De início, é crucial compreender que tanto a marca quanto o nome comercial possuem um papel identificador de especial relevância, pois contribuem decisivamente para a formação da imagem e do caráter de produtos, serviços e estabelecimentos comerciais. Ou seja, é a partir dos sinais distintivos que uma sociedade empresária estabelece uma relação de confiança com o consumidor e atinge destaque em determinado segmento econômico, daí a necessidade de um sistema efetivo de proteção.
Ocorre, contudo, que marca e o nome comercial são sinais distintivos que, no Brasil, encontram regimes legais próprios e específicos, isto é, são protegidos por leis diferentes, registrados junto à Instituições diversas, não havendo um sistema que fomente a comunicação entre tais entidades e que tampouco exija consultas a um banco de dados comum para se proceder aos registros respectivos, o que provoca algumas situações de conflito.
A proteção do nome comercial, por exemplo, é prevista no art. 1166 do Código Civil e depende do arquivamento dos atos constitutivos da pessoa jurídica na Junta Comercial. Interessante pontuar que, nos termos do Código Civil, a proteção do nome comercial está assegurada apenas no espaço territorial do Estado em que tenha sido feito o registro.
O nome comercial é um importante ativo da sociedade empresária na medida em que constitui a forma pela qual ela se identifica no mercado em que atua. É a maneira como a empresa se torna conhecida e se distingue em relação aos concorrentes.
Por sua vez, a marca é um sinal distintivo que identifica produtos e serviços, um bem deveras valioso para a empresa por conformar sua identidade no mercado em que opera. A marca confere a credibilidade necessária para que a empresa prossiga no desenvolvimento dos seus negócios, pois estabelece a relação de confiança com o consumidor no que toca à qualidade do produto ou serviço que visa designar.
De acordo com a legislação brasileira, o registro da marca deve ser solicitado junto ao INPI, uma Autarquia Federal, seguindo-se as prescrições da lei 9279/96, lei que instituiu o sistema de propriedade industrial brasileiro. É relevante pontuar, neste caso, que não há limitação territorial para proteção da marca, uma vez que a concessão promovida pelo INPI tem efeito sobre todo território nacional, na forma do art. 129 da lei 9279/96.
Nota-se, portanto, que, muito embora igualmente tutelados pela Constituição Federal, a marca e o nome comercial não fazem parte de um mesmo sistema legal, o que em boa medida resulta em conflitos, geralmente decorrentes da exploração indevida de propriedade alheia.
Como visto, não há, no Brasil, um sistema que promova um tratamento comum a nome comercial e marca. Não há qualquer norma que imponha ao INPI, no exame de um pedido de marca, consulta prévia a um banco de dados da Junta Comercial para apurar se já há registro do mesmo sinal como nome comercial, conquanto exista expressa proibição no art. 124, V, da lei 9.279/96 para concessão de marca nestes termos.
Do mesmo modo, a Junta Comercial não consulta o banco de dados do INPI para saber se há marca concedida com os mesmos elementos que constam nos atos constitutivos de determinada sociedade empresária.
Por óbvio, inexistindo um sistema adequado de controle para evitar as indesejáveis sobreposições de sinais distintivos, faz-se bem comum a colidência entre nome comercial e marca, o que traz enormes problemas para todos os envolvidos.
Na verdade, regra geral, não se verifica má-fé no uso de sinais distintivos registrados em nome de outra pessoa, mas mero desconhecimento. Afinal, o acesso ao sistema de propriedade industrial para consulta prévia, especialmente por parte dos pequenos empresários, ainda não é uma cultura bem desenvolvida no Brasil. Ademais, há a confiança de que a Junta Comercial ou INPI jamais defeririam registro para um sinal anteriormente protegido.
