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Falta de comunicação antes do envio do nome do correntista ao Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundo (CCF) é ilegal

As normas obrigam a comunicação prévia por escrito e dispõem sobre a responsabilidade do banco na inclusão das informações.

17/9/2018

O Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundo (CCF) é um cadastro de devedor mantido pelo Banco Central do Brasil (Bacen) e operacionalizado pelo Banco do Brasil.

O correntista de um banco que emite um cheque que é devolvido por falta de fundos, conta encerrada ou prática espúria pode ser incluído no CCF.

Entretanto, a inclusão do nome nesse cadastro depende de notificação prévia. A falta de comunicação antes do envio do nome do correntista ao CCF, apesar de comum, é ilegal e pode dar origem à uma indenização por danos morais. Confira!

Necessidade de comunicação antes do envio do nome do correntista ao CCF

A falta de comunicação antes do envio do nome do correntista ao CCF é uma prática ilegal, porque tira o direito do consumidor de regularizar as pendências. Em outras palavras, ofende os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa (CF, art. 5º, LV), além de violar o disposto na resolução 1631 (revisada pela 1682) e na circular 2.250 do Banco Central. Essas normas obrigam a comunicação prévia por escrito e dispõem sobre a responsabilidade do banco na inclusão das informações.

Posicionamento dos tribunais

O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso repetitivo (estabelece um entendimento único sobre as questões que tratam do mesmo tema), entendeu que o banco sacado tem responsabilidade em notificar previamente a anotação no CCF.

O tribunal esclarece que o Banco do Brasil é um mero operador e gestor do Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos – CCF. Por isso, não possui "legitimidade passiva para responder por danos resultantes da ausência de notificação prévia do correntista acerca de sua inscrição no referido cadastro, obrigação que incumbe ao banco sacado, junto ao qual o correntista mantém relação contratual".

Em outras palavras, em uma eventual ação de reparação por danos morais por inclusão do nome no CCF sem comunicação prévia, o réu será o banco sacado com o qual o correntista possui relação de consumo, e não o Banco do Brasil.

Cancelamento do registro

O registro do nome do correntista no CCF sem notificação prévia é um desrespeito às normas do Banco Central. Por isso, ofende o princípio da legalidade (CF, art. 37), que também é um princípio constitucional. E um ato ilegal deve ser declarado nulo conforme as leis brasileiras (artigo 166, IV e 185, do Código Civil).

Na prática, isso significa que, conforme a resolução 1631 do BACEN, o banco deve solicitar a baixa do registro diretamente ao Banco Central, quando o erro for comprovado, sem ônus para o consumidor:

Art. 19. As ocorrências serão excluídas do Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos: b) a pedido do estabelecimento sacado, ou por iniciativa do próprio executante, se comandada a inclusão por erro comprovado, hipótese em que a instituição, tão logo tenha conhecimento do fato, deve comandar a exclusão do CCF, sem ônus para o cliente.

Danos morais

O cancelamento do registro não é suficiente para reparar o dano causado na relação de consumo. De acordo com nossas leis, o banco responderá, neste caso, de forma objetiva pelos danos morais que causou ao correntista (186 e 927, §único CC e 14, CDC). Isso significa que a responsabilidade não depende de comprovação de culpa.

Isso ocorrerá, porque as informações do CCF, apesar de restritas para bancos, são repassadas aos órgãos de proteção ao crédito e/ou cadastros de devedores (art. 18 da resolução 1.631/89 do BACEN):

Art. 18. O executante do serviço de compensação de cheques e outros papéis poderá firmar convênios com instituições financeiras e entidades que exerçam atividades de proteção ao crédito, para fornecimento, mediante preço e condições operacionais por ele estabelecidas, de exemplares do CCF bem como dos movimentos consolidados no artigo 17.

Em outras palavras, o registro no CCF é uma verdadeira negativação indevida, cujo dano moral é presumido, pois ofende os direitos à personalidade do correntista, especificamente a honra (objetiva e subjetiva), imagem, intimidade e vida privada, protegidos pela Constituição e pelo Código Civil Brasileiro.

Neste tipo reparação por danos morais, os valores arbitrados ficam entre 5 e 10 mil reais. O consumidor deve comprovar que seu nome está inscrito no CCF, juntando uma certidão expedida pelo Bacen ou extratos dos órgãos de proteção ao crédito. Já o banco sacado deverá comprovar que o consumidor foi comunicado antes da solicitação do registro no CCF.

Por não exigir prova complexa, a ação de indenização pode ser proposta no Juizado Especial Cível (JEC), com ou sem advogado, dependendo do valor do pedido.

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*Julio Engel é advogado especialista em direitos do consumidor, bancário e imobiliário. Sócio fundador do Engel Rubel Advogados.

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