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Gestão centralizada de aposentadorias e pensões do RPPS

Considerações gerais sobre o decreto 9.498/18.

20/5/2019

O decreto 9.498, editado em 10 de setembro de 2018, “dispõe sobre a competência para a concessão e a manutenção de aposentadorias e de pensões do regime próprio de previdência social [RPPS] dos órgãos da administração pública federal direta”.

Nos termos da nova sistemática instituída pelo decreto 9.498/18, “a concessão e a manutenção de aposentadorias e de pensões do regime próprio de previdência social dos órgãos da administração pública federal direta [...] será centralizada no Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão” (art. 1º), por intermédio de “transição gradual das atividades”, iniciada já em 2018 e programada para “ser completada até 1º de fevereiro de 2022” (art. 2º).

Como sabido, desde a medida provisória 870, de 1º de janeiro de 2019, as competências do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão passaram a integrar o escopo de atuação administrativa do denominado Ministério da Economia.

A gestão centralizada dos benefícios está programada para ocorrer, progressivamente, até 1º de fevereiro de 2022 (art. 2º, parágrafo único, do decreto 9.498/18), iniciando-se quanto aos benefícios de servidores vinculados aos órgãos arrolados no art. 3º (Imprensa Nacional, Ministério das Relações Exteriores, entre outros). 

Acontece que, em relação ao Quadro de Pessoal de alguns órgãos da Administração Pública federal, há particularidades (por exemplo, a existência de servidores oriundos de órgãos extintos, cargos de instituição oriundos de provimento derivado etc.) que demandam uma gestão específica dos benefícios. Ou seja, eventualmente a centralização operacional prevista pelo decreto 9.498/18 poderá prejudicar servidores inativos e pensionistas. 

Afinal, com o novo ato normativo, todas as operações, requerimentos administrativos de servidores inativos e pensionistas para a correção de problemas em folha de pagamento, entre outras movimentações relativas à concessão e à manutenção de aposentadorias e de pensões do RPPS, no âmbito dos órgãos integrantes do Sistema de Pessoal Civil (SIPEC), serão processadas e realizadas pelo Ministério da Economia.

O decreto 9.498/18 foi editado por força da autorização constitucional conferida pelo art. 84, VI, “a”, da Constituição Federal: “compete privativamente ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos”.

Trata-se de decreto geral (normativo), que, no exercício da competência privativa do Presidente da República, é considerado ato independente ou autônomo. Nos termos da doutrina administrativista, trata-se de exercício de competência que, sob expressa autorização constitucional (art. 84, VI, “a”), permite o arranjo organizacional da Administração Pública, a critério discricionário do Chefe do Poder Executivo, estando apenas limitado quanto à vedação de criação ou extinção de órgãos ou ao aumento de despesas (cf. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 354-5).

Ainda não é possível estabelecer a eficiência do novo modelo, que ainda depende de implementação prática para inúmeros órgãos da Administração Pública federal.

No entanto, se houver prejuízos concretos às folhas de pagamento, aos servidores etc., as implicações decorrentes do decreto 9.498/18 consubstanciarão resultados inefetivos ou negativos, o que não se coaduna com a moderna acepção do princípio da eficiência administrativa. Afinal, “a eficiência como atingimento de resultados não é satisfeita com quaisquer resultados. Requer eleição de prioridades e zelo para que os objetivos, metas ou resultados prioritários, uma vez eleitos, sejam atendidos razoavelmente pela administração pública. Requer o atingimento de resultados não apenas prioritários, como lícitos, legítimos e de qualidade” (SOUZA, Rodrigo Pagani de. Em busca de uma administração pública de resultados. In Controle da Administração Pública. Coords. Marco Augusto Perez e Rodrigo Pagani de Souza, p. 39-61. Belo Horizonte: Fórum, 2017, op. cit., p. 45-6). 

Se o modelo de centralização instituído pelo decreto 9.498/18 pode, em tese, implicar prejuízos, é necessário que esses prejuízos sejam identificados em termos práticos e reais para que, contra essas situações lesivas, sejam direcionadas medidas judiciais ou extrajudiciais específicas, voltadas a reparar danos iminentes ou consumados.

À luz do imperativo de eficiência administrativa (art. 37, caput, da Constituição Federal), a depender de circunstâncias eventuais, correspondentes a prejuízos concretos, poderão ser identificadas situações que permitam, futuramente, o questionamento judicial da centralização operacional estabelecida pelo decreto 9.498/18, em relação às folhas de pagamento e ao processo de concessão e de manutenção de benefícios previdenciários de servidores que sejam negativamente afetados pelo novo modelo de gestão. 

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*João Pereira Monteiro Neto é mestre (USP) e especialista (IDP) em direito processual, membro do escritório Torreão Braz Advogados.

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