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Os riscos de se acabar com os recursos extraordinários

A substituição da justificada recorribilidade extraordinária, ainda que a via de acesso aos Tribunais possa feita por novas ações revisionais, pode, assim, colocar em risco a unidade da Federação e até esvaziar o relevante papel das Cortes Superiores, construído historicamente, exercido através do julgamento de recursos.

2/12/2019

Tramita proposta legislativa que pretende viabilizar o trânsito em julgado das decisões judiciais antes do julgamento pelas Cortes Superiores, alterando (acabando) com a recorribilidade extraordinária.

Os chamados recursos extraordinários não seriam mais recursos, mas ações revisionais extraordinárias. Isso porque recursos servem para impugnar decisões dentro da mesma relação processual. As ações extraordinárias, ao contrário, serviriam para impugnar decisões de segundo grau que já tivessem transitado em julgado.

A ideia da proposta é antecipar o momento do trânsito em julgado, sem acabar com a possibilidade de que os processos sejam levados aos Tribunais Superiores.

Sem entrar em considerações sobre o mérito do que é melhor ou mais certo, política ou juridicamente, vale lembrar que a recorribilidade extraordinária tem a sua origem ligada a um nobre papel – manutenção da unidade da Federação.

O recurso extraordinário (em 1988 desmembrado também em recurso especial) surgiu antes mesmo da Constituição de 1891 (ainda que não tivesse esse nome). Pelo decreto 848, já em 1890, importou-se do direito norte-americano uma medida para a Corte Suprema com a intenção de manter íntegro o modelo federativo.

Isso porque os Estados Unidos da América tiveram a experiência anterior de buscar um mecanismo que pudesse dar à Suprema Corte uma forma de controlar a aplicação da legislação federal/constitucional pelos Estados, para que eventuais desrespeitos às normas federais não colocasse em risco a unidade da Federação (que pressupõe a coexistência das esferas federal e estaduais).

Então chamada de writ of error, essa medida americana foi copiada pelo legislador brasileiro já em 1890, valendo-se do caminho trilhado pelo legislador norte-americano que construiu o instrumento, vale repetir, com a função primeira de possibilitar que a Suprema Corte controlasse a aplicação da legislação federal sem que eventuais desrespeitos pelos Judiciários estaduais colocassem em risco a integridade federativa.

Todas as Constituições mantiveram e fortaleceram o recurso extraordinário e a de 1988 principalmente, já que, em um contexto de abertura democrática, regulamentou o recurso especial, fazendo a divisão de competências – o STF julga a matéria constitucional e o STJ a matéria infraconstitucional. Mas o papel principal de ambos os recursos é o mesmo – manter a unidade da Federação, dando às Cortes Superiores instrumentos para controlar a aplicação da legislação federal pelos Tribunais de segundo grau.

A substituição da justificada recorribilidade extraordinária, ainda que a via de acesso aos Tribunais possa feita por novas ações revisionais, pode, assim, colocar em risco a unidade da Federação e até esvaziar o relevante papel das Cortes Superiores, construído historicamente, exercido através do julgamento de recursos (que pressupõe o não trânsito em julgado).

__________

*Osmar Mendes Paixão Côrtes é pós-doutor em Direito pela UERJ. Doutor em Direito pela PUC/SP. Mestre em Direito e Estado pela Unb. Professor do IDP/DF. Advogado e sócio do escritório Paixão Côrtes e Advogados Associados.

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