Migalhas de Peso

O Brasil vai mal na copa da burocracia

Periodicamente, 190 países procuram um lugar melhor no ranking do estudo do Banco Mundial chamado de Doing Business, voltado a monitorar a situação a respeito de 11 indicadores relacionados à facilidade de fazer negócios e à qualidade do ambiente de regulação.

20/3/2019

A Copa do Mundo da FIFA, apesar de todos os pesares, continua sendo um acontecimento de importância para grande parcela dos brasileiros. De quatro em quatro anos, o evento hipnotiza muitos concidadãos.

A copa da burocracia, por sua vez, é disputada todo ano, mas os resultados do Brasil são bem parecidos com as últimas edições da sua congênere do esporte. Diferentes, apenas, são as vitórias passadas no futebol, muito longe do desalento da nossa luta contra as exigências estatais não razoáveis.

Periodicamente, 190 países procuram um lugar melhor no ranking do estudo do Banco Mundial chamado de Doing Business, voltado a monitorar a situação a respeito de 11 indicadores relacionados à facilidade de fazer negócios e à qualidade do ambiente de regulação.

O monitoramento é efetuado com base em questionários respondidos por empresas de assessoria jurídica, contábil e de outros serviços, dando origem a um ranking do ambiente de negócios. O estudo considera a situação de fato, não o que diz a legislação. Analisa as exigências que devem ser satisfeitas por empresas pequenas e médias no seu dia-a-dia. Burocracia pura.

No Brasil a medição é efetuada em duas cidades de grande porte: São Paulo e Rio de Janeiro. Como parte das exigências dizem respeito às legislações municipais, a posição brasileira no estudo fica sujeita à situação nessas localidades, não refletindo a média das demais capitais ou dos mais de 5 mil municípios brasileiros. Nossa seleção pode não ser a melhor, mas ninguém pode assegurar que a mudança de jogadores seja garantia de resultados mais positivos.

No final de 2018, o governo comemorou após anos de anomia a melhoria da posição do Brasil, mas o resultado é muito acanhado. Continuamos perdendo feio. O 7 a 1 para a Alemanha na copa da burocracia seria quase um presente.

O Brasil passou da 125ª para a 109ª posição, o que representa a maior melhora de um ano para outro na América Latina e o 12º maior avanço entre todos os países pesquisados, mas como a base de largada é ruim, continuamos quase na rabeira da classificação, mesmo entre os países da América Latina e Caribe.

México, o melhor da região, está na 54ª posição, Porto Rico está na 64ª, Colômbia na 65ª e Costa Rica na 67ª. Nosso único consolo é que estamos à frente da Argentina (119ª no ranking).

O Brasil segue entre os dez piores no ranking da facilidade para pagar tributos e no registro de propriedades. Nem é bom falar da situação de obtenção de alvarás de construção.

Um dos pontos de avanço foi a facilitação da abertura de empresas. Um novo sistema on-line, de registro de empresas e licenciamento, teria sido responsável por reduzir o tempo médio para 20 dias, diante do prazo anterior de 82 dias. Novo em São Paulo, pois o sistema já existe há vários anos em outras capitais. O atraso é culpa única dos burocratas, dos “donos” do processo.

A sua limitação a uma seleção de apenas duas cidades, a desconsideração sobre características nacionais, como a predominância pequenos negócios do comércio varejista e do setor de serviços com atividades de baixo risco, bem como o questionamento do fisco brasileiro sobre o tempo gasto para pagar tributos a partir de um perfil de empresa pouco representativo do universo, não diminuem a valia do ranking.

É uma disputa que recebe, todo ano, ampla atenção dos meios de comunicação e serve para identificar o péssimo padrão nacional frente a outros países que também devem ter suas particularidades e idiossincrasias. Questionar o tamanho do campo ou as regras do escanteio não é suficiente para explicar o nosso péssimo resultado.

Também, ao contrário do futebol, os cidadãos têm um papel relevante no nosso vergonhoso lugar no ranking da burocracia. São todos responsáveis pela omissão em cobrar soluções contra essa goleada histórica que se repete todo ano, desde 2002, quando começou a ser divulgado o estudo. Aqui não adianta só assistir e torcer. É necessário agir.

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*José Constantino Bastos Jr. é advogado, ex-secretário nacional de racionalização e simplificação.

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