Como amplamente divulgado, em meados de 2017 o STF concluiu o julgamento RE 574.706, oportunidade em que foi fixada a tese de que "o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins". Referido julgamento representou uma das maiores vitórias dos contribuintes nos últimos tempos, sendo devida e justamente comemorada.
Tal resultado, porém, não pôde ser celebrado por todos os contribuintes. Isso porque, no passado, diversas empresas que ingressaram com essas ações tiveram seus pedidos julgados improcedentes pelo Poder Judiciário com base nas súmulas 68 e 94, do STJ1. Vale lembrar que, por décadas, essas súmulas do STJ suportaram o entendimento fiscal e jurisprudencial de que o ICMS deveria compor a base do PIS e da Cofins, de forma que diversas ações judiciais transitaram em julgado de modo desfavorável aos contribuintes.
Com o recente julgamento do STF, pois, alguns contribuintes passaram a lidar com uma realidade indesejável. Além de eventualmente terem que continuar recolhendo o PIS e a Cofins com o ICMS em sua base de cálculo – uma vez que as decisões transitadas em julgado são desfavoráveis aos seus interesses – e não terem direito à restituição dos valores pagos indevidamente no passado, passaram a ter uma significativa desvantagem competitiva frente a outras empresas de seu setor que, contrariamente e amparadas pelo julgamento do STF, reduzirão sua carga tributária e poderão recuperar os valores indevidamente recolhidos.
Para esses contribuintes, que têm decisões transitadas em julgado desfavoráveis proferidas após a vigência do novo Código de Processo Civil (CPC/15), vigente desde 2015, há alternativas para mitigar os seus efeitos.
O CPC/15 optou por privilegiar as teses fixadas pelos Tribunais Superiores (especialmente o STF) frente às decisões proferidas nos casos particulares. Nesse sentido, o artigo 525, §12, do CPC/15, prevê que o título executivo judicial é inexequível quando fundado em lei, ato normativo ou interpretação considerados inconstitucionais pelo STF2. Essa regra, porém, somente é aplicável quando a decisão de determinado caso particular for proferida após a fixação de determinado entendimento pelo STF.
Por sua vez, para os casos em que a decisão particular for anterior ao entendimento firmado pelo STF, porém durante a vigência do CPC/153, o Código definiu que, no prazo de até dois anos do trânsito em julgado da decisão do STF, o interessado poderá ingressar com uma Ação Rescisória. Nesse hipótese, embora o CPC/15 estivesse buscando proteger aqueles que tivessem em seus casos decisões conflitantes com o entendimento do STF (sejam anteriores ou posteriores à decisão do STF), alguns contribuintes passaram a se encontrar numa espécie de limbo processual.
Isso porque, ao mesmo tempo em que o entendimento do STF no RE 574.706 já é conhecido e aplicável, o que justificaria o ajuizamento de uma Ação Rescisória, ainda não é possível neste momento determinar quando ocorrerá o trânsito em julgado da decisão do Tribunal (marco inicial do prazo da ação rescisória com base no artigo 525, §15, do CPC/15), notadamente em face dos Embargos de Declaração opostos pela União e ainda pendentes de julgamento. Ou seja, em tese, o prazo para ajuizamento da ação rescisória sequer foi iniciado.
Ainda assim, deve-se ter em conta que o artigo 525, §15, do CPC/15 não pode ser lido apenas em sua literalidade. No caso do ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins, a decisão proferida pelo STF foi definitiva no mérito e os Embargos de Declaração opostos pela Fazenda não possuem efeito suspensivo. Ou seja, a posição do Supremo quanto ao assunto é, para todos os efeitos, definitiva. Nessas circunstâncias, poderia a apresentação de sucessivos recursos obstar o exercício de um direito processual do contribuinte?
De qualquer forma, para os contribuintes nessa inusitada situação, existem argumentos consistentes para defender a impossibilidade de execução das decisões que lhes sejam desfavoráveis. Uma saída tem sido pleitear uma tutela de urgência pautada nos argumentos de que o entendimento do STF é aplicável desde já e que são evidentes os danos que poderão ser causados se contribuinte vencido no seu processo particular for obrigado a adotar entendimento contrário à decisão adotada pelo STF que, além de favorável, possui efeito erga omnes. Aliás, já existem decisões nesse sentido4.
Assim, dependendo da situação em que se encontra o contribuinte com decisão particular contrária aos seus interesses, e cujo resultado esteja na contramão do posicionamento firmado pelo STF, podem ser exploradas alternativas com base nas diretrizes do novo CPC/15 para mitigar os efeitos dessa decisão. Apenas caberá à parte analisar, caso a caso, qual o melhor caminho a ser seguido para fazer valer o seu direito.
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1 Súmula 68 do STJ: “A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do PIS”; Súmula 94 do STJ: “A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do Finsocial”.
2 Art. 525 (..) § 1o Na impugnação, o executado poderá alegar: (...)
III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; (...)
§ 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1o deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
§ 13. No caso do § 12, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal poderão ser modulados no tempo, em atenção à segurança jurídica.
§ 14. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 12 deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda.
§ 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
3 Artigo 1.057 do CPC/15.
4 Agravo de Instrumento 5003994-969.2018.4.03.000
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*Diego Caldas R. de Simone é sócio de Pinheiro Neto Advogados.
*Fábio Tarandach é associado de Pinheiro Neto Advogados.
*Paula Zugaib Destruti é associada de Pinheiro Neto Advogados.
*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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