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O uso de entorpecentes e o seguro de automóvel

Cumpre esclarecer que uso de entorpecentes pode tirar não só a vida do condutor do veículo, como também de outras vítimas inocentes, resultando em graves consequências para a sociedade.

20/8/2019

O prêmio do contrato de seguro de automóvel é calculado com base no risco predeterminado, considerando as informações prestadas pelo Segurado, sendo certo que quando ocorre um agravamento de risco por parte do condutor e/ou Segurado, a Seguradora poderá negar o pagamento da indenização, pautada nos termos contratuais.

Normalmente se fala sobre a embriaguez ao volante, que é um dos principais motivos de recusa do pagamento securitário, muitas vezes por agravamento do risco, porém, outra conduta agravante de risco, que vem sendo observada pelo mercado securitário e constatada em razão de aumento do acidentes em rodovias, é o uso de entorpecentes ou substâncias psicoativas por parte dos condutores, como cocaína, anfetaminas e outras.

Assim, se restar constatado através de documento oficial o uso de alguma substância que altere o discernimento do condutor, a Seguradora poderá recusar o pagamento da indenização, com base na condições gerais do contrato que prevê que se o veículo estiver sendo conduzido por pessoa que esteja sob o uso de álcool, drogas ou entorpecentes, a mesma ficará isenta de cumprir o contrato de seguro, o que se justifica pelo aumento considerável do risco de acidentes, desequilibrando o cálculo atuarial realizado anteriormente.

De acordo com um estudo disponível na Revista Especialize On-line IPOG1 “foi constatado que as substâncias psicoativas afetam o comportamento ou o estado de espírito e agem alterando o nível de neurotransmissores”, ainda, que o uso de anfetamina e cocaína causa efeitos que interferem diretamente na condução do veículo, o que pode ser determinante para a ocorrência do acidente de trânsito.

“[...] Testes realizados em simulador de direção levaram à conclusão de que os efeitos agudos da anfetamina prejudicam o desempenho do motorista, quando passa a não sinalizar corretamente as manobras que pretende executar e as realiza em tempo superior ao necessário à tomada de decisões. O uso da cocaína está associado à condução em excesso de velocidade, perda do controle do veículo, colisões, direção agressiva e desatenta, com execução de manobras de alto risco [...]” (Uso de Substâncias psicoativas e acidentes de trânsito, p. 12).

É de conhecimento público que o uso de entorpecentes vem crescendo, principalmente entre os motoristas profissionais que muitas vezes precisam dirigir horas e horas, sem dormir, para cumprir os prazos que lhe foram determinados.

E mesmo com a criação da lei 13.103/15, conhecida como Lei do Caminhoneiro, que tem como objetivo fiscalizar o profissional dessa área, e evitar acidentes provocados pelo uso de drogas e entorpecentes nas estradas, temos que muitos motoristas são flagrados fazendo uso dessas substâncias, e infelizmente, muitas vezes essa constatação é por meio de laudo de exame cadavérico, já que vários acidentes resultam na morte dessas pessoas e outros inocentes, que nada podiam fazer para evitar o acidente.

O Código de Brasileiro de Trânsito no artigo 1652 considera que dirigir sob a influência de qualquer substância psicoativa é infração gravíssima, e tem como penalidade multa e suspensão do direito de dirigir por um determinado período.

O ministro Ricardo Cuevas ao proferir a decisão no RESp 1.485.717/SP3, considera que “a direção do veículo por um condutor alcoolizado já representa agravamento essencial do risco avençado, sendo lícita a cláusula do contrato de seguro de automóvel que preveja, nessa situação, a exclusão da cobertura securitária”.

Ainda, o r. ministro entende que há presunção relativa de que o risco foi agravado com a ingestão de bebida alcoólica pelo condutor do veículo segurado, o que apresenta similitude com o caso de uso dos entorpecentes, razão pela qual deve-se ter o mesmo entendimento.

[...] “Uma vez constatado, portanto, que o condutor do veículo estava sob influência do álcool (causa direta ou indireta) quando se envolveu em acidente de trânsito - fato esse que compete à seguradora comprovar -, há presunção relativa de que o risco da sinistralidade foi agravado, o que ensejará a aplicação da pena do art. 768 do CC.” [...]. (RESp 1.485.717 – SP)

Ora, podemos observar que o uso de substâncias entorpecentes é tão grave e prejudicial quanto o uso de álcool, já que os efeitos que essas drogas causam no organismo das pessoas influenciam diretamente na capacidade de condução do veículo.

E em que pese haver poucas decisões judiciais no sentido específico de uso de entorpecentes e substâncias químicas, os casos devem ser julgados por analogia aos de embriaguez, já que tais substâncias psicoativas são suficientes para agravar o risco do contrato de seguro e, consequentemente, a negativa do pagamento da indenização por perda de direito contratual, com base no artigo 798 do Código Civil.

O Judiciário, ao determinar o pagamento de uma indenização no caso de negativa por agravamento de risco, está não somente prejudicando todo um grupo segurado e, por consequência, a mutualidade, representada por todos aqueles que pagam seguro e que em algum momento irão arcar com esse custo, como também acaba incentivando o descumprimento da norma legal. Cumpre esclarecer que uso de entorpecentes pode tirar não só a vida do condutor do veículo, como também de outras vítimas inocentes, resultando em graves consequências para a sociedade.

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1 Artigo: Uso de Substâncias psicoativas e acidentes de trânsito - Issn 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG – Goiânia – 13ª Edição n. 013 Vol. 1/17 – Julho/2017

2  Art. 165.  Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela lei 11.705, de 2008)

Infração - gravíssima; (Redação dada pela lei 11.705, de 2008)

 

3 RESp 1.485.717 – SP (2014/0116431-2), relator ministro Ricardo Villas Bôas Cuevas, DJe 14/12/16

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*Ludmilla Coelho é advogada sócia do escritório Jacó Coelho Advogados.

 

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