Quando se fala em direito processual, logo ganha destaque o ambiente de um tribunal, onde se encontram os juízes, e alguém vai decidir acerca do conflito surgido entre autor e réu. Mas o que há por trás disso? Ou melhor, o que está inserido entre o surgimento do conflito de interesse e uma resposta (satisfatória ou não) do Poder Judiciário?
Nesse momento, há de se observar a base estrutural que possibilitará colher os frutos (positivos ou negativos) daquilo que se almeja. Para tanto, é necessária uma atenção especial acerca da eficiência processual e da efetividade, pois são essenciais para que os efeitos almejados possam surgir e satisfazer as partes envolvidas na relação jurídica processual.
Fala-se em eficiência, em efetividade, mas o que seriam esses princípios? E como se dá a participação deles para definir os resultados das pretensões no ambiente processual? Além deles, é imperioso definir o que vem a ser a eficácia, que é um instituto que muitas vezes traz confusão: o que é eficácia? O que é eficiência? O que é efetividade? Não temos o intuito de esgotar, mas de deixar claro o que são esses institutos, a eficácia, mesmo que de modo mais sutil, e os dois princípios, com suas particularidades.
Os conceitos de efetividade, eficiência e eficácia ganham muito destaque quando se trata da administração pública, mas também ganham destaque e merecem importância na área do direito, em especial afeição ao direito processual.
Etimologicamente, os dicionários da língua Portuguesa trazem os conceitos de eficácia e efetividade como sinônimos. No direito processual, são conceitos que muito se aproximam, mas que merecem ser abordados no âmbito de suas especificidades.
Há dois sentidos nos quais se podem compreender a eficácia. O primeiro, “como fenômeno puramente normativo, é a aptidão da norma jurídica para gerar efeitos no mundo jurídico” (PEITER, s.d., p. 4). Deste modo, tem-se o conceito de eficácia jurídica que, em conformidade com o pensamento de Pontes de Miranda (apud PEITER, s.d., p. 4), “é a que se produz no mundo do direito como decorrência dos fatos jurídicos e não a mudança que atua nas relações jurídicas”.
Há, contudo, um segundo sentido, de eficácia social da norma, trazida por Teori Albino Zavascki (apud PEITER, s.d., p. 4), para quem:
O que designa a aptidão da norma jurídica para produzir efeitos na realidade social, ou seja, para produzir, concretamente, condutas sociais compatíveis com as determinações ou valores consagrados no preceito normativo. (...) é o fenômeno que se passa, não no plano puramente formal, mas no mundo dos fatos e por isso mesmo é denominado eficácia social ou efetividade. (itálico do autor).
Ademais, Michel Temer (apud LENZA, 2013, p. 233) aborda e deixa mais claro os termos da eficácia social e da eficácia jurídica da norma no seguinte sentido:
[...] eficácia social se verifica na hipótese de a norma vigente, isto é, com potencialidade para regular determinadas relações, ser efetivamente aplicada a casos concretos. Eficácia jurídica, por sua vez, significa que a norma está apta a produzir efeitos na ocorrência de relações concretas; mas já produz efeitos jurídicos na medida em que a sua simples edição resulta na revogação de todas as normas anteriores que com ela conflitam. (itálico do autor).
Assim, há uma eficácia que guarda relação com a norma jurídica e sua aptidão para produzir efeitos, inclusive no tocante à eficácia e sua relação com os planos de existência e validade de um negócio jurídico, e há a eficácia social, que é a mais trabalhada no direito processual, que busca, de fato, efetivar o direito.
Como bem preleciona Luiz Guilherme Marinoni (apud LIMA, 2018), “não há como negar, hoje, a eficácia normativa ou a normatividade dos princípios”. Desta premissa se pode dizer que não há pura e simplesmente a regra, mas também os princípios (e as normas fundamentais), que reúnem a qualidade de normas jurídicas. E essa eficácia normativa é a garantidora para que os dois princípios (eficiência e efetividade) sejam respeitados e aplicados muito mais do que como meros valores.
