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Vara criminal especializada em crime organizado e a efetividade da justiça criminal

Trata-se de tema complexo e que desperta muitos debates e discussões acadêmicas e jurídicas.

5/7/2019

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por meio da resolução TJ/OE/RJ 10/191, aprovada pelo Órgão Especial, criou no dia 1º/7/19 a 1ª Vara Criminal Especializada da Comarca da Capital, por transformação, da 25ª Vara Criminal da Comarca da Capital2.

Cumpre fazer breve escorço histórico.

No ano de 2006, o CNJ publicou a Recomendação 3, pugnando ao Conselho da Justiça Federal e aos Tribunais Regionais Federais, no que respeita ao Sistema Judiciário Federal, bem como aos Tribunais de Justiça dos Estados, a especialização de varas criminais, com competência exclusiva ou concorrente, para processar e julgar delitos praticados por organizações criminosas, destacando, já naquela oportunidade, a necessidade de o Estado combater o crime organizado, mediante a concentração de esforços e de recursos públicos.

Assentou-se, ainda, que a especialização no combate ao crime organizado já havia sido levada a efeito pelo Ministério Público e pelas Forças Policiais, sendo que a especialização de varas tem se revelado medida salutar, com notável incremento na qualidade e na celeridade da prestação jurisdicional, em especial para o processamento de delitos de maior complexidade, seja quanto ao modus operandi, seja quanto ao número de pessoas envolvidas3.

Nesse sentido, o CNJ preconizou que a especialização se desse, preferencialmente, pela transformação de varas, sendo que as que se tornassem especializadas em crime organizado deveriam contar com mais de um juiz4, bem como com estrutura material e de pessoal especializado compatível com sua atividade. No ponto, cumpre destacar que os Tribunais de Justiça dos Estados estão autorizados a especializar varas nos termos da legislação de organização judiciária local.

Transcorridos 10 anos, o próprio CNJ publicou que:

Crimes de facções criminosas passaram a seguir rito próprio na maior parte do país. Há 10 anos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) propôs a criação de varas especializadas no processamento e julgamento desses delitos, a fim de agilizar o trâmite dos casos. Em 2016, o total delas chegou a 62. Seis Tribunais de Justiça (TJs) e três Regionais Federais (TRFs) aderiram à recomendação. Mesmo sem unidades dedicadas, outras 12 cortes da Justiça passaram a adotar um protocolo específico em relação a esse tipo de crime. A aposta é de que, a cada dia, a especialização se torne ferramenta essencial para o amadurecimento do combate ao crime organizado no Brasil...

Em proporção, a adesão às varas dedicadas é maior na Justiça Federal: três dos cinco Tribunais Regionais Federais mantêm unidades. Sozinho, o TRF4 detém 79% (44 de 56) das varas com competência do tipo na esfera federal. Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná formam a jurisdição do órgão. Porto Alegre (RS), por exemplo, foi a primeira cidade do país, em 2003, a sediarespecializada em lavagem de dinheiro e crimes contra o Sistema Financeiro Nacional...

Além do Mato Grosso, instalaram varas específicas os tribunais estaduais de Alagoas, Pará, Bahia, Roraima e Santa Catarina. Os tribunais federais da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo) e 5ª Região (Ceará, Alagoas, Paraíba, Sergipe, Pernambuco, e Rio Grande do Norte) também possuem unidades próprias. Nos demais, casos do tipo são julgados nas varas criminais.5

No ano de 2018, o tema foi matéria do Jornal O Globo, que noticiou:

Apesar de o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ter recomendado, em 2006, aos tribunais estaduais a criação de varas especializadas em lavagem de dinheiro e organização criminosa, pouco foi feito desde então. Uma pesquisa inédita da Transparência Internacional mostra que só existem no país sete varas. O levantamento revela ainda que o maior tribunal estadual do país, em São Paulo, não possui uma vara deste tipo. O mesmo ocorre no Rio de Janeiro6.

Com efeito, no âmbito federal o panorama começou a se modificar antes, ressaltando-se que o Conselho da Justiça Federal (CJF), por meio da resolução CJF-RES-2013/00273, de 18 de dezembro de 2013, determinou que:

Art. 1º Os tribunais regionais federais, na área de sua jurisdição, deverão especializar varas federais criminais com competência exclusiva ou concorrente para processar e julgar:

I - os crimes contra o sistema financeiro nacional e de lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores;

II - os crimes praticados por organizações criminosas, independentemente do caráter transnacional ou não de suas infrações, assim definidas no § 1º do art. 1º da lei 12.850, de 2 de agosto de 2013.

Parágrafo único. Nas seções judiciárias onde houver três ou mais varas federais com competência criminal exclusiva, a especialização a que se referem os incisos deste artigo recairá em pelo menos duas delas, conforme o que dispuser o normativo de cada tribunal regional federal.7

De fato, a multiplicidade e especificidade dos meios de obtenção da prova previstos na lei de Organização Criminosa, como a colaboração premiada, a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, a ação controlada, a infiltração, por policiais, em atividade de investigação, além das interceptações, quebras de sigilo de dados variados e cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e municipais na busca de provas e informações de interesse da investigação ou da instrução criminal, resultam em grande volume de dados a serem analisados e valorados.

