentária anual.

Sem que se coloque em dúvida o esforço da PGFN, considerando que a dívida ativa alcança a impressionante quantia de R$ 1,38 trilhões (Clique aqui), esta recuperação do primeiro semestre do ano não é tão excepcional quanto seu número vultoso pode sugerir. Representa menos de 1% do total da dívida. E o custo da máquina estatal exclusivamente dedicada a esta recuperação é muito próximo ao valor recuperado, o que traz resultado próximo de zero à União Federal.

Além do mais indica que, se eventualmente a dívida ativa jamais viesse a crescer a partir deste momento, se nada mais fosse inscrito como dívida doravante, seriam necessários mais de cinquenta anos para que a União recuperasse todo o seu crédito.

Se, no entanto, a dívida ativa continuar a crescer, como é muito provável de ocorrer, e sendo custosa a cobrança (à vista da estrutura da PGFN), a conclusão será de que a dívida ativa é impagável e,  por mais esforço que façam as autoridades da PGFN, o custo da cobrança deverá se manter em montantes superiores ao valor que se recupera.

Há de se ter como certo de que a dívida ativa da União e seu contínuo crescimento decorrem de um fator crônico: a elevada carga tributária e a complexa estrutura legal.

Sem atacar a causa, mas apenas se dedicando aos efeitos desta crescente dívida, o governo federal editou a MP 889/19 (“MP”), denominada ‘Medida Provisória do Contribuinte Legal’, com o objetivo de regular a transação de que trata o art. 171 do Código Tributário Nacional.

Segundo a MP, a proposta de transação poderá ser feita pela Procuradoria da Fazenda Nacional, ou pelo próprio devedor, cabendo a este observar algumas condições já estabelecidas na MP (não utilizar a transação de forma abusiva, não ocultar bens, não alienar bens sem comunicação à fazenda, renúncia, por parte do contribuinte, do direito de contestar a dívida, etc.).

A proposta, quando por iniciativa da PGFN, indicará os descontos que serão concedidos sobre o montante da dívida, desde que não existam indícios de esvaziamento patrimonial. Estes descontos não atingem o montante do principal (o tributo), mas apenas multa e acréscimos e não poderá ser superior a 50% (cinquenta por cento) do valor total. Não abrangem também os débitos do Simples, os débitos para com o FGTS e aqueles não inscritos como dívida ativa. Os débitos poderão ser parcelados em até 84 (oitenta e quatro) meses.

A transação será rescindida quando (I) contrariar decisão judicial; (II) houver indicativo de prevaricação, concussão ou corrupção passiva na sua formação (III) ocorrer dolo, fraude, simulação ou (IV) inobservância das condições constantes da MP ou do edital.

É vedada a celebração de nova transação relativa à mesma controvérsia jurídica objeto de transação anterior com o mesmo sujeito passivo. Vale dizer, uma vez rescindida a transação, o contribuinte não terá direito a outra sobre o mesmo objeto.

Poderá o secretário da receita federal conceder e regular transação relativa a débitos não judicializados, isto é, aqueles discutidos no contencioso administrativo, inclusive os de pequeno valor.

Cabe lembrar que o país é pródigo em programas de regularização tributária, sejam programas ordinários sem descontos de multa e juros, sejam programas especiais, com redução de multa e juros.

Mas se a dívida só aumenta e os programas de parcelamento são ineficientes, o que se pode esperar de mais uma possibilidade de regularização quando se focam nos sintomas e não nas causas do problema? Muito pouco na nossa opinião. Ainda continuaremos a enxergar a dívida ativa alta e crescente, a estrutura da PGFN cara e complexa, o contribuinte penalizado e inadimplente.

Há quem afirme, ainda, que esta MP poderá ter efeito contrário ao pretendido, ou seja, que venha estimular os contribuintes a judicializar as dívidas para, em momento subsequente, liquidá-la em condições favorecidas.

Acreditamos que a medida provisória não vai estimular a inadimplência, e poderá diminuir a quantidade de processos tributários que se acumulam nos tribunais, mas certamente precisaremos de esforços mais robustos para enfrentar as dificuldades nesta área.

Para que se ataque o cerne da questão, a substancial redução da dívida ativa, acreditamos ser fundamental a redução da carga tributária e simplificação da legislação, o que parece estar longe de acontecer.

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*Eduardo Ricca é sócio do escritório De Vivo, Castro, Cunha e Whitaker Advogados.

*Vanessa Inhasz Cardoso é socia do escritório De Vivo, Castro, Cunha e Whitaker Advogados.

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