Ser eficaz, assim, de modo bem singelo, significa surtir os efeitos que se pretendem no caso concreto, quando da propositura da demanda, ou seja, há objetivos que necessitam ser alcançados. A eficácia não está preocupada em como fazer, com o caminho, mas sim, está preocupada com o fazer propriamente dito, isto é, a chegar ao objetivo almejado. E essas observações trazem o ponto de partida para que ela se diferencie da eficiência, e não seja totalmente idêntica (embora muito próxima e semelhante) à efetividade.
Isso porque, quando se trata da efetividade, ela é a real concretização daquilo que se pretende (não se preocupando meramente com o fazer, mas com o realizar), ou seja, busca o resultado satisfatório e está intimamente relacionada à atividade executiva; já a eficiência está relacionada ao modo de fazer, como fazer, de modo correto e com o menor dispêndio possível.
Uma vez exauridas as observações acerca da eficácia, cumpre explanar acerca da eficiência e da efetividade.
Primeiramente, vamos à abordagem da eficiência, princípio que já era bastante estudado em direito administrativo, previsto no artigo 37 da Constituição Federal (como princípio que rege a Administração Pública, ao lado da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade), e que agora ganhou presença, de forma explícita, ao fim do artigo 8º do código de processo civil de 2015.
A eficiência guarda relação com a otimização da gestão técnica para o desenvolvimento do processo. Nessa dimensão, inclusive, de gestão sobre determinado processo, é que será abordado o tema (e não sob o viés de norma do direito administrativo). Conforme lições de Fredie Didier Jr. (2017, p. 113), “O processo, para ser devido, há de ser eficiente. O princípio da eficiência, aplicado ao processo, é um dos corolários da cláusula geral do devido processo legal”.
Há necessidade de uma gestão organizada que permita a otimização da esfera processual, onde o trâmite seja desenvolvido de modo linear e uniforme, com o cumprimento dos prazos processuais e com a prática dos atos ao tempo correto, garantindo, assim, uma duração razoável do processo, bem como a economia processual. Em suma, o princípio da eficiência busca alcançar a maior satisfação possível, com o mínimo de gastos (fazendo, assim, uma releitura moderna da economia processual).
José Miguel Garcia Medina (2017, p. 114) corrobora com esse pensamento, ao dizer que o juiz deve “se organizar e realizar os atos de modo a alcançar o melhor resultado possível com os meios disponíveis”, a fim de que “algo seja realizado de modo a propiciar um grau máximo de satisfação”.
Ademais, continua o autor (2017, p. 129), quando da abordagem da duração razoável do processo, dizendo que “só pode ser considerada eficiente a tutela jurisdicional se prestada tempestivamente, e não tardiamente”.
Assim, fica clara a ideia da íntima relação entre a eficiência e a duração razoável do processo, o que mostra, também, quão importante é a integração entre os diversos princípios existentes, tanto de ordem constitucional, quanto de ordem legal.
No mesmo sentido, Cassio Scarpinella Bueno (2018, p. 104), para quem, deve-se buscar a “obtenção do maior número de resultados com o menor número de atos processuais”. Nesse ponto, ele destaca a eficiência processual (que trabalharia aliada intimamente à duração razoável do processo, prevista no art. 4º do CPC/15).
Mas não se pode contentar com a mera rapidez da prestação da tutela jurisdicional, não basta dizer que houve economia processual ou celeridade, daí porque, destacou-se a duração razoável do processo (o processo precisa durar o tempo suficiente para que preste ao jurisdicionado um resultado satisfativo, onde tenham-se assegurados todas as garantias fundamentais).
Em relação ao tema, Humberto Theodoro Júnior (2015, p. 93) afirma, com acerto, que “[...] Há metas maiores e que não admitem sacrifício em nome de uma eficiência traduzida em rapidez”.
E ele reforça a necessidade da eficiência imperativa de respeito às partes, que devem receber uma resposta de qualidade, quando da prestação da tutela jurisdicional. E ele traz ótimo fundamento de Leonardo Carneiro da Cunha (apud THEODORO JÚNIOR, 2015, p. 93), que diz:
[...] em razão do princípio da eficiência, o procedimento e a atividade jurisdicional hão de ser estruturados para que se construam regras adequadas à solução do caso com efetividade, duração razoável, garantindo-se a isonomia, a segurança, com contraditório e ampla defesa.
