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À espera de um ano decisivo para o setor brasileiro de telecomunicações

Resta esperar – e torcer – para que 2019 seja melhor para o setor de telecomunicações. O Brasil só tem a ganhar.

28/12/2018

Ao longo de 2018, foram travadas importantes discussões sobre o setor de telecomunicações, como metas para o serviço de telefonia fixa e a atuação da Anatel para modernizar a regulação e ampliar a competição e a qualidade do setor. No entanto, diversas outras questões essenciais não avançaram. Os TACs da Telefônica e da Oi não foram celebrados, foi tímida a evolução da discussão sobre bens reversíveis e o tão esperado PL 79 não foi aprovado. Também não se notou iniciativas concretas de redução da carga tributária com vistas a viabilizar a expansão (podemos dizer, explosão) das soluções de Internet das Coisas (IoT), o que, se não ocorrer, pode inviabilizar o negócio. Pode-se dizer, então, que o setor permanece em compasso de espera, sem a realização dos desejados investimentos em conectividade e inovação. Para não dizer que foi um ano perdido, no fim de 2018 foi publicado decreto com políticas para o setor que visam à inclusão digital e à ampliação do acesso à banda larga, propondo um Plano Nacional de Conectividade, o que traz certa esperança para o setor.

No entanto, 2019 se apresenta como um ano de expectativas, com a aprovação do PL 79, além da eliminação de entraves para a utilização de recursos do FUST, dos decorrentes de TACs que venham a ser firmados pelas operadoras e do saldo da revisão do modelo de concessão do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC, para a realização dos investimentos necessários com vistas à massificação da banda larga – seja por meio da construção de infraestrutura de suporte, seja por meio da ampliação do acesso –, imprescindível para a efetiva inserção do país no cenário da economia digital. No próximo ano, espera-se expressiva atuação da ANATEL em estudos e revisão da regulamentação objetivando maior disponibilidade de espectro tanto para banda larga móvel como para IoT, além da realização de licitações para autorizações de uso do espectro (5G em especial). Espera-se, também, a publicação de um Plano Nacional de IoT que crie incentivos para a utilização massiva destas aplicações para o desenvolvimento de diversos setores, como o de agricultura, saúde, financeiro etc. e criação de soluções para mobilidade urbana, segurança, utilities como energia e água, entre outras. Espera-se, ainda, uma intensificação do debate quanto à adequação e necessidade da atual legislação de audiovisual. Resta esperar – e torcer – para que 2019 seja melhor para o setor de telecomunicações. O Brasil só tem a ganhar.

Balanço 2018

1. Editado o novo decreto de políticas públicas de telecomunicações (decreto 9.612/18), voltado à ampliação do acesso à banda larga fixa e móvel, com qualidade e velocidade adequadas, inclusive em áreas urbanas desatendidas, rurais ou remotas. O decreto consolida, ainda, o chamado Plano Nacional de Conectividade, com a definição de novos objetivos para as políticas de desenvolvimento tecnológico, inclusão digital e implantação de cidades digitais inteligentes.

2. Importantes iniciativas do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) para expansão do acesso à conectividade, a serem implementadas por meio da Telebras e correspondente exploração do satélite brasileiro SGDC. As iniciativas, contudo, foram questionadas em diferentes esferas, ensejando intensos debates sobre a atuação da Telebras. No momento, os questionamentos estão superados e os projetos podem ser implementados. Entretanto, este esforço não foi acompanhado da redução da FISTEL incidente sobre terminais via satélite – importante para a expansão da conectividade, cujo projeto de lei pouco evoluiu no Congresso Nacional.

3. Realização de Consulta Pública a respeito do Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações – PERT, contendo (i) diagnóstico geral da infraestrutura de telecomunicações do país, com destaque para as deficiências estruturais nas redes de transporte e de acesso que suportam a oferta de acesso à internet em banda larga e (ii) relação de projetos capazes de suprir as deficiências identificadas, bem como as possíveis fontes de financiamento para sua realização (saldo da revisão do modelo de concessão do STFC, TACs, editais de licitação de venda e renovação de radiofrequência, desonerações tributárias e FUST).

4. Elaboração de proposta de alteração legislativa para permitir o financiamento dos projetos selecionados no PERT com o uso de recursos do FUST, tendo em vista que a maioria das fontes de financiamento identificadas na Consulta Pública é incerta e, possivelmente, insuficiente para a realização dos projetos apresentados.

5. Retomada da expectativa com relação à aprovação do projeto de lei que altera a Lei Geral de Telecomunicações (PLC 79/16), que voltou a ser discutido no Senado Federal após quase dois anos paralisado.

6. Intensa discussão a respeito da revisão das metas de universalização (PGMU) e dos Contratos de Concessão do serviço de telefonia fixa (STFC) em regime público, relativos ao período 2016-2020. Aumento da controvérsia quanto ao valor e destino do saldo da troca das metas de ativação de Postos de Serviços de Telecomunicações por instalação de backhaul, ocorrida em 2008.

