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Abertura e fechamento de capital em sociedades anônimas – hipóteses legais

A lei assevera que caberá à CVM disciplinar, em caráter infra-legal, a matéria alusiva ao fechamento de capital.

14/10/2018

As sociedades anônimas podem transmudar sua natureza de pública para fechada e vice-versa.

O caminho mais comum é o adotado pelas sociedades que deixam de ser fechadas para tornarem-se abertas. Isso se deve à circunstância de que a abertura capitalística permite ao negócio alçar voos mais altos, tendo em vista que o expediente possibilita a que a companhia emita títulos de investimento para financiar seus projetos, quando então passa a contar com mais vultosos recursos financeiros para a realização de seus objetivos sociais.

Como constitui papel institucional da CVM fiscalizar o funcionamento de sociedade de natureza aberta, compete a esta entidade conceder autorização para que companhias emitam, ofereçam ou negociem títulos ou valores mobiliários (não apenas em bolsas de valores, mas por qualquer meio). A não observância dessa regra implica responsabilidade administrativa e criminal, a teor da disposição do art. 7º da lei 7.492/86.

Portanto, é imprescindível que a companhia fechada que deseje abrir seu capital ao mercado requeira junto à CVM o devido registro, angariando desta autarquia a autorização colimada e sua listagem na bolsa de valores. Porém, antes de proceder ao pedido registral, deve a sociedade fechada que pretenda a abertura de capital se escorar em alguns expedientes internos, a exemplo da mudança de seu estatuto social, para que nele faça constar a mudança em sua natureza.

Repise-se que o procedimento para a obtenção do registro de companhia que pretenda abrir a investidores seu universo capitalístico encontra disciplina minudente na Instrução Normativa 202, de 06 de dezembro de 1993, do CVM.

Quando o assunto, no entanto, é o fechamento do capital social, a questão costuma envolver alguma complexidade. É que, as mais das vezes, as companhias optam por abrir seu capital, a fim de que conquistem recursos no mercado, e não o contrário. Talvez o principal motivo que explique a decisão de fechamento capitalístico se relacione a uma sede de poderio do sócio controlador, que decide retirar da bolsa de valores as ações negociadas diariamente pelos acionistas minoritários com o fito de incorporá-las a seu portfólio, aumentando sua participação acionária. Deve-se anotar que a manobra em epígrafe ressoa mais vantajosa quando as ações da companhia estão em leve queda no mercado, já que diante deste quadro poderá o controlador adquiri-las por preço mais comedido do que o conseguiria numa situação ordinária.

A hipótese de fechamento encontra guarida no art. 4º, § 4º da lei do anonimato. Prevê o dispositivo em alusão que o acionista controlador (ou a própria sociedade empresária) deve formular oferta pública para aquisição da totalidade das ações que estejam em circulação no mercado (a denominada OPA). Determina a legislação que a oferta deve se respaldar em preço justo, entendido como tal aquele que seja igual, no mínimo, ao valor de avaliação da companhia – Para que se alcance esse valor, a lei estabelece que devem ser adotados, em conjunto ou isoladamente, os seguintes critérios contábeis: a) critério de cálculo de patrimônio líquido contábil; b) critério de cálculo de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado; c) fluxo de caixa descontado; d) critério de comparação por múltiplos; e) critério de cotação das ações no mercado de valores mobiliários; f) outro critério – distintos dos anteriores – que seja aceito pela CVM.

Feita a oferta aos acionistas minoritários, com base no valor encontrado a partir dos métodos de avaliação da empresa enumerados em lei, podem os dissidentes representativos de pelo menos 10% das ações em circulação no mercado requerer aos administradores da companhia que convoquem assembleia especial dos acionistas titulares de ações em circulação no mercado, para deliberar sobre a realização de nova avaliação pelo mesmo ou por outro critério, para efeito de determinação do valor de avaliação da companhia (art. 4-A). Em outras vozes, a lei faculta a que os sócios minoritários que não concordem com o valor oferecido por suas ações, atendido o quórum que estabelece, se reúnam para votarem a elaboração de um novo cálculo da empresa, devendo prevalecer o segundo, caso mais vantajoso aos minoritários. Nesse caso, contudo, abre-se oportunidade ao ofertante para que desista da aquisição que intentara.

O pedido dos sócios minoritários para que seja realizada a assembleia que culminará na determinação de nova avaliação da oferta deve ser direcionado aos administradores da companhia, dentro do prazo de 15 dias a contar da divulgação da OPA. O requerimento, para que reste aceito, deve estar adequadamente fundamentado, isto é, deve indicar os elementos de convicção que demonstrem a falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado.

Estando tudo em ordem, é incumbência inafastável do administrador a convocação assemblear, importando seu silêncio (no prazo de até 8 dias a partir do protocolo do requerimento) na possibilidade de que os próprios minoritários convoquem a assembleia em tela.

Caso a nova avaliação da empresa resulte em um resultado negativo, no sentido de que a primeira fora mais favorável aos sócios minoritários, todos aqueles que requereram a nova avaliação ou que votaram a seu favor deverão ressarcir a companhia pelos custos em que tenha incorrido (como a contratação de especialistas e agências de contabilidade para a realização dos cálculos extras, além de eventuais perdas decorrentes do atraso no rito do procedimento de fechamento capitalístico).