Essa complexidade dos processos envolvendo organizações criminosas e a lavagem de dinheiro, frequentemente associada a um grande número de réus, torna imperiosa a especialização de varas para o processamento e julgamento destes crimes, não só para que se possa zelar pela duração razoável dos processos, nos termos do art. 5º, LXXVIII, da CRFB/88, mas também para concretizar a efetividade da Justiça Criminal.

Ora, evidente a necessidade de combater o crime organizado, mediante concentração de esforços e de recursos públicos, por força da grande sofisticação e complexidade estrutural, bem como por irradiarem consequências econômicas e sociais por todo o Brasil.

Nesse sentido, a especialização de varas tem se revelado medida salutar, com notável incremento na qualidade e na celeridade da prestação jurisdicional. O pioneirismo da Justiça Federal, constatado pelo CNJ, já resultou em resultados expressivos, inclusive com a recuperação de bilhões de reais8 Com efeito, imperioso reconhecer a imprescindibilidade da atuação do Poder Judiciário para a interrupção do fluxo de capitais oriundos de atividades ilícitas e sua recuperação.

Ademais, os riscos para a segurança pessoal dos magistrados responsáveis por julgar tais crimes9 e a necessidade de adoção de rotinas diferenciadas de segurança, inclusive no processamento, instrução e julgamento destes processos também corroboram a necessidade de especialização, uma vez que fóruns centrais gozam de estrutura muito mais adequada, até pelo maior efetivo de segurança e monitoramento.

A despeito de existirem questionamentos, cumpre ressaltar que a Suprema Corte, ao julgar o HC 88.660/CE, já reconheceu a validade da especialização de varas por meio de resolução:

HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. RESOLUÇÕES 10-A/03, DO TRF DA 5ª REGIÃO, 314/03, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA RESERVA LEGAL, DA SEPARAÇÃO DOS PODERES, DO JUIZ NATURAL E DE INOBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 75, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: IMPROCEDÊNCIA. VALIDADE JURÍDICA DA ESPECIALIZAÇÃO DE VARA FEDERAL PARA PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DE CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E DE LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DE BENS, DIREITOS E VALORES. ORDEM DENEGADA.

1. Ao determinar a especialização de varas pela resolução 10-A, de 11.6.03, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região restringiu-se a suas atribuições legais, sem ofensa a dispositivo constitucional ou legal.

2. A regra do art. 75, parágrafo único, do Código de Processo Penal não é absoluta, restringindo-se a sua aplicação aos casos em que o Juízo prevento deixa de existir ou se dele for retirada a competência para o julgamento da causa.

3. Ordem denegada.

(HABEAS CORPUS 88.660/CEARÁ - RELATORA : MIN. CÁRMEN LÚCIA - 15/5/08 - PLENÁRIO)

Sepultando qualquer dúvida, cumpre trazer à baila decisões do STJ:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 157, §§ 1° E 2°, INCISOS I, II E V C/C O ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. DIVERSAS TESES QUE NÃO FORAM SUBMETIDAS AO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NULIDADES DO FLAGRANTE. ALEGAÇÕES PREJUDICADAS PELA DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. LEI ESTADUAL. CRIAÇÃO DE VARA JUDICIAL E ESPECIALIZAÇÃO DE SUA COMPETÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL. PRISÃO PREVENTIVA. APONTADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PECULIARIDADES DO CASO.

I - Como as teses de incompetência do Juízo em razão da matéria; suspeição de magistrados; ilegalidade das escutas telefônicas e excesso de prazo para o término da instrução criminal sequer foram apresentadas ao tribunal de origem, e por essa razão, não foram apreciadas no bojo do writ originário, fica esta corte impedida de examiná-las sob pena de supressão de instância (precedentes).

II - Com a decretação da prisão preventiva do paciente restam prejudicadas as alegações de nulidades da prisão em flagrante, pois a segregação agora decorre de novo título judicial (precedentes).

III- A matéria de organização judiciária é de competência dos Estados, cabendo ao Tribunal de Justiça propor a criação de novas Varas Judiciais. Ademais, o Pretório Excelso já manifestou entendimento no sentido de que especializar varas e atribuir competência por natureza de feitos sequer é matéria alcançada pela reserva de lei em sentido estrito, podendo ser tratada em norma regulamentar ou regimental pelo próprio Poder Judiciário (v. g.: HC 91509, 2ª Turma, rel. min. Eros Grau, e HC 91024, 2ª Turma, Relª. Minª. Ellen Gracie). In casu, lei estadual criou nova Vara Judicial, atribuindo-lhe competência exclusiva para processar e julgar os delitos envolvendo atividades de organizações criminosas, não havendo, pois, qualquer violação ao princípio da reserva legal.

IV - ...

