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Whistleblower: Análise da proteção do denunciante de boa-fé à luz da lei 13.608/18 e da lei 12.846/13

Este estudo pretende analisar e identificar em que medida a lei 13.608/18 garante a proteção do denunciante de boa-fé contra possíveis retaliações ou ameaças, quais os mecanismos que são realmente efetivos para protegê-lo, apurando aqueles que se mostram ineficientes e que soluções possíveis poderão ser introduzidas a partir da identificação de eventuais lacunas.

10/9/2018

O caso hipotético supra demonstra o atual cenário brasileiro frente aos escândalos de corrupção envolvendo empresários, executivos, partidos políticos e demais agentes políticos.

Este trabalho tem por objetivo analisar como a figura do whistleblower poderá servir de amparo às autoridades quando ocorrerem operações irregulares nas sociedades empresárias. Identificar-se-á, inclusive, quais meios poderão ser empregados para facilitar o trabalho investigativo.

O intuito deste estudo não é esgotar o tema, mas propiciar o debate acerca do instituto que foi inaugurado no Brasil pela lei 13.608/18, em 10 de janeiro de 2018, por ser o whistleblowing considerado um importante instrumento de combate à corrupção e ao suborno.

Ademais, o presente estudo pretende esclarecer a figura jurídica do whistleblower, abordando sua origem e evolução histórica, os esforços do Brasil para combater à corrupção e que medidas as sociedades empresárias podem adotar para mitigar os riscos que poderão resultar em danos catastróficos aos ativos e à imagem da organização.

Algumas situações ocorridas no caso gerador terão destaque para que possam ser prevenidas, partindo dos seguintes questionamentos: Quais as consequências das irregularidades cometidas nas operações da empresa? Sua integridade foi preservada? Existia um programa de compliance efetivo? Se existia, quais lacunas contribuíram para o cometimento de falhas que levaram ao ilícito? Por qual motivo o canal de denúncias não apurou o fato antes de serem levados às autoridades? De que forma os processos de controle podem ser melhorados?

Em termos de relevância, compreende-se ser o whistleblowing um tema de extrema relevância para o Brasil, que atualmente atravessa uma zona cinzenta de escândalos de corrupção e uma grande crise econômica, que resultam em uma mudança de paradigma social no que tange ao combate à corrupção.

Nessa seara, a lei 13.608/18, que instituiu o wistleblowing no ordenamento jurídico brasileiro, será objeto de análise, a fim de identificar quais pontos merecem aprimoramento e saber quais mecanismos existentes apresentam certo grau de eficiência. Será analisado, inclusive, como o instituto vem se desenvolvendo como política pública no país.

Nesse contexto, o trabalho trará à baila os mecanismos anticorrupção que estão sendo implementados dentro das organizações, sobretudo nas sociedades empresariais. Dando enfoque aos chamados “Programas de Integridades”, por entender sua importância na luta contra a corrupção. Entende-se que o compliance passou a exercer um papel fundamental nas companhias, trazendo muitas mudanças, que principalmente alteram o poder decisório dos executivos.

Por fim, cumpre abordar as mudanças trazidas pela lei 12.846/13, lei anticorrupção brasileira, regulamentada pelo decreto-lei 8.420, que introduziu no Direito brasileiro, de forma integral, os conceitos sobre a responsabilização administrativa das pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública.

Quem é o whistleblower

O whistleblower é toda e qualquer pessoa que, ao perceber irregularidades dentro de uma organização, seja pública ou privada, reporta os fatos às autoridades que irão apurá-los e promover as medidas que serão cabíveis.

Na tradução literal do inglês, o whistleblower é aquele que “sopra o apito” diante de transgressões às regras do jogo. Alguns autores utilizam outras denominações como denunciante, reportante e informante. Assim, neste estudo, tais denominações serão utilizadas de igual forma para designar o whistleblower.

Nesse contexto, pode-se afirmar que o whistleblower é aquele que expõe uma informação ou atividade considerada ilegal, desonesta ou irregular de uma organização, seja pública ou privada. As irregularidades podem ser: a violação de normas, leis ou regulamentos; uma situação que ameace a segurança nacional ou de relevante interesse público; e ocorrência de fraude ou corrupção.

Segundo De Paula e Castro (2018, p. 127), ao fazer o whistleblowing, o indivíduo torna pública uma informação ou simplesmente a disponibiliza para que um terceiro a torne pública. Outrossim, considera-se razoável que a informação trate de um real ou potencial delito relevante e que o indivíduo tenha feito ou faça parte da organização.

Para a Transparência Internacional (2013, p. 2), “soprar o apito” trata-se da extensão da liberdade de expressão, pois as pessoas têm o direito de relatar e denunciar qualquer ilícito de que tome ciência. Tal fundamento baseia-se nos princípios da transparência e integridade.

Marcia Miceli e Janet Near (1985, p. 4) definem o whistleblowing como sendo a divulgação, pelo membro de uma organização (atual ou prévio), de um ato ilegal, imoral ou ilegítimo que ocorreu sob o controle do seu empregador para uma pessoa ou autoridade apta a tomar medidas efetivas e corretivas.

Roberta Ann Johnson (2003) elenca os três elementos importantes e integrativos do instituto: a voluntariedade, a relevância e o reporte à autoridade competente. A voluntariedade se dá pelo whistleblowing ser um ato voluntário do agente que deseja tornar pública uma informação.

No que tange às transgressões, a Transparência Internacional define de forma detalhada:

Whistleblowing é a revelação ou o relato de transgressões, incluindo, mas não se limitando a corrupção; delitos criminais; violação de obrigações legais; denegação de justiça; perigos específicos à saúde pública, segurança e meio ambiente; abuso de autoridades; uso não autorizado de recursos ou propriedade pública; desperdício ou má gestão; conflito de interesses; e atos para encobrir qualquer um dos relatados acima. (JOHNSON, 2003, p. 4, tradução nossa)

Quanto ao conceito de lealdade, no que se refere ao denunciante em relação à pessoa jurídica em que trabalha, torna-se irrelevante, pois o que ganha maior relevância e deve ser levado em consideração é a responsabilidade do empregado em atender ao interesse público. Ora, diante de um comportamento antiético ou de uma fraude, o empregado tem o dever moral de evitar o prejuízo social. O dilema ético deve ser contrabalanceado, entretanto, com o que será mais custoso para toda a sociedade.

Convém, entretanto, destacar que em nada se confunde um insider ou bell-ringer com o whistleblower, visto que sua característica essencial é ser parte da organização onde ocorreram as irregularidades. No decorrer desse estudo, discutir-se-á a premiação dada ao reportante, também chamada de recompensa.

Logo, o whistleblowing deve ser visto como um importante mecanismo de combate à corrupção, sistêmica ou pontual. Todavia, deverão existir instrumentos capazes de assegurar a proteção do denunciante de boa-fé que age em favor da coletividade.

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*Luana Lourenço é consultora em compliance e governança corporativa, ética corporativa, liderança e mediação empresarial.

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