A lei assevera que caberá à CVM disciplinar, em caráter infra-legal, a matéria alusiva ao fechamento de capital. Assim, expediu a Comissão de Valores Mobiliários, em atenção ao comando legal, a Instrução Normativa CVM 361, de 5 de março de 2002. Prevê o ato normativo, em seu art. 20, III (combinado com o disposto no art. 4º, § 5º da lei do Anonimato) que terminado o prazo da oferta pública, se ainda sobrarem em circulação menos de 5% da totalidade das ações emitidas pela companhia, a assembleia-geral poderá deliberar o resgate dessas ações pelo valor da oferta, devendo para tanto depositá-lo (no prazo de 15 dias contados da deliberação de resgate) em instituição financeira que mantenha agências aptas a realizar o pagamento aos acionistas, no mínimo, na localidade da sede da companhia e da bolsa de valores ou entidade de mercado de balcão organizado em que as ações fossem admitidas à negociação, e nas capitais de todos os estados do país, divulgando-se a informação através de notícia de fato relevante.

A partir do momento em que é feita a oferta pública, tem-se a designação de um leilão em que as ações serão adquiridas pelo ofertante. O leilão poderá ser suspenso caso 2/3 dos acionistas não demonstrem interesse na venda de suas ações.

Havendo continuidade do leilão (por se achar preenchido o quórum supramencionado), deve a companhia pagar aos aderentes (aqueles que se prontificaram a vender suas ações), por meio de depósito, no prazo de 15 dias.

Ultimado o leilão, a companhia tem autorização da CVM para fechar seu capital, isto é, para retirá-lo de negociação no mercado. Desse modo, os sócios que não venderam suas ações não podem mais se livrar delas com a venda na bolsa de valores ou no mercado de balcão, como costumavam fazer. Devem, em regra, aliená-las a outros sócios, nas hipóteses autorizadas em lei. No entanto, pode ser que o preço da venda sofra grande deságio, tendo em vista que a companhia não mais tem ações negociadas de maneira especulativa, como intercorria no mercado de valores mobiliários da bolsa.

Com efeito, mostra-se delicada a situação do acionista que opta por não alienar suas ações ao controlador quando da oferta, tendo em vista que ao não fazê-lo se submete ao inexorável risco de ver desvalorizar de maneira abrupta o poder acionário que tinha em mão.

Por conta dessa peculiaridade, deve o acionista sopesar a conveniência de alienar suas ações ou aguardar que a companhia tome a iniciativa de adquiri-las espontaneamente, na hipótese em que haja em circulação menos de 5% de ações em circulação no mercado. Também não pode o acionista deixar escoar o prazo para que se habilite para participar do leilão, o que acarretaria em consequências símiles à recusa em vender sua participação acionária. De todo modo, a legislação libera ao sócio não participante do leilão a oportunidade de, dentro do prazo de três meses, ofertar à sociedade suas ações, caso em que esta é compelida a compra-las pelo preço constante da OPA.

Em arremate, uma breve palavra ao respeito do instituto denominado jurisprudencialmente “fechamento indireto do capital” ou “fechamento em branco”. Prevê o art. 4º, § 6º da lei das companhias que o acionista controlador ou a sociedade controladora que adquirir ações da companhia aberta sob seu controle que elevem sua participação, direta ou indireta, em determinada espécie e classe de ações à porcentagem que, segundo normas gerais expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, impeça a liquidez de mercado das ações remanescentes, será obrigado a promover OPA, para aquisição da totalidade das ações remanescentes no mercado.

Pelo que se vê do dispositivo legal, só é lícito ao acionista controlador (ou à própria sociedade empresária) adquirir grande volume de ações no mercado caso as ações restantes permaneçam líquidas, de acordo com critérios fixados pela CVM. Em outras palavras, a aquisição de ações não pode importar em frustração da expectativa de venda das remanescentes, o que configuraria uma espécie de fraude ao procedimento legal de fechamento de capital.

Ora, se com o fechamento de capital o acionista minoritário têm à sua disposição o direito de acompanhar de perto a avaliação da empresa, para só então decidir sobre a venda de suas ações a partir da oferta pública que lhe é adereçada, não seria razoável que o capital pudesse ser fechado sem que lhe fosse franqueada referida oportunidade. Por isso a lei exige a OPA nos casos em que as manobras efetivadas pelo controlador ou pela sociedade para aumentar seu poderio acionário coloca em xeque a liquidez das ações restantes. Isso se deve ao fato de que a iliquidez das ações remanescentes tem o mesmo efeito, para o acionista minoritário, do fechamento do capital (daí por que denominarem-no fechamento indireto ou em branco). Senão vejamos.