(HC - HABEAS CORPUS – 156872 - Relator(a) FELIX FISCHER - STJ - QUINTA TURMA – Data 6/4/10 - Data da publicação 3/5/10)

RECURSO EM HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO FATURA EXPOSTA. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE CONEXÃO. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. É cediço que ninguém será privado da liberdade sem o devido processo legal desenvolvido perante a autoridade competente e que a garantia do juízo natural é uma das mais eficazes condições de sua independência e imparcialidade.

2. O poder de julgar é uno, mas razões de ordem prática obrigam sua distribuição aos vários órgãos jurisdicionais, sempre de acordo com as regras constitucionais e legais preestabelecidas, que preveem, inclusive, as hipóteses de prorrogação de competência.

3. Não viola o princípio do juiz natural a atração de processos por conexão nem a criação de varas especializadas para julgar determinados crimes, consoante já decidido pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal.

4. A prorrogação de competência, por força de conexão probatória, é aceita quando houver dependência ou vínculo existente entre os fatos, desde que formem uma espécie de unidade, para que o julgador tenha visão uniforme do quadro probatório, evitando-se decisões díspares.

5. Não há ilegalidade no aresto combatido no ponto em que reconheceu conexão como critério de fixação da competência por prevenção, pois, deveras, apesar das múltiplas ações penais, a prova de um crime influencia significativamente na prova de outros, uma vez que todos fazem parte do mesmo esquema criminoso, o qual, em razão de sua amplitude, deu ensejo ao desdobramento das investigações. O art. 76, III, do CPP não define o grau de interferência das provas nem estabelece imprescindível relação de prejudicialidade entre os delitos.

6. Correta a distribuição, por prevenção, da denúncia oferecida em desfavor dos recorrentes, derivada da Operação Fatura Exposta. Além de a competência absoluta, de natureza material, estar preservada, existe conexão instrumental vis-à-vis a influência entre uns e outros delitos apurados na anterior Operação Calicute, visto que todos os fatos formam uma unidade e possuem como gênese a obtenção de vantagens indevidas por meio de atividades ilícitas de idêntica organização criminosa, estruturada com o propósito de cobrar percentual de propina em contratos públicos do Estado do Rio de Janeiro, com a posterior dissimulação dos ativos ilícitos amealhados.

7. ...

9. Os atos de corrupção, pertencimento a organização criminosa e lavagem de ativos, portanto, foram praticados no mesmo tempo e lugar. Eles formam uma unidade, visto que fazem parte de imenso esquema de corrupção instalado no governo estadual. Não há como negar a relação parte/todo entre os fatos, que poderão ser melhor reconstruídos perante um único Juiz, que detem a mesma competência predeterminada dos demais Juízos Criminais, todos titularizados por magistrados que ingressaram no cargo por meio de concurso público que devem atuar de forma imparcial e independente. A prevenção por conexão propiciará economia e celeridade na prestação jurisdicional e evitará a prolação de decisões conflitantes, interesses não só do Juiz e do Ministério Público, mas também da defesa.

10. Recurso ordinário não provido.

(RHC - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS -93295 - Relator(a) ROGERIO SCHIETTI CRUZ - STJ - SEXTA TURMA – Data 16/8/18 - Data da publicação 28/8/18)

Cumpre registrar que a magistratura fluminense está, pelo nono ano consecutivo, em primeiro lugar no ranking de produtividade do relatório “Justiça em Números”, conforme divulgou o próprio CNJ (Conselho Nacional de Justiça), durante o XII Encontro Nacional do Poder Judiciário, em Brasília (DF).10

Nesse diapasão, a criação, por transformação, de uma vara especializada no julgamento de organizações criminosas e lavagem de dinheiro impactará positivamente na efetividade da Justiça Criminal carioca, permitindo que o Poder Judiciário de nosso estado mantenha o protagonismo e permaneça sendo um paradigma no Brasil.

Ademais, no âmbito do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), já há um grupo de atuação especial no combate ao crime organizado instituído há muitos anos, consoante a resolução GPGJ 1.570 de 5 de março de 2010, maximizando-se a sinergia entre as instituições e, como consequência, os resultados positivos para a sociedade.

Assim, indubitável que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro deu um grande passo para o aprimoramento da Justiça Criminal. Cumpre salientar, contudo, que a recomendação CNJ 03, datada do distante ano de 2006, já apontava que as varas especializadas em tela deveriam contar com mais de um juiz, sendo as varas colegiadas, com titularidade plúrima, o paradigma contemporâneo para processamento e julgamento dos crimes de organização criminosa e conexos.

Nesse sentido, no ano de 2007, por meio da lei estadual 6.806, o TJ/AL criou vara criminal de titularidade coletiva com competência exclusiva para processar e julgar delitos praticados por organizações criminosas dentro do território alagoano.