7. Pequenos avanços no debate dos bens reversíveis, com precedentes do Conselho Diretor da ANATEL no sentido de permitir a alienação de imóveis que não têm função operacional e não servem à prestação de serviços. Embora sejam relevantes, tais decisões ainda são insuficientes para que se tenha segurança nessa questão. Este ano, a controvérsia também chegou no Judiciário.

8. Não celebração dos Termos de Ajustamento de Conduta – TAC negociados com os grupos Oi e Telefônica, com a frustração da expectativa de substituição da obrigação de pagamento de multas administrativas aplicadas pela ANATEL por compromissos de ajustamento das condutas sancionadas e investimentos adicionais para melhoria do serviço prestado.

9. Importantes precedentes do Conselho Diretor da ANATEL relativos ao cálculo do preço público devido pela prorrogação do direito de uso de radiofrequências associadas ao SMP. Ao dar parcial provimento a Recursos Administrativos interpostos pela Vivo, com aprovação de metodologia de cálculo do ônus da prorrogação do uso de radiofrequência pela proporção entre as radiofrequências prorrogadas e o total de radiofrequências da prestadora, a decisão da ANATEL acaba por diminuir o valor arrecado e, com isso, aumentar a disponibilidade de recursos que podem ser empregadas no serviço.

10. Revisão do Plano Geral de Metas de Competição – PGMC, com destaque para a atualização das diretrizes metodológicas para a identificação de mercado relevante de atacado e dos grupos com Poder de Mercado Significativo (PMS), bem como para a introdução da categorização de mercados de atacado com base no nível de competição municipal dos mercados de varejo envolvidos (competitivos, potencialmente competitivos, poucos competitivos e não competitivos).

11. Atualizações da regulamentação setorial no tocante a interconexão de redes (RGI), cobrança de preço público pelo direito de uso de radiofrequências (PPDUR) e de exploração de satélite (PPDES), além do modelo de gestão do espectro e caps de radiofrequências. A ANATEL também realizou importantes consultas públicas a respeito de propostas de revisão da regulamentação de qualidade dos serviços (RQUAL), do compartilhamento de postes de energia elétrica por prestadoras de serviços de telecomunicações e do modelo de outorga e licenciamento de estações, além de consulta pública sobre possíveis modelos regulatórios e adaptação da regulamentação para prestação de serviços de Internet das Coisas (IoT).

12. Conclusão da limpeza da faixa de 700 MHz nas localidades em que o desligamento do sinal analógico está previsto para ocorrer até o fim do ano, incluindo as capitais de estados.

Perspectivas 2019

1. Aprovação do PLC 79/16, permitindo a adaptação das concessões em autorizações, com liberação de recursos para investimento em banda larga, e o chamado “mercado secundário de radiofrequências”, cujas autorizações poderão ser prorrogadas indefinidas vezes, desde que observados determinados critérios legais, a exemplo do uso eficiente do espectro e da inexistência de faltas reiteradas na prestação do serviço.

2. Intensificação da discussão e projetos de expansão do investimento em infraestrutura de banda larga, especialmente para o atendimento de áreas rurais, em linha com as diretrizes do novo decreto de políticas públicas e com possível uso de recursos do FUST e por meio da negociação de novos TACs, que continuarão sendo pauta.

3. Lançamento do Plano Nacional de IoT, com a ratificação das diretrizes públicas, redução de carga tributária e desburocratização de procedimentos.

4. Expectativa com relação à realização de leilões de radiofrequências, com destaque para as faixas de 2,3 GHz e 3,5 GHz, que possibilitarão a oferta de serviços 5G, sendo a faixa de 3,5 GHz particularmente importante, pois permitirá a ampliação de aplicações de Internet das Coisas (IoT). Embora seja mais provável que a licitação do 5G só venha a ocorrer em 2020, outros leilões podem ser realizados pela ANATEL ainda em 2019, nas faixas de 700 MHz, 1.800 MHz e 2.100 MHz.

5. Reestruturação do mercado de telefonia móvel. Com o aumento do cap de radiofrequências pela ANATEL e waiver quanto às restrições que vem impedindo a transferência das autorizações de uso de radiofrequências entre operadoras, abre-se caminho para que um novo player entre no mercado ou para que haja a consolidação de operações já existentes.

6. Conclusão da nova regulamentação de qualidade dos serviços de telecomunicações, mais focada na percepção dos usuários.

7. Reavaliação da regulamentação sobre controle de bens reversíveis.

8. Análise dos modelos de comercialização da banda larga fixa – franquia de dados.

9. Acompanhamento do cumprimento das obrigações previstas no Plano de Recuperação Judicial da Oi, com possível reconfiguração das suas atividades.

10. Discussões quanto à integração de atividades de telecomunicações e audiovisual e a contemporaneidade da lei do SeAC. Com o crescimento de ofertas OTT, começa-se a discutir a necessidade de revisão da legislação do SeAC.

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*Ana Claudia Beppu é advogada da equipe de regulação e concorrência de Mundie e Advogados.





 

*Beatriz França é advogada da equipe de regulação e concorrência de Mundie e Advogados.



 

 

*Francisco Sampaio é advogado da equipe de regulação e concorrência de Mundie e Advogados.

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