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Separação judicial afasta cobertura por morte de cônjuge

Não havendo comprovação da existência de vínculo de feições próprias subsequente à separação judicial, indevida se faz a cobertura securitária no caso de falecimento do cônjuge separado, frente à nova jurisprudência que se solidifica nas cortes superiores, em consonância com a mutabilidade exigida pela evolução das relações humanas.

7/11/2018

De acordo com o recente entendimento da 3ª turma do STJ, no julgamento do REsp 1.695.148/SP, a separação judicial, por si só, é suficiente para a negativa de indenização securitária por falecimento do cônjuge, não havendo necessidade da efetiva conversão em divórcio para rompimento do vínculo afetivo.

O julgado, que deu provimento ao recurso de determinada seguradora que figurou como parte ré em processo de indenização após negativa administrativa de cobertura, teve como cerne da questão definir se a separação judicial seria suficiente para o colocar fim à sociedade conjugal.

Tal entendimento, há de se destacar, tem base em jurisprudência anterior da própria turma, que em julgamento ocorrido no ano de 2010 (REsp 1.129.048/SC), decidiu que a separação judicial, diferentemente do divórcio, não poria termo ao vínculo matrimonial, mas apenas à sociedade conjugal.

Este posicionamento teve origem a partir da interpretação do art. 1.571 do Código Civil vigente, pelo que fixou a Corte na oportunidade que, “em se tratando de contrato de seguro, a melhor exegese orienta que a cláusula de inclusão de cônjuge na qual se emprega o verbete ‘cônjuge’, deve abranger também o beneficiário que, separado judicialmente, não tenha convertido a separação em divórcio (...)”.

Neste viés, para o melhor entendimento do paradoxo interpretativo da questão que levou à mudança de entendimento do STJ, faz-se necessária uma melhor explanação acerca dos institutos da separação judicial e do divórcio, e da sua evolução no ordenamento jurídico pátrio.

Nota-se que a ausência da necessidade de separação prévia para a efetivação do divórcio é um instituto relativamente novo ao direito brasileiro. Em retrospectiva histórica, já se falava na existência do divórcio desde a redação do decreto 181/1890 e na criação do instituto do “desquite” com o Código Civil de 1916. Na evolução legislativa mais recente, houve a introdução da lei 6.515/77, denominada Lei do Divórcio.

Antes do divórcio regulado pela supracitada legislação, era legalmente exigido um momento prévio de separação judicial a durar pelo prazo de 3 anos antes de, finalmente, a conclusão do divórcio.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, surge o instituto da Separação Direta, que apesar do nome, não era exatamente direta: o casal deveria comparecer em juízo e provar a existência de separação de fato por um prazo mínimo de 2 anos.

Em 2010, com a edição da Emenda Constitucional 66, eliminou-se por completo a necessidade de separação prévia ao pedido de divórcio, podendo o casal recorrer diretamente a um cartório para realizar a separação, caso consensual e na hipótese de filhos menores ou incapazes não envolvidos. Para os demais casos, a via judicial é a solução.

Na esteira deste raciocínio, a interpretação própria do Código Civil, em seu art. 1.571, elenca a separação judicial como causa de fim da sociedade conjugal. Todavia, ainda de acordo com o codex, em seu art. 1.576, a separação judicial poria fim apenas aos deveres de coabitação, fidelidade recíproca e de regime de bens do casal.

Para Ricardo Fiuza, muito embora a separação judicial dissolva as obrigações acima tratadas, ainda seria preservado o vínculo entre os casados, vez que seguem impedidos de contraírem novo matrimônio até que o divórcio, a morte ou a morte presumida acabem com o vínculo conjugal válido.

Assim, quando questionado sobre a possibilidade da indenização de cônjuge judicialmente separado em questões securitárias, em um primeiro momento (REsp 1.129.048/SC), o STJ colocou-se na mesma linha de Fiuza, onde se lê no voto vencedor do ministro Massami Uyeda: “Da mera leitura do sobredito dispositivo legal já se pode inferir que a separação dos cônjuges não é o mesmo que o divórcio. De fato, trata-se de institutos jurídicos distintos e, nessa medida, produzem efeitos que não se confundem”.

Desta feita e nesta ocasião, decidiu o STJ que o cônjuge em separação judicial ainda possuiria legitimidade para ser beneficiário de seguro de vida.

Oito anos depois e no mesmo STJ, iniciou-se um movimento no sentido exatamente oposto, durante o julgamento do REsp 1.695.148/SP.

Nos referidos autos, a ministra relatora Nancy Andrighi clamou pela superação do entendimento anterior, tendo em vista que “a sociedade em que vivemos atualmente revela que os vínculos são cada vez mais fluídos e frágeis, de modo que não mais subsistem relações obrigacionais duradouras assentadas essencialmente na forma (na hipótese, conversão da separação em divórcio), de modo que a mais adequada interpretação do art. 1.571 do CC/02 é a de que o conceito de rompimento do vínculo, especialmente quanto às questões patrimoniais, equivale não apenas ao matrimonial, este sim somente ceifado pelo divórcio, mas também ao conjugal, que ocorre em quaisquer das situações enumeradas nos incisos do referido dispositivo legal, dentre as quais, a separação judicial”.

Nesta linha, a nova interpretação tutelada pela Corte, que se alia à evolução da dinamicidade da sociedade e de seus laços, é de que não se deve confundir o término da sociedade conjugal (que pode se operar pela separação judicial), com a dissolução do casamento válido (este sim, decorrente do divórcio ou morte).

Isto porque, a diferença entre o término da sociedade conjugal e a dissolução do casamento se opera na reversibilidade do matrimônio – neste viés, na possibilidade de as partes contraírem ou não um novo matrimônio.

Todavia, as consequências jurídicas no tocante ao plano matrimonial são as mesmas, visto que, de acordo com Madaleno “a separação resolve a situação econômica do casal e põe fim oficial ao regime de bens do matrimônio, podendo os consortes realizarem a partilha do ativo e do passivo de seus bens comunicáveis” (2009, p. 274/275 apud STJ, 2018, online).

Assim, não havendo comprovação da existência de vínculo de feições próprias subsequente à separação judicial, indevida se faz a cobertura securitária no caso de falecimento do cônjuge separado, frente à nova jurisprudência que se solidifica nas cortes superiores, em consonância com a mutabilidade exigida pela evolução das relações humanas.

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FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva, 2016.

 

GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

STJ. RECURSO ESPECIAL: REsp 1129048 SC 2009/0050950-5.

Relator: ministro Massami Uyeda. Julgado: 15/12/2009.

 

STJ. RECURSO ESPECIAL: REsp 1695148 SP 2016/0063972-0.

Relator: ministra Nancy Andrighi. Julgado: 19/06/2018.

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*Rafaela Denes Vialle é sócia do escritório Vialle Advogados Associados.

*Rodrigo Carlesso Moraes é advogado do escritório Vialle Advogados Associados.

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