Primordial ressaltar que o STF se debruçou sobre essa criação no julgamento realizado em 31/5/12 (ADI 4414/AL), de relatoria do ministro Luiz Fux, no qual foi decidido que:

 

1. Os delitos cometidos por organizações criminosas podem submeter-se ao juízo especializado criado por lei estadual, porquanto o tema é de organização judiciária, prevista em lei editada no âmbito da competência dos Estados-membros (art. 125 da CRFB). Precedentes (ADI 1218, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 5/9/02, DJ 08-11-2002; HC 96104, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 16/6/10, Dje-145; HC 94146, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 21/10/08, Dje-211; HC 85060, Relator(a): Min. EROS GRAU, Primeira Turma, julgado em 23/9/08, Dje-030; HC 91024, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 5/8/08, Dje-157). Doutrina (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado, 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 278-279). 

2. O conceito de “crime organizado” é matéria reservada à competência legislativa da União, tema interditado à lei estadual, à luz da repartição constitucional (art. 22, I, CRFB).

3. À lei estadual não é lícito, a pretexto de definir a competência da Vara especializada, imiscuir-se na esfera privativa da União para legislar sobre regras de prevalência entre juízos (arts. 78 e 79 do CPP), matéria de caráter processual (art. 22, I, CRFB).

4. A competência constitucional do Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII) não pode ser afastada por lei estadual, nem usurpada por Vara Criminal Especializada, sendo vedada, ainda, a alteração da forma de sua composição, que deve ser definida em lei nacional. Precedentes do Pleno deste Pretório Excelso (ADI 1218/RO, rel. min. MAURÍCIO CORRÊA, julg. 5/9/02, Tribunal Pleno).

5. A composição do órgão jurisdicional se insere na competência legislativa concorrente para versar sobre procedimentos em matéria processual, mercê da caracterização do procedimento como a exteriorização da relação jurídica em desenvolvimento, a englobar o modo de produção dos atos decisórios do Estado-juiz, se com a chancela de um ou de vários magistrados (Machado Guimarães. Estudos de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro - São Paulo: Jurídica e Universitária, 1969. p. 68).

6. A independência do juiz nos casos relativos a organizações criminosas, injunção constitucional, na forma do art. 5º, XXXVII e LIII, da CRFB, não está adequadamente preservada pela legislação federal, constituindo lacuna a ser preenchida pelos Estados-membros, no exercício da competência prevista no art. 24, § 3º, da Carta Magna.

7. Os Estados-membros podem dispor, mediante lei, sobre protocolo e distribuição de processos, no âmbito de sua competência para editar normas específicas sobre procedimentos em matéria processual (art. 24, XI, CRFB).

8. A separação entre as funções de acusar defender e julgar é o signo essencial do sistema acusatório de processo penal (art. 129, I, CRFB), tornando a atuação do Judiciário na fase pré-processual somente admissível com o propósito de proteger as garantias fundamentais dos investigados (FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón – Teoría del Garantismo Penal. 3ª ed., Madrid: Trotta, 1998. p. 567).

...

10. O princípio do juiz natural não resta violado na hipótese em que lei estadual atribui a Vara especializada competência territorial abrangente de todo o território da unidade federada, com fundamento no art. 125 da Constituição, porquanto o tema gravita em torno da organização judiciária, inexistindo afronta aos princípios da territorialidade e do Juiz natural.

11. A perpetuatio jurisdictionis é excepcionada nas hipóteses de modificação da competência ratione materiae do órgão, motivo pelo qual é lícita a redistribuição dos inquéritos policiais para a nova Vara Criminal, consoante o art. 87, in fine, do CPC. Precedentes (HC 88.660-4, rel. min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julg. 15.5.08; HC 85.060, rel. min. Eros Grau, Primeira Turma, julg. 23.9.08; HC 76.510/SP rel. min. Carlos Velloso, Segunda Turma, julg. 31.03.1998). Doutrina (CARNELUTTI, Francesco. Sistema di Diritto Processuale Civile. V. III. Padova: CEDAM, 1939. p. 480; MARQUES, José Frederico. Enciclopédia Saraiva do Direito. Vol. 46. p. 446; TORNAGHI, Tornaghi. Instituição de Processo Penal. Vol. I. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 174).

12. A lei estadual que cria Vara especializada em razão da matéria pode, de forma objetiva e abstrata, impedir a redistribuição dos processos em curso, através de norma procedimental (art. 24, XI, CRFB), que se afigura necessária para preservar a racionalidade da prestação jurisdicional e uma eficiente organização judiciária (art. 125 CRFB) (GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. V. I. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 174-175; DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. V. I. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 365-366).

...

14. A criação, no curso do processo, de órgão julgador composto pelo magistrado que se julga ameaçado no exercício de suas funções e pelos demais integrantes da Vara especializada em crime organizado é inconstitucional, por afronta aos incisos LIII e XXXVII do artigo 5º da Carta Magna, que vedam, conforme mencionado alhures, o poder de comissão, é dizer, a criação de órgão jurisdicional ex post facto, havendo, ainda, vício formal, por se tratar de matéria processual, de competência da União (art. 22, I, CRFB).

