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A lei do cadastro positivo e a lei geral de proteção de dados: conflito ou sinergia?

A lei 12.414/11 criou o “cadastro positivo”, bancos de dados nos quais são incluídas informações sobre o comportamento financeiro do consumidor para formação de histórico de crédito. Já a LGPD dispõe sobre a proteção dos dados pessoais e regula o tratamento e transferência destes dados, visando proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade dos titulares dos dados.

25/3/2019

O projeto de lei  complementar 54/19 (“projeto de lei”), que altera a lei 12.414/11 (“Lei do Cadastro Positivo”), foi aprovado no dia 13/3 pelo Plenário do Senado e segue para a sanção presidencial.

A lei 12.414/11 criou o “cadastro positivo”, bancos de dados nos quais são incluídas informações sobre o comportamento financeiro do consumidor para formação de histórico de crédito, tais como informações sobre quitação de contas, pontualidade dos pagamentos e outras condutas que caracterizem o consumidor como “bom pagador”. Os consumidores classificados como “bons pagadores” recebem maior pontuação e melhora as chances de aprovação de crédito.

No texto original, a abertura do cadastro estava condicionada à autorização prévia do cadastrado (modelo opt-in). Dentre outras alterações trazidas pelo projeto de lei, a mais polêmica sem sombra de dúvidas é a inclusão automática dos consumidores aos cadastros positivos (modelo opt –out).

A polêmica do modelo opt - out gira em torno da quebra de privacidade dos consumidores, inflamada pelo cenário mundial voltado para a proteção de dados pessoais, com a entrada em vigor do GDPR e da aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados (lei 13.709/18) (“LGPD”).

A LGPD, que foi sancionada em 14/8/18, atualmente em vacatio legis, com entrada em vigor em 24 meses a contar de sua publicação, dispõe sobre a proteção dos dados pessoais e regula o tratamento e transferência destes dados, visando proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade dos titulares dos dados.

Não obstante a necessidade de consentimento prévio e expresso pelos titulares para a autorização do tratamento dos dados ter ganhado relevância desde a aprovação da LGPD, é importante desmistificar a matéria e entender que o consentimento é apenas uma das dez hipóteses de autorização para o tratamento dos dados pessoais. O artigo 7º da LGPD elenca as hipóteses em que o tratamento de dados poderá ser realizado e o inciso X estabelece como uma dessas hipóteses o tratamento para a proteção do crédito.

Sendo assim, a inclusão dos dados pessoais dos consumidores nos cadastros positivos poderá ser efetivada independentemente do consentimento expresso do titular. No entanto, os consumidores, na qualidade de titulares dos dados, possuem os direitos de informação, privacidade e livre acesso garantidos por ambos os dispositivos legais.

Em linha com a LGPD, que assegura aos titulares dos dados pessoais o direito de amplo acesso aos dados, retificação dos dados incorretos e exclusão de seus dados dos bancos de dados, o artigo 5º do projeto de lei estabelece como direito dos cadastrados a correção de seus dados, o cancelamento do cadastro e o acesso às informações prestadas no cadastro, assim como aos critérios considerados para a análise de risco.

Também de acordo com os princípios da finalidade, adequação, necessidade e transparência elencados na LGPD, o projeto de lei garante aos cadastrados a informação prévia sobre a identidade do gestor, sobre o armazenamento e sobre o objetivo do tratamento dos dados pessoais, que deve estar em consonância ao cumprimento da finalidade para qual foram coletados.

Verifica-se que tanto o inciso VII do artigo 5º da lei 12.414/11 (não alterado pelo projeto de lei) como o artigo 20 da LGPD outorgam ao titular o direito de solicitar a revisão de decisões tomadas unicamente com base em tratamento automatizado que afetem seus interesses, incluídas as decisões destinadas a definir o seu perfil de crédito.

Cumpre notar que, muito embora à primeira vista a LGPD e o projeto de lei pareçam divergentes entre si, superada a questão da ausência da necessidade do consentimento prévio do consumidor, autorizada pela LGPD, o projeto de lei traz dispositivos expressos que garantem os direitos de informação e privacidade dos consumidores em relação aos seus dados pessoais, assim como garantem a liberdade de manutenção ou não destes dados no cadastro positivo. De toda forma, o gestor e a fonte do cadastro positivo deverão se adequar à LGPD e adotar as medidas técnicas e jurídicas necessárias para cumprimento da referida lei, especialmente no que tange a segurança dos dados coletados.

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*Nicole Katarivas é sócia da área de direito societário e M&A do escritório Lacaz Martins, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados.

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