Aportar o primeiro cheque em uma empresa costumava ser um grande distintivo de honra para investidores-anjo. No entanto, até mesmo em ambientes mais favoráveis ao capital, como o Vale do Silício, este cenário tem sofrido consideráveis mudanças nos últimos anos.
Este movimento não se deve apenas às dificuldades de tração das startups nos primeiros anos ou à difícil fricção da primeira rodada de investimentos. Modelos de negócio antes considerados terrenos desconhecidos e que exigiam grande confiança no time e em seus empreendedores, se tornaram modelos "mais do mesmo". Isso ocasionou um considerável percurso passível de análises e avaliações.
Junto com este processo os investidores-anjo, dentro ou fora do Brasil, vêm se profissionalizando em diversas facetas dos negócios de seus aportados. Consequentemente, o nível de exigência para o primeiro cheque torna-se cada vez maior.
De acordo com uma recente pesquisa da National Venture Capital Association (NVCA) em parceria com a PitchBook, o volume de capital disponível para o seed investment (investimento semente) ainda é alto e projetou o teto do ticket médio para aporte, antes US$2 milhões, para 2,2 milhões. O valor destinado a valuations fica com média de US$10,7 milhões. No entanto, foi constatada uma queda de 30% na concretização das rodadas de financiamento quando comparado ao primeiro trimestre deste ano em relação ao de 2017.
Com mais dólares injetados em poucos projetos iniciais, a barra analítica está cada vez mais alta para as pequenas empresas-semente. Para o capital semente, anteriormente, os investidores se satisfaziam com um grande time e uma ideia espetacular exibida em um power point atrativo. O fato de existirem sinais reais de adequação ao mercado e testes iniciais com o público não são mais exigências limitantes. Seguindo esta onda, o capital semente, que por muitos anos foi utilizado para aperfeiçoamento da ideia, hoje se aproxima cada vez mais de uma rodada de investimentos série A, que se aproxima cada vez mais de uma rodada série B, e assim sucessivamente.
A lacuna que este movimento de maior diligência causa no ecossistema de startups é considerável e a solução para isto não está somente na economia colaborativa. Fazer mais com menos, manter a startup enxuta, utilizar-se da estrutura de comunidades de fomento e de fontes abertas, optar pela parceria ao invés da contratação, são exemplos de soluções para vencer essa mudança no mercado.
A segurança que os investidores de capital semente necessitam, transita hoje mais pela robustez jurídica que os empreendedores e empresas apresentam. Isto porque não há sentido em ofertar uma série de garantias ao investidor, se no fim das contas o mesmo não tiver como se valer juridicamente ou exigir estas garantias.
A antecipação de diligências prévias e a transparência do empreendedor em estar em "compliance" com a regulamentação de seu mercado, atrelados às melhores práticas de governança corporativa, já não podem soar como "problema de empresa grande" no ecossistema de inovação.
Dessa forma, os desafios para se conseguir o primeiro cheque transcendem os escopos negociais e de mercado. Tal mudança exige mais dos empreendedores e empresas nascentes um arsenal de segurança jurídica, para que esta lacuna no estágio de capital semente não se torne um abismo em poucos anos.
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