Quando a companhia resolve fechar seu capital, a principal consequência para o acionista minoritário é a impossibilidade de venda de suas ações na bolsa de valores, tendo em vista que as companhias fechadas não podem admitir seus valores mobiliários à negociação, sob pena de incursão dos responsáveis pela negociação não autorizada na prática de crime. Em resumo, a consequência imediata do fechamento capitalístico está na impraticabilidade de qualquer operação de venda acionária. O detentor das ações fica, por assim dizer, sem ter o que com elas fazer, já que não pode mais comercializá-las – vendê-las, deve procurar diretamente quem tenha interesse em adquiri-las, observados os direitos de preferência estabelecidos em lei ou no estatuto social.

A igual restrição de venda se encontra o acionista da sociedade aberta que continua a sê-lo, mas que por conta de manobras patrocinadas pelo controlador ou pela própria sociedade vê a liquidez de seu poder acionário ser reduzido virtualmente a zero. É que nesses casos, como a companhia perdeu a liquidez das ações que sobraram no mercado, tendo em vista que o controle esmagador recaiu sobre as mãos de uma única pessoa (na qual o mercado não confia, por exemplo, por conta de seu comportamento ruinoso no tocante a investimentos), os sócios minoritários restantes não têm mais mercado para venderem suas ações.

Conforme definição constante do dicionário financeiro (In: clique aqui. Acesso em: 16 de setembro de 2018.):

Liquidez é a facilidade de um ativo ser transformado em dinheiro sem perdas significativas em seu valor. Esse conceito se refere à agilidade com que um investidor consegue se desfazer de um investimento para voltar a ter dinheiro na mão sem que, para isso, precise ter prejuízo.
Ao fazer um investimento, um investidor troca uma quantia de dinheiro por um ativo. Esse ativo pode ser um título público, uma caderneta de poupança, ações de empresas ou um imóvel, por exemplo.
Se esse investidor tiver algum imprevisto e precisar do dinheiro de volta, ele precisará se desfazer do bem ou do direito que adquiriu. No entanto, alguns desses investimentos têm uma maior liquidez do que outros, ou seja, é mais fácil e rápido de os transformar em dinheiro do que outros.

Destarte, as ações dos minoritários não podem mais ser negociadas em bolsa – não porque a lei o proíba, mas porque ninguém racional teria interesse em compra-las.

Em virtude das consequências nefastas do fechamento indireto, que se traduz em ato fraudulento que implica na desvalorização das ações por manobra do controlador, sem que seja dado ao sócio minoritário a oportunidade para se livrar das suas ações que detém por preço justo, caso assim deseje, é que a lei expressamente o proscreve. Por isso é imprescindível que o controlador (ou a sociedade empresária) responsável pela desvalorização acionária, de acordo com critérios fixados pela CVM, ofereça aos minoritários oportunidade para que, por meio de OPA, sejam adquiridas suas ações.

Recentemente o STJ teve oportunidade de enfrentar a questão. Trata-se do julgamento do REsp 1.642.327/SP, de relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Na ocasião, o tribunal assentou que só caberia a proibição legal para o fechamento indireto quando a aquisição das ações da sociedade implicasse iliquidez das ações restantes. Continuando líquidas, não se há falar em necessidade de promoção de oferta pública para aquisição de ações (OPA), porque inexistente previsão legal neste sentido. Vejamos, portanto, a ementa do julgado em referência, terminado assim o presente artigo:

EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO SOCIETÁRIO. SOCIEDADE ANÔNIMA. INCORPORAÇÃO DE AÇÕES. TRANSFORMAÇÃO DA CONTROLADA EM SUBSIDIÁRIA INTEGRAL. OFERTA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. EQUIPARAÇÃO A FECHAMENTO DE CAPITAL. APLICAÇÃO DO ART. 4º, § 4º, DA LEI DAS S/A POR ANALOGIA. DESCABIMENTO.
1. Controvérsia acerca da necessidade de a companhia controladora realizar oferta pública de aquisição de ações em favor dos acionistas preferenciais da companhia que teve suas ações incorporadas. 2. Existência de norma que exige a realização de oferta pública para aquisição de ações no caso de fechamento de capital (art. 4º, § 4º, da lei 6.404/76). 3. Distinção entre a hipótese de fechamento de capital e a de incorporação de ações entre companhias de capital aberto. 4. Inocorrência de fechamento em branco (ou indireto) de capital no caso dos autos, pois as companhias envolvidas na operação são de capital aberto, não tendo havido perda de liquidez das ações. 5. Inaplicabilidade, mesmo por analogia, da norma constante do art. 4º, § 4º, da lei 6.404/76 ao caso dos autos. 6. Doutrina e jurisprudência do STJ. 7. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (STJ, REsp 1.642.327/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 19/09/2017, Dje de 26/09/2017).

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BRASIL. In: clique aqui. Acesso em 20 de Agosto de 2018.

BRASIL. Lei 6.404 (Lei das Sociedades Anônimas), de 15 de dezembro de 1976.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.642.327/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. Julgado em 19 de setembro de 2017.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa. Vol. 2, Sociedades. 16ª Ed., São Paulo: Saraiva.

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*Adenilson Moreira é advogado, consultor jurídico e parecerista, com atuação nas áreas do Direito Empresarial e do Direito Tributário. É também escritor e associado ao escritório Freitas & Biagi Sociedade de Advogados.

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