19. Os juízes integrantes de Vara especializada criada por lei estadual devem ser designados com observância dos parâmetros constitucionais de antiguidade e merecimento previstos no art. 93, II e VIII-A, da Constituição da República, sendo inconstitucional, em vista da necessidade de preservação da independência do julgador, previsão normativa segundo a qual a indicação e nomeação dos magistrados que ocuparão a referida Vara será feita pelo Presidente do Tribunal de Justiça, com a aprovação do Tribunal. Doutrina (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2ª ed. São Paulo: RT, 2006. p. 534; GARAPON, Antoine. O juiz e a democracia. Trad. Maria Luiza de Carvalho. Rio de Janeiro: Revan, 1999. p. 60; CARNELUTTI, Francesco. Sistema di Diritto Processuale Civile. V. I. Padova: CEDAM, 1936. p. 647-651; Idem. Lezioni di Diritto Processuale Civile. V. Terzo. Padova: CEDAM, 1986. p. 114; GUIMARÃES, Mário. O Juiz e a Função Jurisdicional. Rio de Janeiro: Forense, 1958. p. 117).

20. O mandato de dois anos para a ocupação da titularidade da Vara especializada em crimes organizados, a par de afrontar a garantia da inamovibilidade, viola a regra da identidade física do juiz, componente fundamental do princípio da oralidade, prevista no art. 399, § 2º, do CPP (“O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença”), impedindo, por via oblíqua, a aplicação dessa norma cogente prevista em leinacional, em desfavor do Réu, usurpando a competência privativa da União (art. 22, I, CRFB). Doutrina (CHIOVENDA, Giuseppe. A oralidade e a prova. In: Processo Oral. 1ª série. Rio de Janeiro: Forense, 1940. p. 137).

21. O princípio do Juiz natural obsta “qualquer escolha do juiz ou colegiado a que as causas são confiadas”, de modo a se afastar o “perigo de prejudiciais condicionamentos dos processos através da designação hierárquica dos magistrados competentes para apreciá-los” (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2ª ed. São Paulo: RT, 2006. p. 545), devendo-se condicionar a nomeação do juiz substituto, nos casos de afastamento do titular, por designação do Presidente do Tribunal de Justiça, à observância de critérios impessoais, objetivos e apriorísticos. Doutrina (LLOBREGAT, José Garberí. Constitución y Derecho Procesal – Los fundamentos constitucionales del Derecho Procesal. Navarra: Civitas/Thomson Reuters, 2009. p. 65-66)...

Assim, restou reconhecida pela Suprema Corte a validade da criação, por meio de lei estadual, de varas colegiadas especializadas em razão da matéria.

Destaque-se, ainda, que a lei federal 12.694/12 já dispunha sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas, prevendo que:

Art. 1o Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente:

...

§ 6o As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.

§ 7o Os tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento.

Aliás, o PL 10.372/18, apresentado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, engloba proposta de alteração da leisupracitada nos termos a seguir:

Art. 6º. O caput e os parágrafos 1º, 2º e 3º do art. 1º da lei 12.694, de 24 de julho de 2012, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º.Os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais instalarão, nas comarcas sedes de Circunscrição ou Seção Judiciária, mediante resolução, Varas Criminais Colegiadas com competência para o processo e julgamento de todos os crimes mencionados na lei 12.850, de 2 de agosto de 2013, e do artigo 288-A do Código Penal, bem como para as infrações penais conexas.

§ 1º. As Varas Criminais Colegiadas terão competência para todos os atos jurisdicionais no decorrer da investigação, da ação penal e da execução da pena, inclusive a transferência do preso para estabelecimento prisional de segurança máxima ou para regime disciplinar diferenciado;

§ 2º. Ao receber, segundo as regras normais de distribuição, processos ou procedimentos que tenham por objeto os crimes mencionados no caput, o juiz deverá declinar da competência e remeter os autos, em qualquer fase em que se encontrem, à Vara Criminal Colegiada de sua Circunscrição ou Seção Judiciária;

§ 3º Feita a remessa mencionada no parágrafo anterior, a Vara Criminal Colegiada terá competência para todos os atos processuais posteriores, incluindo a fase de execução; (NR)

Cabe trazer à baila trecho de matéria divulgada no site da AMERJ11:

À frente do grupo de Segurança Pública e Institucional no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), quer difundir no Brasil a criação de varas colegiadas para processar delitos praticados pelo crime organizado e conexos. Moraes afirmou ao jornal “O Estado de S. Paulo” que não há como combater este tipo de criminalidade sem que o Estado ofereça condições mínimas de segurança aos magistrados, que ficam expostos ao julgar, de forma individual, os membros de organizações ligadas ao tráfico de drogas e armas, por exemplo.

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Para serem implantadas no Brasil, as varas colegiadas precisam de aprovação legislativa. No âmbito estadual, os tribunais devem enviar projeto de lei para às Assembleias Legislativas.

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A criação de uma central de inteligência que cruze informações relativas às organizações criminosas com as polícias e Forças Armadas é outra medida que o ministro da Suprema Corte deseja implantar. A proposta, que não é vista como controversa, também será discutida no evento em fevereiro, e, de acordo com Moraes, é algo que poderia ser feito diretamente pelo Judiciário.

