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Pacote tributário: não-cumulatividade da COFINS e compensação tributária

No último dia 31 de outubro, em Edição Extra do Diário Oficial da União Federal, foi publicada a Medida Provisória nº 135 (“MP 135”), que aprovou parte daquilo que vem sendo denominado de reforma tributária pelo Governo Federal e está em discussão no Senado Federal.

24/11/2003

 

Pacote tributário: não-cumulatividade da COFINS e compensação tributária

 

Luiz Roberto Peroba Barbosa

 

Tércio Chiavassa*

 

No último dia 31 de outubro, em Edição Extra do Diário Oficial da União Federal, foi publicada a Medida Provisória nº 135 (“MP 135”), que aprovou parte daquilo que vem sendo denominado de reforma tributária pelo Governo Federal e está em discussão no Senado Federal.

 

Dentre tantas mudanças, analisaremos neste informativo apenas as significativas alterações relativas à introdução de regime não-cumulativo para a COFINS, além dos aspectos previstos em relação à compensação de tributos e contribuições arrecadas pela Secretaria da Receita Federal (“SRF”).

 

I. - Contribuintes da “COFINS não-cumulativa”  

Inicialmente, cumpre mencionar que a nova sistemática da COFINS não é aplicável a todas as pessoas jurídicas. A exclusão de determinadas pessoas jurídicas explica-se pelo provável aumento da carga tributária nas respectivas atividades, haja vista que, em princípio, a nova sistemática deveria, no máximo, manter a mesma carga tributária para os contribuintes.

 

Em virtude disso, dentre outras previsões, o artigo 10º da MP 135 exclui as seguintes pessoas jurídicas e receitas da tributação pelo regime não-cumulativo da COFINS agora instituído: (i) cooperativas; (ii) instituições financeiras, companhias securatizadoras de créditos e operadoras de plano de assistência à saúde; (iii) pessoas jurídicas tributadas pelo imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado; (iv) pessoas jurídicas optantes pelo SIMPLES; (v) as pessoas jurídicas imunes a impostos; (vi) os órgãos públicos, as autarquias e fundações públicas federais, estaduais e municipais; e (vii) as receitas decorrentes de operações de vendas canceladas, descontos incondicionais, provisões e recuperações de créditos baixados como perda e aquelas sujeitas à substituição tributária para a COFINS; (viii) de serviços de telecomunicações; (ix) de serviços das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens; (x) as pessoas jurídicas que tenham por objeto social a venda de veículos automotores.

 

Aparentemente, a intenção do Governo não foi a de instituir nova contribuição social, mas sim agregar à legislação anterior dispositivos que minimizem a incidência, introduzindo o regime não-cumulativo para a COFINS e beneficiando determinados setores da economia, principalmente o industrial, que antes estavam sujeitos a tributação mais gravosa. A nova sistemática da COFINS será aplicável a partir de 1º.2.2004 (fato gerador), respeitando-se, portanto, a anterioridade mitigada de 90 dias.

 

II - Aspectos gerais: base de cálculo, alíquota e regime da não-cumulatividade  

A base de cálculo da contribuição será o faturamento (artigo 1o), entendido como “o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil”. Tal conceituação é idêntica à contida nos artigos 2o e 3o da Lei 9.718/98.

 

Optou-se pela base de cálculo adotada desde a Lei 9.718/98. Dessa vez, contudo, permite-se determinadas deduções de tal base de cálculo, além de créditos que, em tese, tornarão o valor tributável aparentemente menor.

 

Além disso, conforme definido pelo parágrafo 3º de seu artigo 1º, não integram a base de cálculo da COFINS da MP 135, as receitas decorrentes de saídas isentas da COFINS, não alcançadas ou sujeitas à alíquota zero; auferidas pela pessoa jurídica revendedora, na revenda de mercadorias em relação às quais a contribuição seja exigida da empresa vendedora, na condição de substituta tributária; as não operacionais de venda de ativo imobilizado; as decorrentes da venda de produtos submetidos à incidência monofásica da COFINS; e as decorrentes de vendas canceladas e de descontos incondicionais concedidos, bem como de reversões de provisões e recuperações de créditos baixados como perda que não representem ingresso de novas receitas.

 

Somada às receitas passíveis de exclusão da base de cálculo da COFINS, a MP 135 inovou ao possibilitar ao contribuinte a apropriação de créditos da contribuição, em percentual também de 7,6%, em relação a várias operações, que serão compensados contra o próprio valor de COFINS que será devido pela pessoa jurídica. O valor desse crédito, aliás, conforme determinação expressa do §10º do artigo 3º, não constitui receita bruta do contribuinte.

 

Diante das inúmeras hipóteses de crédito previstas pela MP 135, recomendamos a leitura de seu artigo 3o. Destacam-se os créditos: sobre o valor dos bens adquiridos para revenda, com exceção das mercadorias e dos produtos sujeitos ou ao regime de substituição tributária ou à incidência monofásica da COFINS; sobre o valor dos bens e serviços utilizados como insumo na fabricação de produtos destinados à venda ou na prestação de serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes; à energia elétrica consumida nos estabelecimentos da pessoa jurídica; a aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, além de créditos em determinadas despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos; encargos de depreciação e amortização de bens etc.

