É notório que todo empresário sabe sobre a obrigatoriedade da emissão de nota fiscal no ato da venda de um determinado produto. Porém será que está ciente das consequências da não observância desse ato?
A emissão da nota fiscal é obrigatória, sendo uma forma de controle por parte dos órgãos fiscalizatórios e é através do monitoramento destas que se pode chegar ao crime de sonegação.
A Receita Federal tem como hábito rastrear operações, desde a emissão da nota fiscal de compra até o recebimento do produto ao destinatário final, principalmente através do SPED Fiscal e Contábil, inclusive com o monitoramento de estoques, compras de insumos, produção e venda da mercadoria. Esses programas são capazes de identificar e confrontar as declarações da empresa contra o extrato das administradoras financeiras, com o objetivo de identificar eventual fraude.
A venda de meia nota é um exemplo clássico de subfaturamento. Na prática, a empresa emite uma nota com metade do valor a ser faturado, sendo que a outra metade é paga pelo cliente por fora, o que alimenta o caixa 2.
Os órgãos fiscalizatórios podem detectar estas operações através de uma análise das origens dos depósitos bancários, podendo ter acesso as contas dos sócios, gestores, administradores e até mesmo parentes e terceiros.
Quando não há a emissão do documento fiscal ou a emissão com diferença entre o valor real e o declarado na NF, temos a caracterização de crime tributário na modalidade sonegação fiscal, tipificado na lei 8.137/90 no artigo 1º, inciso III:
“Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;”
As principais ilegalidades que encontramos no dia-a-dia é a venda de mercadorias sem a emissão da nota fiscal pertinente à circulação destas mercadorias ou com o valor reduzido em 50% (meia nota), bem como a venda com a mesma nota fiscal para várias empresas (notas espelhadas ou ainda calçadas).
A lei estabelece como pena reclusão de 2 a 5 anos e multa, podendo o empresário não ficar preso se a condenação imposta não ultrapassar 04 anos e o agente preencher os requisitos subjetivos para receber o benefício, conforme o artigo 44 do Código Penal.
E mais, como na prática as empresas se utilizam deste método corriqueiramente, o empresário ainda pode ser enquadrado no crime continuado, isso por termos crimes da mesma espécie, nos mesmos lugares, circunstâncias e modo de execução semelhantes, o que por si só pode levar ao aumento da penal entre 1/6 a 2/3.
Muitos empresários usam a desculpa de que não tinham o conhecimento dessa prática, ou alegam que foi um equívoco interno, porém para a configuração de crime de sonegação fiscal não se exige a comprovação do dolo específico, bastando que a empresa omita ou insira elementos inexatos na nota fiscal com a finalidade de pagar menos imposto, não sendo necessário demonstrar a vontade de se obter vantagem indevida, mas sim auferindo-a.
Tivemos recentemente um caso de cliente que foi incurso no artigo 1º, incisos III e IV, da lei 8.137/90, ao cumprimento de 02 anos de reclusão, em regime aberto, bem como ao pagamento de 10 dias-multa. Como o empresário era réu primário foi substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade e na prestação pecuniária, no valor de 10 salários mínimos, em cestas básicas, em favor de entidades assistenciais.
Outro cliente, por sua vez, realizou inúmeras transações e emitiram notas fiscais a elas pertinentes, sem que estivessem autorizadas pelo posto fiscal. Dessa forma, visando suprimir tributo, confeccionaram notas não autorizadas pelo Fisco e os sócios foram condenados a 2 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 10 dias-multa. Como remédio estamos recorrendo ao Tribunal de Justiça.
Devemos alertar ainda que as empresas que se utilizam dessa artimanha poderão ter problemas na ordem cível, uma vez que, ao não recebem o efetivo pagamento, não existe juridicamente um meio para pleiteá-los. Além de que quando há o recebimento, a contabilidade terá dificuldades em dar entrada nos registros financeiros e contábeis integralmente, tendo sempre que criar uma alternativa “plano B” o que geralmente pode gerar um passivo tributário/criminal para a empresa.
No âmbito tributário também teremos problema. Quem fornece à Receita Federal espontaneamente depois de ter prestado informações falsas a fim de pagar menos tributos arcará com multa de 20% sobre o valor e mais juros moratórios. Porém, caso a emissão seja constatada pela fiscalização da autoridade fiscal, a multa pode chegar a 150% do valor sonegado, também acrescentados de juros.
Neste cenário, é fundamental que as empresas tenham um departamento penal e que saiba se interagir com o departamento tributário e o cível, dando segurança ao empresário no momento de tomar decisões e que no caso de já existir um problema, garanta a melhor solução.
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*Rafael do Lago Salvador é sócio da área penal empresarial do Duarte e Tonetti Advogados Associados.