“Hoje não há um banco de dados de inteligência do Judiciário. E o Judiciário é que tem mais condições de fazer isso, porque ele pega informações da polícia, do Ministério Público”, exemplificou o ministro, que foi chamado para presidir o grupo no CNJ pelo presidente do conselho e do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli.

Como as varas colegiadas seriam, em tese, restritas e organizadas só para casos específicos, a ideia de Moraes é que esses órgãos funcionem como centrais para o sistema de inteligência do Judiciário. Para o ministro, a estrutura funcionará tanto para a prevenção de ameaças como no auxílio ao combate do crime organizado. “O juiz de São Paulo que está analisando processos de uma organização criminosa vai descobrir pelo jornal que essas pessoas processadas têm 30 imóveis em Fortaleza.”

Merece destaque também matéria divulgada no Jornal Folha de São Paulo em 17/3/19, anunciando que o CNJ iria propor aos tribunais a criação de varas colegiadas para processar e julgar exclusivamente delitos de organizações criminosas12:

“O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) (disponível aqui) vai propor aos tribunais a criação de varas colegiadas para processar e julgar exclusivamente delitos de organizações criminosas (disponível aqui).

A ideia é reproduzir nacionalmente a experiência de Alagoas, que, em 2007, instituiu a 17ª Vara Criminal da Capital, centralizando em Maceió os inquéritos e denúncias vindos de todo o estado.

A ampliação das varas colegiadas será um dos itens de encontro que o CNJ promoverá nestas segunda (25) e terça (26), em Brasília. O grupo de Segurança Pública do CNJ é coordenado pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), um defensor do modelo (disponível aqui).

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A vara possui três juízes titulares. As decisões são unânimes, assinadas pelos três. Não há publicação de voto divergente, mesmo que não tenha havido unanimidade nas discussões. Acredita-se que isso dilui a responsabilidade individual, preserva o magistrado de pressões e reduz o risco de erro judicial. É uma versão amenizada dos "juízes sem rosto" da Itália.

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O juiz André Avancini, titular da 17ª Vara Criminal de Maceió, diz que "a vara colegiada preserva a integridade física dos juízes e dá mais tranquilidade nos julgamentos, livres de influências externas".

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"As varas colegiadas são eficazes na segurança dos magistrados e no compartilhamento de informações de inteligência", diz Gilson Dipp, ex-corregedor nacional de Justiça. Ele foi inspirador das varas federais especializadas em lavagem de dinheiro.

Dipp diz que a ampliação das varas colegiadas deveria ter sido contemplada no projeto de lei anticrime (disponível aqui) do ministro Sergio Moro (disponível aqui). "Bastaria uma sinalização forte do ministro para estimular os governos estaduais", afirma.

"Já introduzimos em lei anterior a proposta do colegiado de juízes para decisões contra o crime organizado", diz Moro. "O Supremo Tribunal Federal já reputou constitucional a lei estadual de Alagoas que criou a vara colegiada. Então, os estados já podem criar as suas varas", afirma ele.

Moro refere-se à lei 12.694/12, que possibilitou ao juiz ameaçado instaurar um colegiado, com mais dois juízes que são escolhidos por sorteio eletrônico.

...

As varas colegiadas dependem de lei estadual. A especialização foi prevista em recomendação do CNJ, em 2006, na gestão de Ellen Gracie.

À guisa de exemplo, cumpre transcrever excertos da lei do Estado da Bahia 13.375/15 e da lei do Estado do Ceará 16.505/18:

Lei do Estado da Bahia 13.375/15

Art. 2º A lei 10.845, de 27 de novembro de 2007, passa a vigorar acrescida do inciso XX ao art. 130 e dos arts. 130-A e 130-B, com as seguintes redações:

"Art. 130 -...

XX - 1 (uma) Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa.

...

"Art. 130-A - Compete exclusivamente à Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa processar e julgar os delitos envolvendo atividades de organizações criminosas, conforme o conceito estabelecido no artigo 1º, §§ 1º e 2º, da lei federal 12.850, de 02 de agosto de 2013, com jurisdição em todo território do Estado da Bahia.

...

"Art. 130-B - A Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa terá titularidade coletiva e será composta por 03 (três) magistrados de entrância final, cujos cargos serão providos por intermédio dos critérios previstos no art. 93, incisos II e VIII, da Constituição Federal de 1988.

§ 1º - Em caso de impedimento, suspeição, férias ou qualquer afastamento de um ou mais titulares, a substituição dar-se-á por critérios apriorísticos, objetivos e impessoais, definidos através de resolução do tribunal e do CNJ.

§ 2º - Os Juízes da Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa, observadas as disposições da lei federal 12.694, de 24 de julho de 2012, e após deliberação prévia, decidirão e assinarão, em conjunto, todos os atos judiciais de competência da Vara, sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.

§ 3º - Os despachos de mero expediente e todos aqueles sem conteúdo decisório poderão ser assinados por quaisquer dos juízes.

§ 4º - As audiências poderão ser presididas por um só dos magistrados, exceto na hipótese de prolação de sentenças e atos decisórios, quando então a participação dos demais será obrigatória.