Somente com uma decisão justa e de qualidade, é que a eficiência terá alcançado sua plenitude. É necessário, sim, a busca pela duração razoável (não apenas a “celeridade”), é necessário uma economia processual, mas não se pode levar em consideração apenas o “menor dispêndio possível” quando, para a qualidade da prestação jurisdicional, seja necessário um dispêndio de tempo, pois “Entre a rapidez da decisão e a qualidade da solução apresentada, o juiz deve primar pela segunda, de modo que nunca sela ela sacrificada em prol apenas da dinamicidade do processo” (THEODORO JÚNIOR, 2015, p. 93).
Pode-se dizer, deste modo, que “Eficiente é a atuação que promove os fins do processo de modo satisfatório em termos quantitativos, qualitativos e probabilísticos” (DIDIER JR., 2017, p. 116) e, deste modo, continua o autor (2017, p. 117), “Eficiente é o processo que atingiu esse resultado de modo satisfatório”.
Com isso, a eficiência deve primar pela qualidade, para se chegar ao resultado de maneira satisfatória, agradando às partes, que terão preservadas suas garantias fundamentais, como contraditório, ampla defesa, dignidade da pessoa humana, entre tantas outras.
E, para finalizar, cumpre abordar acerca da efetividade. Nas palavras de Fredie Didier Jr. (2017, p. 117), “Efetivo é o processo que realiza o direito afirmado e reconhecido judicialmente”, e complementa (2017, p. 128), “os direitos devem ser, além de reconhecidos, efetivados”. Processo devido é processo efetivo.
A efetividade visa garantir o resultado prático daquilo que se busca, pois de nada adiantaria ter-se o resultado mais satisfatório, com uma total procedência dos pedidos formulados na ação, se não fosse possível concretizar o que foi proferido em sentença. Daí, a efetividade guarda muita relação com a execução, em razão da busca pela satisfação.
O artigo 4º do código de processo civil dispõe: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.
Deste modo, não obstante a importância da fase cognitiva do processo, onde a atividade intelectual é desenvolvida em sua plenitude, muitas das vezes, ela por si só não se basta, sendo necessária a fase executiva para a garantia da materialização do que se pretende.
No mesmo sentido, para Cassio Scarpinella Bueno (2018, p. 61), a noção nuclear da efetividade “repousa em verificar que, uma vez obtido o reconhecimento do direito indicado como ameaçado ou lesionado, seus resultados devem ser efetivos, isto é, concretos, palpáveis, sensíveis no plano exterior do processo”. Para ele, a efetividade é do direito, e não do processo propriamente dito.
Com isso, pode-se visualizar a efetividade como uma busca pelo resultado, uma busca pela satisfação e concretização de um direito reconhecido, cujo possuidor faz jus de ter essa situação devidamente materializada.
Dentro dessa ideia abordada até o presente, cumpre-se uma última pergunta: o que é processo justo? Humberto Theodoro Júnior (2015, p. 85) responde com propriedade:
A noção de processo justo está intimamente ligada à efetividade da prestação jurisdicional, de modo a garantir a todos o acesso à justiça, em tempo que não extrapole os limites do razoável. Com isso, entende-se a necessidade de a justiça efetiva aparelhar-se para propiciar ao titular do direito um provimento que seja contemporâneo à lesão ou ameaça à lesão, consistindo em solução justa para o litígio.
O processo efetivo é aquele que trará uma justiça plena à decisão: haverá processo de conhecimento (assegurados todos os direitos e garantias fundamentais, tanto constitucionais quanto processuais) e, após, concretizar-se-á tudo aquilo que foi obtido quando do resultado da atividade intelectiva do juiz, ao proferir a sentença.
Com a efetividade, o processo haverá obtido seu ápice, tendo passado por todas as etapas e preservadas todas as garantias, com a concessão, ao fim, do resultado satisfatório obtido por quem pleiteava seu direito.
Pode-se concluir, assim, que a efetividade é a busca, é o sonho de consumo quando se trata do ambiente processual, e a eficiência, trabalhando em conjunto com aquela, pode auxiliar para que tal resultado se dê com a garantia da otimização para se chegar ao resultado.
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*Aldo Aranha de Castro é professor efetivo de direito processual civil da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, campus de Três Lagoas/MS.