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Sergio Moro põe em xeque a lei de repatriação

A investigação dos recursos repatriados é possível e deve ser comemorada; desde que, no entanto, sejam resguardadas as garantias legais previstas pela lei 13.254/16, sob o risco de desvirtuamento de sua finalidade. Afinal, lei é para ser cumprida, devendo ser mantida a segurança jurídica.

21/1/2019

Repercutiu no meio jurídico e dividiu opiniões entre especialistas do Direito Tributário a intenção declarada pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, de investigar a origem dos quase R$ 175 bilhões alocados por brasileiros no exterior, sem registro na Receita Federal, mas, que, posteriormente, foram regularizados por meio de programas de incentivo fiscal.

O plano de Moro, segundo noticiado pela imprensa, consiste na criação de uma força-tarefa integrada com o Ministério Público e Polícia Federal, a fim de rastrear a origem dos recursos declarados nas duas etapas do chamado Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (Rerct), editados ao longo dos governos Dilma Rousseff e Michel Temer.

Ocorre que, a própria base legal que regulamentou as operações de repatriação nesse período – a lei de repatriação (lei 13.254, de 13 de janeiro de 2016) – prevê garantias específicas ao aderente, restringindo, significativamente, as possibilidades de investigação por parte do Estado.

Nesse sentido, a referida norma legal veda, expressamente, em seu art. 4o, § 12, I, o uso da declaração apresentada pelo contribuinte como fundamento único para instauração de procedimento investigatório.

Aliás, ainda segundo a lei, para aderir ao programa, fica dispensada qualquer análise prévia da origem dos recursos, bastando, apenas, a declaração de titularidade da posse do valor a ser regularizado, assim como de sua licitude. Para tanto, são cobrados do contribuinte impostos e multa.

São os termos do dispositivo legal:

“Art. 4o Para adesão ao RERCT, a pessoa física ou jurídica deverá apresentar à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) e, em cópia para fins de registro, ao Banco Central do Brasil declaração única de regularização específica contendo a descrição pormenorizada dos recursos, bens e direitos de qualquer natureza de que seja titular em 31 de dezembro de 2014 a serem regularizados, com o respectivo valor em real, ou, no caso de inexistência de saldo ou título de propriedade em 31 de dezembro de 2014, a descrição das condutas praticadas pelo declarante que se enquadrem nos crimes previstos no § 1o do art. 5o desta Lei e dos respectivos bens e recursos que possuiu.

§ 12. A declaração de regularização de que trata o caput não poderá ser, por qualquer modo, utilizada:

I - como único indício ou elemento para efeitos de expediente investigatório ou procedimento criminal”.

Ademais, no esforço do legislador de afastar qualquer possibilidade de autoincriminação pelo contribuinte – hipótese largamente vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro –, a admissão ao programa de repatriação implicou na anistia dos crimes de evasão de divisas e de sonegação fiscal. Demais ilícitos, como, por exemplo, corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de drogas e de armas, por óbvio, não estão amparados pelo programa.

Contudo, em que pese a louvável iniciativa de interceptar eventuais lucros advindos da prática desses crimes, a inovação sugerida pelo ex-juiz Moro acabaria por gerar insegurança jurídica, sobretudo, entre aqueles que, de boa-fé, longe de se beneficiar da lei para, eventualmente, lavar o dinheiro de origem criminosa, estavam interessados em apenas acertar as contas com o Fisco.

Nesse sentido, a investigação dos recursos repatriados é possível e deve ser comemorada; desde que, no entanto, sejam resguardadas as garantias legais previstas pela lei 13.254/16, sob o risco de desvirtuamento de sua finalidade. Afinal, lei é para ser cumprida, devendo ser mantida a segurança jurídica.

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*Gustavo Pires Maia da Silva é advogado sócio de Homero Costa Advogados.

*Guilherme Scarpellini Rodrigues é colaborador de Homero Costa Advogados.

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