Lei do Estado do Ceará 16.505/18:

Art. 1º A Seção I, do Capítulo IV, do Título III, do Livro I, da lei 16.397, de 14 de novembro de 2017, passa a vigorar acrescida da seguinte Subseção IV:

“Subseção IV

Da Vara de Delitos de Organizações Criminosas

Art. 49-A. À Vara de delitos de organizações criminosas, com sede na capital e jurisdição em todo o território do Estado do Ceará, compete processar e julgar, exclusivamente, os delitos envolvendo atividades de organizações criminosas, na forma como definidos em legislação federal, de modo especial na lei federal 12.850, de 2 de agosto de 2013, de competência da Justiça estadual.

...

Art. 49-B. A Vara de delitos de organizações criminosas terá titularidade coletiva e será composta por 3 (três) magistrados de entrância final, cujos cargos serão providos de acordo com os critérios previstos no art. 93, incisos II e VIII-A, da Constituição Federal.

§ 1º Os juízes da Vara de Delitos de Organizações Criminosas, observadas as disposições da lei Federal nº 12.694, de 24 de julho de 2012, decidirão e assinarão, em conjunto, todos os atos judiciais de competência da unidade, sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.

Ante o exposto, consignamos nossas palmas para a louvável iniciativa do presidente do TJRJ, desembargador Claudio de Mello Tavares, uma vez que havia urgência na criação de vara especializada no julgamento de crimes de organização criminosa, milícia e lavagem de dinheiro, consubstanciando tal medida, de fato, grande passo para uma jurisdição criminal mais efetiva.

Consta, contudo, da resolução criadora que a 1ª Vara Criminal Especializada contará com auxílio permanente de 02 (dois) ou mais juízes de direito, bem como foi noticiada a possibilidade de criação de outras varas criminais especializadas13.

Ponderamos, no ponto, pela reflexão quanto a possibilidade de criação, por meio de lei estadual, em um segundo momento, de vara especializada que seja colegiada, o que permitiria que fosse insculpida previsão legal autorizando que a tomada de decisões e prolação de sentenças ocorresse após deliberação prévia, de forma os titulares assinariam, em conjunto, todos os atos judiciais de competência da Vara, sem qualquer referência a voto divergente. Com efeito, nesse sentido era a manifestação da AMAERJ, sob o argumento de que este seria o paradigma contemporâneo e poderia se mostrar um modelo ainda mais adequado para a Justiça do Estado do Rio de Janeiro e os desafios que esta enfrenta no campo criminal.

Sem dúvidas, trata-se de tema complexo e que desperta muitos debates e discussões acadêmicas e jurídicas. Certo, todavia, é que iniciativas que contribuam para o aprimoramento da Justiça Criminal e o próprio enfrentamento do tema “criminalidade organizada”, que tanto aflige nossa pátria, merecem todos os elogios, consubstanciando o giro empírico-pragmático que tanto defendemos, razão pela qual reiteramos nossos aplausos.

_________________ 

1 RESOLUÇÃO TJ/OE/RJ 10/19

Cria a 1ª Vara Criminal Especializada da comarca da capital, por transformação, da 25ª Vara Criminal da Comarca da Capital.

O ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelos artigos 96, I “a)” e 99 da Constituição Federal, bem como artigo 3º, VI, “a” do Regimento Interno do Tribunal de Justiça e tendo em vista o decidido na sessão de julgamento do dia 1º de julho de 2019 (Processo 2019-0027218);

CONSIDERANDO que o art. 3º, § 1º da lei estadual 6.956, de 13 de janeiro de 2015, que dispõe sobre a Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Rio de Janeiro (LODJ), faculta ao Tribunal de Justiça, mediante resolução, sempre que necessário para a adequada prestação jurisdicional e sem aumento de despesa, alterar a competência, a estrutura e a denominação dos órgãos judiciários, bem como determinar a redistribuição dos feitos;

CONSIDERANDO que a reorganização da estrutura judiciária se mostra imprescindível ao melhor aproveitamento dos recursos existentes e à otimização da prestação jurisdicional;

CONSIDERANDO o deliberado na 93ª Sessão da Comissão de Políticas Institucionais para Eficiência Operacional e Qualidade dos Serviços Judiciais (COMAQ), realizada em 29 de abril de 2019, de sugerir à Alta Administração do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que a criação da 1ª Vara Criminal Especializada da Comarca da Capital se dê, por transformação, da 25ª Vara Criminal da Comarca da Capital, ante a concordância de seu juiz titular, mantendo-se a vinculação do Juizado do Torcedor e dos Grandes Eventos do Estado do Rio de Janeiro, até que se edite novo Ato Executivo;

CONSIDERANDO, por fim, o decidido no processo administrativo 2019-0027218;

RESOLVE:

Art. 1º. Criar a 1ª Vara Criminal Especializada da Comarca da Capital, por transformação, da 25ª Vara Criminal da mesma Comarca, aproveitando se no novo órgão os cargos de Juiz de Direito, de Chefe de Serventia e demais servidores da Serventia.

