Não há como pensar em pontualidade sem fazer uma conexão com os britânicos. E essa história tem uma origem. Há cerca de dois séculos, na Grã-Bretanha, cada rua – e até cada bairro – tinha a sua hora. Quando o sol marcava o meio-dia, os relógios eram acertados. Foi em 1830 que aquele país se tornou o primeiro a adotar um horário nacional e acredito que também aí se iniciava o hábito da pontualidade britânica.
Hoje, os demais países acertam seus relógios com base em um relógio que está no observatório real de Greenwich, ao sul de Londres. E essa marcação garante que o mundo jamais perca a hora, ou pelo menos deveria. As convenções sociais permitem a chamada tolerância e, diferente dos britânicos, muitas culturas se valem da tolerância e provocam atrasos que considero nefastos.
Alguns, tão nefastos, que nos permitem dizer que o Brasil segue atrasado no quesito justiça social. Uma prova inconteste é o aumento do número dos litígios que se acumulam no Judiciário brasileiro e, especialmente agora, diante do crescente desemprego, na Justiça do Trabalho.
Em minha percepção, existem lacunas a serem sanadas para o melhor convívio entre advogados, juízes e as partes. Sou bacharel em direito, entretanto, independente da formação, outros partilham comigo esta mesma percepção. A audiência trabalhista tem por princípio a rapidez e, por conta disso, alguns juízes fazem o agendamento delas de dez em dez minutos. E a prática colabora para a quantidade de atrasos devido às circunstancias de cada processo.
Com o intuito de contribuir para a celeridade na tramitação processual e coibir abusos e longos períodos de espera na realização das audiências, propus a complementação às disposições da CLT, que vigora há quase 80 anos, no tocante ao necessário cuidado com a celeridade e pontualidade das audiências trabalhistas.
Atualmente, o art. 815 da CLT contempla unicamente a possibilidade de que o atraso do Juiz, por mais de quinze minutos, permita às partes que se retirem e consignem o fato no livro de registro das audiências. Mas não há previsão quanto ao atraso injustificado para o início da audiência, com o Juiz presente. Esse atraso, se muito prolongado, pode representar grande embaraço às partes e advogados, muitas vezes premidos por outros compromissos.
Assim, por meio do projeto de lei 1539, de 2019, proponho a adição de novos parágrafos ao art. 815, para estabelecer que, decorridos, injustificadamente, trinta minutos desde a hora marcada para o início da audiência, as partes e advogados possam se retirar e a audiência deverá ser remarcada, sem previsão de penalidade.
Parece-me racional o prazo de trinta minutos já previsto no art. 362 do CPC, atualizado em 2015, e que se aplica subsidiariamente onde não existe norma. Ocorre que a determinação do CPC, por vezes, não é aplicada sob a justificativa do conflito aparente de normas. Proponho pôr um fim a esta celeuma e apor tal previsão na própria CLT.
A aprovação desse projeto servirá como estímulo a uma maior organização das pautas das audiências trabalhistas e elevará o sentimento de igualdade entre as partes, advogados e juízes. É preciso que o rigor da pontualidade seja para todos, com o objetivo de evitar que os atrasos não sejam incorporados nas rotinas de profissionais e cidadãos em busca de seus direitos, já tão negligenciados.
Sabedor do caráter alimentar das principais verbas requeridas na Justiça do Trabalho, tomei o cuidado para que esta ideia legislativa se ponha como uma faculdade às partes e aos seus advogados, não uma obrigação. Por isso o cuidado de que, em sendo remarcada a audiência em atraso, a devida remarcação seja para a primeira data disponível, sem prejuízo de eventuais aplicações da litigância de má-fé, em caso de comprovado abuso ou mau uso do comando legal.
Com a padronização, no século XIX, da contagem do tempo em relação ao espaço, foi possível sincronizar os eventos realizados em diferentes pontos de todo o globo terrestre. Num mundo ideal, não seria necessário legislar para sincronizar as partes de uma audiência na Justiça do Trabalho. Porém, como estamos fora de sincronia, a opção é lançar mão do senso de Demiurgo do pensamento platônico, onde se deve dar forma a uma matéria desorganizada imitando as essências eternas. Amiúde, recorrer a alterações legislativas dessa natureza é uma das possibilidades na busca de maior equanimidade.
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*Styvenson Valentim é político, bacharel em Direito e capitão da reserva da Polícia Militar do Rio Grande do Norte. Eleito senador da República pelo RN, em 2018, para o mandato de 2019 - 2027.