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Arbitragem e o Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI

Inexistem vedações para a atuação do INPI em tribunais arbitrais, de modo que a resolução de conflitos envolvendo a Propriedade Industrial pode vir a ser cada vez mais célere e em constante prestígio à cooperação e autonomia das partes litigantes, se modificada a postura excludente hoje em prática.

3/9/2019

A arbitragem avança a passos largos no Brasil. Abarca método alternativo de resolução de controvérsias, por livre e espontânea vontade das partes, possibilitando que, através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem os poderes de uma convenção privada, possa ser proferida decisão sem intervenção estatal, assumindo a mesma o caráter e eficácia de sentença judicial.

Diversas discussões têm surgido a partir do crescimento do número de casos em arbitragem, inclusive no campo da Propriedade Industrial e, com destaque, sobre a possibilidade de atuação na esfera arbitral do Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI, responsável pela análise e concessão dos direitos de Propriedade Industrial (em especial, marcas e patentes) no país.

Fora de dúvida, a Propriedade Industrial desempenha um papel de suma importância para a consolidação de países em desenvolvimento. Um ambiente de proteção efetiva e célere à Propriedade Industrial viabiliza, entre outros, o desenvolvimento tecnológico e a estabilidade necessária para investimentos no país, no que a arbitragem pode exercer papel crucial. 

É importante, no entanto, entender se existe no país sistema análogo a determinados ordenamentos estrangeiros1 capaz de possibilitar a discussão e decisão arbitral a respeito da nulidade de direitos de Propriedade Intelectual, em que, por expressa previsão legal2, deve ser o INPI parte3 do litígio.

Com o advento da lei 13.129/15, eliminou-se discussões sobre a legalidade da utilização da solução alternativa de conflitos atinentes a direitos disponíveis por entidades da Administração Pública direta e indireta.

Permanece, no entanto, grande confusão acerca do que seriam os direitos tidos como disponíveis, elegíveis, pois, à discussão arbitral.

Neste ponto, importante relembrar a diferenciação entre o interesse público primário, o “verdadeiro” interesse a que se destina a Administração Pública, alcançando o interesse da coletividade e supremacia sobre o particular, e o interesse secundário, que nada mais é que o interesse patrimonial do Estado. O interesse público (primário) é sempre indisponível, não obstante os direitos patrimoniais relacionados aos bens e serviços públicos não o sejam.

Para aferir a possibilidade de arbitragem, basta serem observados os requisitos de arbitrabilidade objetiva em cada caso em que figure o INPI, para que se comprove que tais litígios envolverão apenas diretos patrimoniais disponíveis, assim entendidos aqueles que podem ser transferidos ou alienados por seus titulares a terceiros. Direitos negociáveis e que sejam objeto de atos de gestão.

E a proteção da Propriedade Industrial nada mais é que um contrato social, por meio do qual a Administração Pública concede privilégio temporário (marca ou patente) resultante de criações do intelecto que, ao caírem em domínio público, beneficiam toda a coletividade4. Portanto, direitos plenamente disponíveis em sua essência. 

O INPI é, pois, plenamente capaz de implementar a arbitragem nos litígios em que se vê envolvido, tendo em foco desafogar o Poder Judiciário, bem como garantir celeridade e efetividade à solução dos conflitos eminentemente técnicos, privilegiando o interesse público e não conflitando com este5.

Nas discussões sobre a validade de marcas e patentes, em apreço ao princípio da eficiência, não há empecilho ao INPI, considerando juízo de razoabilidade e necessidade, optar pela arbitragem. Ora, quem recorre à arbitragem não renúncia a direito, tão somente escolhe um outro caminho. E indisponibilidade do interesse público não é o mesmo que indisponibilidade do processo judicial. 

Os gestores e procuradores do INPI poderão tranquilamente incentivar a arbitragem, se considerarem que o próprio instituto, muitas vezes, no curso de litígios judiciais, apoia a tese autoral de nulidade de marcas ou patentes, requerendo a procedência dos pedidos formulados, ou ratifica acordos de diversas naturezas (como, por exemplo, de coexistência de marcas antes tidas em conflito).

Fora as vantagens intrínsecas da arbitragem (velocidade, limitação de recursos, especialidade técnica dos árbitros, peritos e profissionais envolvidos), o INPI certamente será beneficiado em termos financeiros, já que a autarquia, invariavelmente, arca com honorários sucumbenciais, enquanto que no procedimento arbitral tal ônus poderá ser previamente excluído. O mesmo poderá ser observado com relação aos custos do procedimento, cuja atribuição poderá ser direcionada aos particulares envolvidos.

É possível concluir que inexistem vedações para a atuação do INPI em tribunais arbitrais, de modo que a resolução de conflitos envolvendo a Propriedade Industrial pode vir a ser cada vez mais célere e em constante prestígio à cooperação e autonomia das partes litigantes, se modificada a postura excludente hoje em prática.

Cite-se, por exemplo, a enorme resistência do INPI em participar de audiências de conciliação e mediação do artigo 334 do Código de Processo Civil, a demonstrar tratar-se essencialmente de uma questão de mentalidade.

Nessa conjuntura, ao invés de manifestar-se irrestritamente sobre seu desinteresse pela adoção de métodos alternativos de solução de disputas, em especial arbitragens, o ideal seria a modernização dos regulamentos internos do INPI, em observância do Código de Processo Civil e da lei que regulamenta a autocomposição na Administração Pública (lei 13.140/15)6, com a fixação de parâmetros para efetivação de acordos e métodos alternativos para resolução de litígios envolvendo a Propriedade Industrial.

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1 Como nos Estados Unidos: Julian M. Lew e Loukas A. Mistelis, Comparative International Commercial Arbitration, ch. 9: Arbitrability: Intellectual Property Rights, Kluwer, 2003; Trevor Cook e Alejandro Garcia, International Intellectual Property Arbitration, cf. 4: Arbitrability of IP Disputes, Kluwer, 2010.

2 Artigos 57 e 175 da lei 9.279/96.

3 Independentemente da posição processual que a autarquia efetivamente sustente ou ocupe.

4 BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à Propriedade Intelectual. 2ª Edição. Editora Lumen Juris, 2003.

CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da Propriedade Industrial. Volume I – 3ª Edição. Da Propriedade Industrial e do Objeto dos Direitos. Editora Lumen Juris, 2010.

5 Sobre o tema, vide MAZZONETTO, Nathalia. Arbitragem e Propriedade Intelectual. Editora Saraiva, 2017.

6 A exemplo do Governo do Estado de São Paulo que, em 31/07/2019, promulgou o Decreto 64.356, criando normas e instruções para a Administração Pública direta e indireta e suas autarquias na resolução de conflitos por meio da arbitragem.

 

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*Rodrigo de Assis Torres é sócio advogado do escritório Dannemann Siemsen.

*Anna Carolina Noel Theobald é advogada associada do escritório Dannemann Siemsen.

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