Art. 2º. A 1ª Vara Criminal Especializada, com sede no Foro Central da Capital, é considerada juízo criminal especializado em razão da matéria e da natureza da infração e terá competência sobre toda a área territorial do Estado do Rio de Janeiro para processar e julgar, exclusivamente, os seguintes delitos e os que forem a eles conexos:

I - As atividades de organizações criminosas, qualquer que seja o meio, modo ou local de execução, na forma como definidos em legislação federal, em especial na lei 12.850, de 2 de agosto de 2013, de competência da Justiça Estadual;

II - Constituição de milícia privada - artigo 288-A do Código Penal Brasileiro;

III - “Lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores - artigo 1º, caput e parágrafos da lei federal 9.613, de 3 de março de 1998, de competência da Justiça Estadual;

§ 1º. A competência definida no caput prevalecerá sobre a dos demais Juízos de Direito em Matéria Criminal, previstos na lei estadual 6.956/15 (LODJ), que dispõe sobre a Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Rio de Janeiro, ressalvada a competência constitucional dos Tribunais do Júri e da Vara de Execuções Penais.

§ 2º. Não haverá redistribuição dos processos em curso na 25ª Vara Criminal, ora transformada, e, também, dos inquéritos policiais com distribuição e ações penais, inclusive cautelares ou procedimentos criminais diversos, instaurados ou em tramitação, cujas respectivas competências foram firmadas antes da vigência da presente resolução.

§ 3º. A 1ª Vara Criminal Especializada contará com auxílio permanente de 02 (dois) ou mais juízes de direito, em exercício pleno, mediante Ato do Presidente do Tribunal de Justiça.

Art. 3º. A 1ª Vara Criminal Especializada contará com a estrutura funcional da Central de Assessoramento Criminal - CAC que passará a atendê la unicamente e com vinculação, ficando vedada a remessa de feitos oriundos de outros Juízos com competência em matéria criminal.

§ 1º. Deverão permanecer na CAC todos os processos de Juízos, com competência em matéria criminal não especializada, que estejam em tramitação, na vigência desta resolução, obedecendo se aos critérios de condução e impulsionamento de cada Juiz natural.

§ 2º. As questões de cunho administrativo, relativas ao funcionamento da CAC, serão dirimidas pelo Juiz titular da 1ª Vara Criminal Especializada.

§ 3º. A Vara, ora criada, utilizará, preferencialmente, as salas de audiência da CAC, sem prejuízo da utilização por outros Juízos, mediante requerimento ao juiz coordenador, titular da 1ª Vara Criminal Especializada.

Art. 4º. A instalação da 1ª Vara Criminal Especializada será formalizada por ato executivo do presidente do Tribunal de Justiça.

Art. 5º. A presente resolução entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as disposições em contrário.

2 Disponível aqui. Último acesso em 2/7/19.

3 Disponível aqui. Último acesso em 17/3/19.

4 Ainda no ano de 2006, o conselheiro Paulo Lôbo, da comissão de especialização de varas, câmaras e turmas do CNJ, já propunha a divisão de trabalho: "É preciso que se pense com cuidado em um modelo que não restrinja o trabalho da vara em um único magistrado. O ideal seria dividir essa tarefa entre um grupo de juízes". Disponível aqui. Último acesso em 17/3/19.

5 Disponível aqui. Último acesso em 17/3/19.

6 Disponível aqui. Último acesso em 17/3/19.

7 Disponível aqui. Último acesso em 17/3/19.

8 Disponível aqui. Último acesso em 17/3/19.

9 Levantamento do CNJ revelado pelo jornal em maio mostrou que, à época, havia 110 magistrados sob ameaça no País – seis em cada mil juízes. Moraes observa que a proteção desses magistrados é atualmente feita de forma repressiva, e não preventiva. O mapeamento feito pelo CNJ mostra justamente que os riscos na atuação profissional são maiores para os juízes de primeira instância – a média sobe para 7 em cada mil – e menores para desembargadores, quando o índice cai para 2 por mil. Disponível aquiÚltimo acesso em 17/3/19.

10 Disponível aquiÚltimo acesso em 17/3/19.

11 Disponível aquiÚltimo acesso em 16/4/19.

12 Disponível aqui. Último acesso em 16/4/19.

13 Disponível aqui e aqui. Útimo acesso em 2/7/19.

 _________________

*Alessandra de Araújo Bilac Moreira Pinto é juíza de Direito do TJRJ. Integrante do Conselho Deliberativo da AMAERJ.

*Anderson de Paiva Gabriel é juiz de Direito do TJRJ. Doutorando e Mestre em Direito Processual pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

*Felipe Carvalho Gonçalves da Silva é juiz de Direito do TJRJ. 2º Secretário da AMAERJ. Juiz de Direito do TJRJ. Doutorando e Mestre em Direito Processual pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Ex-defensor público do Estado do Rio de Janeiro. 

*Renata Gil de Alcântara Videira é juíza de Direito do TJRJ. Presidente da AMAERJ.

*Simone de Faria Ferraz é juíza de Direito do TJRJ. Diretora de Aperfeiçoamento Institucional da AMAERJ.

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