Atualmente, o Farm Bill de 2018, ferramenta primária de política agrícola e alimentar do governo dos EUA, encontra-se na mesa do presidente Donald Trump para assinatura, após a aprovação do relatório pelo Congresso em 12 de dezembro último, com larga vantagem a favor do projeto (Senado: 87-13, e House: 386-47)
Quanto aos valores, o Farm Bill envolve recursos da ordem de $ 867 bilhões a serem empregados em áreas como desenvolvimento rural, energia, crédito rural e assistência nutricional, ao longo dos próximos cinco anos. Para o Chairman do Comitê de Agricultura da House of Representatives, Michael Conaway (TX-11), em suma, a passagem do projeto representa um grande negócio para a América rural, desdobrando um caminho melhor para produtores e ranchers, para as comunidades rurais e para o consumidor americano.
Diversos grupos ligados ao setor do agronegócio americano viram o Farm Bill de 2018 como um “pacote completo que servirá a todos os americanos”, como a American Farm Bureau Federation – AFBF, e, no caso da National Grain and Feed Association - NGFA, salientou-se que “a segurança jurídica que o Farm Bill irá garantir para nossa indústria, produtores e consumidores, incluindo a preservação de um seguro de colheitas federal forte, é extremamente importante, e a NGFA olha adiante para trabalhar com os legisladores no apoio para a passagem do bill pelo Congresso”.
Denominado legislativamente como sendo o H.R 2, Agriculture & Nutrition Act de 2018, o Farm Bill, em seus onze títulos, se propõe a tratar das seguintes matérias: commodities (I), conservação (II), comércio (III), nutrição (IV), crédito (V), desenvolvimento rural (VI), pesquisa (VII), silvicultura (VIII), horticultura (IX), seguro de colheita (X) e miscelânea (XI).
O presente artigo visa apresentar, em linhas gerais, o quadro de fomento à segurança jurídica em diversos segmentos da política agrícola americana, a partir do bill de 2018, sendo tais segmentos ressaltados as commodities, o comércio, o crédito, o desenvolvimento rural e o seguro de colheita.
Segundo informações da USDA (Departamento de Agricultura dos EUA), a renda média do produtor rural americano para o ano de 2018 tem uma queda projetada de 12 %, indo a níveis não experimentados antes de 2002, delineando uma relevante recessão agrícola.
Dois são os programas de cobertura de preços no agronegócio americano: o Agriculture Risk Coverage (ARC) e o Price Loss Coverage (PLC). Ambos programas foram autorizados pelo Farm Bill de 2014, e são mantidos e fortalecidos no projeto de 2018. Quanto ao primeiro (ARC), este é responsável por garantir assistência aos produtores rurais quando a renda das colheitas para determinada commodity cai abaixo de 86% da renda benchmark1, operando, assim, em quebra de safras à nível municipal. No projeto, o PLC é melhorado para permitir que preços de referência sejam ajustados quando os mercados melhorarem e para permitir que produtores afetados por secas longas atualizem suas rendas.
Já quanto ao segundo programa (PLC), este se caracteriza por oferecer assistência aos produtores quando o preço de mercado da commodity cai a níveis críticos abaixo do preço de referência estatutário, conhecido por preço de referência (reference price).
No ponto, o projeto permite que produtores optem pelo PLC ou ARC em uma nova escolha, a qual pode ser alterada eventualmente nas safras 2021/2023.
Nos termos do projeto, especialistas dizem que a segurança jurídica será incrementada, de modo que uma simples continuação do último bill (2014) em matéria de commodities não poderia garantir.
Com relação ao comércio internacional (título III), o bill promove a união de quatro programas existentes2, promovendo seu fortalecimento sob a sigla de Market Development Program, o qual será responsável por um orçamento de $ 255 milhões por ano. Nos termos da sec. 205 (a), o secretário de Agricultura e o Commodity Credit Corporation devem estabelecer e desenvolver um programa a ser conhecido como o “International Market Development Program”, para encorajar o desenvolvimento, manutenção, e expansão de mercados comerciais de exportação para as commodities americanas. Da mesma forma, o programa em questão tratará de reportar barreiras existentes ou potenciais que proíbem ou ameaçam a exportação da safra intensiva americana.
