A Constituição Federal, em seus artigos 196 e 197 garante a todos o direito à saúde:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.
O que se extrai dos dispositivos constitucionais mencionados acima, à exaustão, é que todo e qualquer ser humano tem o direito à saúde, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. Trata-se, portanto, de direito fundamental social, que goza de eficácia e aplicabilidade imediata, nos termos do § 1º, do art. 5º da CF.
Pois bem. Aliada a previsão constitucional, a lei 9.656/98 cuida das matérias envolvendo questões relativas aos planos de saúde.
O art. 12, inciso III, alínea a estabelece que:
Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:
(...)
III - quando incluir atendimento obstétrico:
a) cobertura assistencial ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, ou de seu dependente, durante os primeiros trinta dias após o parto; (destacamos)
Em primeiro lugar, importante esclarecer que é de conhecimento público e notório acerca do direito do filho biológico ou adotivo ter a cobertura assistencial, nos primeiros 30 dias após o nascimento, seja pelo contrato da mãe ou do pai, desde que o plano seja hospitalar, com obstetrícia e tenha cumprido o prazo de carência de 180 dias.
Contudo, durante esse período de assistência, diversas dúvidas surgem para os consumidores em relação a forma de operacionalização dos direitos do recém-nascido, como por exemplo, nas hipóteses elencadas abaixo:
(i) Para que o recém-nascido possa ser atendido, deverá utilizar o plano de saúde da sua mãe ou do seu pai?
(ii) Caso somente o pai possua plano de saúde e o parto tenha sido realizado em hospital público, o que os pais deverão fazer?
(iii) Se superado o prazo de 30 (trinta) dias de internação, o que fazer para o tratamento não ser interrompido? É possível colocar o filho como dependente do plano? Existe carência?
Em relação ao primeiro questionamento, cuja resposta está atrelada também ao segundo, importante esclarecer que geralmente o atendimento é realizado ao recém-nascido ou ao filho adotivo por meio do plano da mãe.
A redação do inciso III, alínea a do art. 12 da lei 9656/98, utiliza os termos consumidor e dependente de maneira ampla, genérica e sem especificar o gênero do sexo, razão pela qual, extrai-se, portanto, que o atendimento do recém-nascido poderá ser feito tanto pelo plano de saúde do pai quanto da mãe.
Além disso, se a intenção do legislador fosse limitar o atendimento de acordo com o gênero, isto deveria estar escrito de maneira explícita no dispositivo legal, o que não ocorre.
Outrossim, o próprio art. 4º da Resolução Normativa nº 25 da ANS, que é o órgão que regula as atividades dos planos de saúde, assevera categoricamente acerca da inexistência de distinção entre pai e mãe:
4. O recém-nascido, filho natural ou adotivo de beneficiário de plano de saúde de segmentação hospitalar com obstetrícia, pode ser inscrito no plano de saúde em até 30 (trinta) dias do nascimento ou adoção, observando-se:
4.1. A inscrição pode ser exercida quando o beneficiário for o pai ou a mãe; (destacamos)
4.2. A inscrição independe de o parto ter sido coberto pela operadora ou do cumprimento de quaisquer prazos de carência; e
4.3. O cumprimento ou não do prazo de carência para parto a termo não interfere no direito à inscrição no plano de saúde
Desta forma, extrai-se que no Brasil comumente é utilizado o plano de saúde da mãe tão somente por questões culturais, pois ela é a responsável pela gestação e dar a luz ao recém-nascido.
Nesse ponto, conclui-se, portanto, que para o exercício da garantia ao direito de atendimento ao recém-nascido, isto pode ser feito tanto pelo plano de saúde da mãe, quanto pelo plano de saúde do pai (com cobertura obstétrica e mesmo que o parto tenha sido realizado em hospital público), ante a inexistência de vedação legal para esta solicitação.
Em relação ao terceiro e último questionamento, caso seja imprescindível a continuação da internação do recém-nascido e esta tenha superado o prazo de 30 dias, não há o que se falar em descontinuidade do tratamento, pois referida restrição implica em desvantagem excessiva ao consumidor, nos termos do art. 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor, sobretudo por se tratar de legítima expectativa de cobertura securitária.
Inclusive, esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
CIVIL. CONSUMIDOR. PROCESSO CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE COBRANÇA. INTERNAÇÃO. NASCITURO. PLANO DE SAÚDE. OBRIGATORIEDADE. COBERTURA. TRINTÍDIO. MITIGAÇÃO. REGRA. ART. 51, IV, DO CDC. CLÁUSULA INÍQUA OU ABUSIVA. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. ART. 422 DO CC. FUNDAMENTO SUFICIENTE. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. SÚMULA Nº 283, DO STF, POR ANALOGIA. AGRAVO CONHECIDO. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. (STJ, Agravo em Recurso Especial nº. 1.267.346-SP (2018/0061644-0), Relator Ministro Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. em 23.04.2018 - destacamos).
Por fim, cabe informar que é possível colocar o filho como dependente dos pais, isento do cumprimento de carência, desde que a inscrição ocorra no prazo máximo de 30 dias do nascimento ou da adoção.
Nesse sentido, a alínea b do inciso III, do art. 12 estabelece que:
b) inscrição assegurada ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, como dependente, isento do cumprimento dos períodos de carência, desde que a inscrição ocorra no prazo máximo de trinta dias do nascimento ou da adoção; (destacamos)
Conclui-se, então, que caso haja qualquer negativa por parte do plano de saúde em relação aos questionamentos apresentados acima, o consumidor deverá fazer valer seus direitos, por meio de um advogado.
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