Nas últimas décadas o instituto da arbitragem tornou-se um método de resolução de conflitos bastante popular no Brasil. E os números provam isso. Segundo relatório divulgado pela Câmara de Comércio Brasil-Canadá o número de arbitragens cresceu exponencialmente de 2010 a 2018 e os valores envolvidos em disputas indicam que esse aumento não se deve apenas ao alto número de procedimentos arbitrais, mas também ao nível de sofisticação e complexidade dos casos.
Outro sintoma da popularização do instituto como meio de solução de conflitos é o fato de que o país hoje está entre aqueles que possuem o maior número de partes envolvidas em procedimentos arbitrais perante à Câmara de Comércio Internacional (CCI), atrás apenas dos EUA, Ilhas Virgens Americanas, Belize e França.
Uma das razões atribuídas a esse aumento deve-se ao fato de que, além de termos uma lei de arbitragem bem elaborada e um judiciário favorável ao instituto, os procedimentos são mais céleres e menos custosos.
De fato, se formos comparar com a justiça estatal brasileira, onde são várias as camadas de apelação até que se obtenha uma decisão final, é verdade que a arbitragem constitui sim uma alternativa mais vantajosa em termos de tempo de duração do processo.
Entretanto, em casos complexos, embora sempre mais célere que o processo em juízo, os custos envolvidos podem tornar a arbitragem proibitiva a pessoas ou empresas.
E é justamente nesse contexto que se insere o fundo de investimentos em litígios, Harbour Litigation Funding. Essa modalidade de financiamento veio para atender uma necessidade da sociedade, particularmente, daqueles que sofrem limitações de ordem econômica e que, por conseguinte, não têm condições ou não podem arcar com os eventuais problemas decorrentes de aumentos de custos e de tempo.
Essa situação pode ocorrer quando a parte adversa é uma grande corporação ou empresa pública sem nenhum estresse financeiro para pagar as despesas relativas ao procedimento arbitral, enquanto o requerente tem pouca ou nenhuma reserva financeira.
Pode também ocorrer em relação a fundos institucionais que embora tenham recursos não possuem a autorização de seus fundistas para alocar recursos em disputas jurídicas, ou mesmos pela opção das empresas que preferem não lançar mão de seu caixa com disputas oriundas de seus contratos.
E essa é apenas uma das vantagens considerada pelas partes. Ao remover eventuais restrições financeiras, o terceiro investidor provoca uma mudança significativa no campo de batalha equilibrando em termos financeiros a disputa e criando condições equitativas para as partes litigarem.
Também os escritórios de advocacia e os departamentos jurídicos das empresas e corporações passaram a considerar o financiamento de litígios uma alternativa apropriada para seus negócios, capaz de oferecer proteção contra os riscos inerentes aos procedimentos litigiosos.
Independentemente dos fundamentos e méritos envolvidos em qualquer causa, os riscos e problemas são diversos e sempre haverá o imponderável da garantia de vitória e satisfação do direito pretendido.
Essa tendência de mercado é basicamente uma mudança de mentalidade. Muitos passaram a ver nesse instrumento uma forma de promover uma demanda sem, no entanto, impactar o fluxo financeiro ou alterar de forma negativa seu balanço.
O pensamento predominante não é o de ceder uma parcela dos eventuais ganhos da causa para um terceiro que nem é parte no processo, mas sim transferir a ele os riscos sobre a causa e o tempo envolvido na demanda e em contrapartida pagar um prêmio pelo risco transferido.
Indiscutivelmente o financiamento de litígios por terceiros é uma tendência mundial que veio para atender a uma necessidade da sociedade. Em alguns mercados como EUA, Inglaterra e Austrália este já é um setor da economia bastante significativo.
No Brasil, ainda é uma indústria nascente, mas que aos poucos vem se tornando cada vez mais presente em particular no mundo das arbitragens. Hoje todas as câmaras contam com a previsão da participação de uma terceira parte financiadora o que deixou de ser uma novidade para os grandes escritórios de advocacia.
Isso significa uma mudança de mentalidade e a compreensão pelo cliente de que ao optar por um financiamento de uma arbitragem através de um fundo de investimentos, está terceirizando riscos que incluem desde um aumento não previsto de custos no procedimento como até de um resultado inesperado.
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*Renata Santana é sócia da CS Consulting, parceira local do Harbour Litigation Funding.