Imagine-se a hipótese, por exemplo, de um pequeno empresário de Porto Velho, Rondônia, que abre um negócio e solicita o registro de um nome comercial que já tenha sido registrado como marca junto ao INPI por outra pessoa. A Junta Comercial, como visto, não consulta o banco de dados do INPI, de modo que não é nada absurdo admitir a possibilidade de que os atos constitutivos daquele pequeno empresários sejam registrados tal como solicitado e, a partir de então, a atividade empresária tenha início e se desenvolva.
Diante disso, ao tomar conhecimento do uso daquele sinal distintivo como nome comercial, o titular da marca, com razão, adotará medidas protetivas para fazer cessar o uso indevido, tal como lhe autoriza o art. 130 da lei 9.279/96. Atualmente, com a evolução das ferramentas digitais e com o uso das mídias sociais, as informações circulam num ritmo frenético, possibilitando o rápido conhecimento dessas intercorrências.
Normalmente, conflitos desta natureza vêm sendo submetidos ao Poder Judiciário estadual, que não detém os meios necessários para empregar uma solução adequada. Não se pode perder de vista que, inexistindo má-fé, não se verifica razão para adoção de medidas constritivas que, em essência, comprometem a própria subsistência das empresas. Invariavelmente, as decisões judiciais impõem a prevalência de um lado em detrimento do outro, sendo certo que não precisa ser necessariamente assim.
A crise econômica que assola o Brasil nos últimos tempos exige um tratamento para esses conflitos que prestigie a continuidade dos negócios, especialmente com vistas à manutenção de postos de trabalho. De modo geral, as partes envolvidas estão de boa fé e é perfeitamente possível encontrar um modo de delimitar um espaço leal e saudável de concorrência. E é justamente neste sentido que se chama a atenção para métodos mais adequados de resolução desses problemas.
Ora, tanto a marca quanto o nome comercial integram o patrimônio material dos seus titulares, constituindo direitos que, à evidência, são disponíveis. É possível, deste modo, que seja avaliada uma solução diferente para o conflito, não havendo a necessidade de que ela venha exclusivamente do Poder Judiciário estadual.
A mediação é um método de resolução de conflito através do qual se busca facilitar a comunicação entre as partes envolvidas. É comum que, ao conhecer a realidade e perspectiva do outro, a parte deixe de lado sua postura adversarial e admita a possibilidade de um meio termo, ressaltando-se que as partes são protagonistas no desfecho do conflito. A mediação parece adequada para situações em que não há qualquer abalo na concorrência entre os envolvidos, ou mesmo nos casos em que tal influência é de pequeno potencial.
Assim, ao tomar conhecimento de uma situação em que verificado o uso indevido de um sinal distintivo, o titular, ao invés de procurar o Poder Judiciário estadual, pode procurar uma Câmara de mediação para viabilizar o encontro entre as partes envolvidas a fim de se atingir uma solução que seja razoável para ambos. É muito mais rápido e certamente envolve muito menos custos.
De outra banda, tratando-se de questão um tanto mais complexa que traga alguma interferência na concorrência, vale refletir quanto ao uso da arbitragem para solução do conflito. De certo, revela-se mais interessante para as partes submeter o conflito a um expert no assunto. Regra geral, não há especialização no Poder Judiciário estadual apta a acomodar com o apuro técnico recomendável demanda tão específica e importante.
Por derradeiro, não se deve ignorar os números alarmantes da Justiça brasileira recentemente divulgados pelo CNJ. Diante de tanta demanda atribuída aos juízes nacionais, é possível afirmar que o Poder Judiciário estadual não consegue conferir a atenção necessária para os sensíveis conflitos que existem entre nome comercial e marca.
E não há qualquer dificuldade em submeter esses conflitos a uma Câmara de Arbitragem. Do mesmo modo que hoje é feito pelo Poder Judiciário estadual, uma Câmara de Arbitragem séria e competente tem os meios e condições necessárias para inaugurar uma relação entre as partes envolvidas, bem como para tratar o conflito de forma célere e eminentemente técnica.
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