 

Referidos créditos serão calculados mensalmente, mediante a aplicação da alíquota de 7,6% sobre o valor da aquisição do bem ou do serviço adquiridos no mês. Ademais, com o suposto intuito de incentivar a indústria nacional, a MP 135 estabelece que o creditamento da COFINS somente será legítimo em relação “aos bens e serviços adquiridos de pessoa jurídica domiciliada no País, aos custos e despesas incorridos, pagos ou creditados a pessoa jurídica domiciliada no País; e aos bens e serviços adquiridos e aos custos e despesas incorridos a partir de 1º.2.2004 (fato gerador).

 

O artigo 28 da MP 135 criou a figura da retenção na fonte da COFINS, da CSL e do PIS nas hipóteses de pagamentos efetuados pelas pessoas jurídicas a outras pessoas jurídicas em relação aos serviços de limpeza, conservação, manutenção, segurança, vigilância, transporte de valores e locação de mão-de-obra, serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, bem como pela remuneração de serviços profissionais.

 

O valor da retenção na fonte será equivalente a 4,65% e fica configurado pela lei como antecipação do valor devido, nos termos em que estabelecido pelo artigo 34, cabendo ao contribuinte que teve o valor retido efetuar o recolhimento da diferença apurada.

 

III. - Compensação de tributos federais

 

Além da nova sistemática não-cumulativa introduzida para a cobrança da COFINS, a MP 135/03 trouxe ainda algumas modificações nas regras de compensação de tributos federais arrecadados pela SRF que foram introduzidas em 1996 com a edição da Lei 9.430/96 (artigo 74), com as alterações posteriores da Lei 10.637/2002 (artigo 49).

 

De acordo com o artigo 17 da MP, fica expressamente vedada a compensação de créditos de tributos e contribuições administrados pela SRF com:

 

(i) débitos que já tenham sido encaminhados à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”) para inscrição em dívida ativa;

 

(ii) débito consolidado no âmbito do Refis ou parcelamento a ele alternativo;

 

(iii) débitos que já foram objeto de compensação anterior e não homologada pela SRF.

 

O mesmo artigo, observando as regras constantes do Código Tributário Nacional (“CTN”) a respeito de lançamento, dispôs ainda que o prazo para homologação da compensação declarada pelo sujeito passivo será de 5 anos, contado da data do protocolo da declaração de compensação (“DECOMP”).

 

Caso haja compensação indevida, a DECOMP constituirá confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência dos débitos indevidamente compensados pela SRF e PGFN.

 

Não hipótese da não homologação da compensação pela SRF, deverá o contribuinte ser cientificado para efetuar, no prazo de 30 dias, o pagamento dos débitos indevidamente compensados ou apresentar manifestação de inconformidade contra a não homologação da compensação.

 

Vale ressaltar que, em respeito ao artigo 151, III do CTN, a manifestação de inconformidade, com acerto, passa a ter expressamente reconhecido o seu efeito suspensivo. Esta medida assegurará ao contribuinte a obtenção de Certidão Positiva com efeito de Negativa enquanto perdurar a discussão na esfera administrativa.

 

Caso o contribuinte não tome nenhuma das medidas indicadas no item 18 acima, quais sejam, o pagamento do débito ou a discussão na esfera administrativa, dispõe a MP que os débitos serão encaminhados para inscrição de dívida ativa e cobrança por execução fiscal.

 

IV. - Conclusões

 

Há aspectos importantes que foram adotados, como por exemplo a confirmação da desoneração da COFINS em relação às receitas decorrentes de exportações de mercadorias e de serviços para pessoa física ou jurídica domiciliada no exterior (artigo 6o, incisos I e II).

 

A supressão da incidência da COFINS em cascata e, conseqüentemente, a possibilidade de o contribuinte apropriar créditos da exação representará avanço na legislação somente se houver redução ou, ao menos, manutenção da carga tributária dos contribuintes, o que temos séria e fundada dúvida, especialmente em relação ao setor de prestação de serviços, já que este segmento terá oportunidade mínima para a escrituração de créditos, especialmente considerando a vedação do crédito em relação à mão-de-obra paga no mercado nacional. Temos conhecimento de algumas emendas à MP que serão apreciadas pela Câmara dos Deputados sobre o assunto.

 

Vale ressaltar também que na nossa avaliação foram importantes os esclarecimentos feitos pela MP no sentido de deixar, de forma expressa no texto, as regras, prazos e recursos cabíveis contra decisões administrativas que não homologam a declaração de compensação. Não obstante, parece-nos, num exame preliminar, que o Poder Executivo limitou a utilização de créditos tributários, o que não parece estar em linha com a finalidade do instituto da compensação. Esperamos assim, que o Congresso Nacional faça as devidas modificações no sentido de preservar as garantias dos contribuintes.

 

Por fim, há que se atentar para o fato de que DECOMP passa a ser considerada, por norma legal, como confissão de dívida do contribuinte. Nesse sentido, deve-se redobrar o cuidado na sua apresentação, na medida em que eventual indeferimento acarretará na inscrição do débito em dívida ativa e conseqüente cobrança por executivo fiscal.

 

 

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* Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados

 

*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

 

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