No que tange ao crédito3, o bill se compromete a manter a ajuda e incentivo fundamental aos produtores iniciantes, através da continuação do Beginning Farmer and Rancher Individual Developmente Accounts Pilot Program. Da mesma forma, o Conservation Loan and Loan Guarantee Program será conservado como forma de ajudar os produtores a implementar medidas de conservação em suas terras.
Ainda em crédito, o bill, na sec.5103, realiza uma emenda à seção 305(a) do Consolidated Farm and Rural Development Act (7 U.S.C. 1925(a)), atualizando os limites de empréstimo para produtores pela primeira vez em 16 anos, que saltam de $ 700.000,00 para $ 1.750.000,00, podendo ser empregados na compra de equipamentos, insumos e animais.
Em matéria de desenvolvimento rural, o bill faz ecoar a profunda preocupação do setor do agronegócio americano em função da recessão agrícola, tratando de implementar medidas concretas para conter a crise opióides em curso nas regiões rurais, bem como expandir uma cobertura de saúde confiável nessas regiões. Outros pontos tratados estão relacionados a instalação e melhoria da qualidade da internet na chamada “América rural”, como também a reafirmação e fortalecimento das iniciativas relacionadas ao Consolidated Farm and Rural Development Act e o Rural Electrification Act, que abordam temas como eletrificação rural, desenvolvimento cooperativo, telemedicina e aprendizado à distância4.
Como última matéria que este artigo se propõe a apresentar, temos o seguro de colheita. Este trata-se de um dos temas de maior sensibilidade no meio agrário americano. A mensagem vinda das regiões rurais para o Congresso era no sentido de não se fazer qualquer dano ao seguro.
A sensibilidade da matéria está relacionada ao fato de que o seguro de colheita é fundamental, sobretudo, para a recuperação de desastres naturais, sendo necessária para obter financiamentos e fundamental para produtores jovens e iniciantes.
A palavra dada pelo bill na matéria foi no sentido de requerer maiores pesquisas e desenvolvimento de produtos no mercado de seguro agrícola que se adaptem cada vez mais às reais necessidades do produtor, em especial, os atingidos por furacões e outros desastres naturais, de modo que tais produtores não sejam duplamente penalizados com rendimentos de safra reembolsáveis sob o seguro mantidos de forma artificialmente baixa.
A partir de um extrato das matérias até aqui tratadas, se extrai que o Farm Bill caminha, de fato, ao lado da promoção da segurança jurídica para o agronegócio americano, a partir de uma política agrícola que espelha os anseios legítimos da classe rural americana com medidas em vastos setores que compreendem as mais de onze grandes áreas sobre as quais se propõe a atuar.
Do mesmo modo, um balanço geral que se faz é que o bill promove a efetividade e flexibilidade nas políticas de cobertura de preços na pauta relacionada às commodities, como também, em matéria de comércio internacional, estrutura um programa importante de busca e expansão por novos mercados para exportação; bem como, no que tange a crédito, promove uma atualização de limites e fortalecimento do programa de fomento a conservação de terras; em desenvolvimento rural, há consideração de pontos fundamentais para a infraestrutura das comunidades rurais; e, por fim, quanto ao seguro de colheita, este será aprofundado e melhorado em um espaço de tempo relativamente curto.
O governo americano conta com um forte aparato para conduzir sua saída da recessão agrícola. O projeto do Farm Bill de 2018, repisa-se, é robusto e conta com amplo elogio do setor do agronegócio americano, do qual é voz forte o Secretário da USDA Sonny Perdue. Os próximos cinco anos na economia rural americana prometem ser verdes.
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1 O preço de referência mais alto ou respectivo preço de mercado médio para uma commodity coberta. Disponível em: < Clique aqui >.
2 Esses programas são o Market Access Program (MAP), o Foreign Market Development (FMD), e o Technical Assistance for Specialty Crops (TASC).
3 Para garantir que produtores tivessem uma constante corrente de crédito disponível e confiável, o Farm Credit Service foi criado em 1916. Conhecido posteriormente como Farmers Home Administration (FmHA), foi absorvido pela Farm Service Agency (FSA), a qual oferece empréstimos direitos e dá garantia aos empréstimos fornecidos por bancos parceiros e instituições de crédito rural. Disponível em: <Clique aqui>.
4 Disponível em: <Clique aqui>.
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*Manoel Martins Parreira Neto é advogado, atuante na área de Direito do Agronegócio, associado ao Leite Pereira Advogados.