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Título executivo judicial inexequível, a rescisória e a terceirização

É necessário, porém, entender que a Corte Suprema quando decidiu sobre a terceirização e sua constitucionalidade, não julgou uma matéria com reflexos para o futuro, pois nesse aspecto existe a própria lei 13.467/17 que regulamenta a terceirização em todas as atividades.

4/9/2018

O artigo 894 da Consolidação das Leis do Trabalho, ao tratar dos embargos à execução e de sua impugnação, afirma em seu parágrafo 5º que:

"Considera-se inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal."

Esse parágrafo foi acrescentado ao artigo 884 da CLT pela medida provisória 2.180 de 24/8/2001.

Em redação semelhante diz o parágrafo 12 do artigo 525 do Código de Processo Civil:

"Para efeito do disposto no inciso III do parágrafo 1º deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso."

Essa inexigibilidade do título executivo pode ser declarada inclusive de ofício no procedimento judicial de execução, o que é inviável nos processos meramente administrativos, como afirma a OJ 12 do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho:

"O presidente do TRT, em sede de precatório, não tem competência funcional para declarar a inexigibilidade do título judicial exequendo, com fundamento no artigo 884, parágrafo 5º da CLT, ante a natureza meramente administrativa do procedimento",

Ou seja, se a natureza do título for judicial poderá o magistrado declarar inexigível o título exequendo com fundamento no parágrafo 5º do artigo 884 da CLT.

O Supremo Tribunal Federal, julgando o recurso extraordinário 713.211, em conjunto com a ADPF 324 concluiu que a terceirização em todas as atividades sempre foi legal e não poderia a Justiça do Trabalho limitá-la às atividades-meio, uma limitação subjetiva pois não havia lei no Brasil que a proibisse.

Essa limitação da Justiça do Trabalho foi estratificada em razão de uma jurisprudência que se refletiu na súmula 331, admitindo a terceirização na empresas de segurança e limpeza, bem como naquelas relativas às atividade meio das empresas.

Considerou o Supremo Tribunal Federal que as restrições jurisprudenciais da Justiça do Trabalho e, especialmente, da súmula 331 do TST, eram inconstitucionais, salvo a subsidiariedade, violando os princípios da legalidade (artigo 5º, II ) da separação de poderes (artigo 2º) , do devido processo legal (artigo 5º, LV) e da livre iniciativa(artigos 1º, IV e 170 caput e parágrafo único).

É certo que existem empresas que não cumprem com seus compromissos trabalhistas, desrespeitam normas e submetem os trabalhadores a trabalhos extenuantes.

Certo é também que essas empresas podem ser terceirizadas ou não, cabendo à Justiça do Trabalho e ao Ministério Público agir no sentido de fiscalizar e punir quem atua de forma contrária à lei, mas considerou a Corte Suprema ser inconstitucional a proibição de atividades na terceirização, proibição inexistente tanto na lei como na Constituição.

Na realidade, na época da edição da súmula 331, não havia previsão normativa que cuidasse especificamente do fenômeno da terceirização, o que venho a ocorrer nas leis 13.429/17 e 13.467/17, esclarecendo um instituto que nunca foi proibido porque decorrente, inclusive, de um contrato de prestação de serviços, de natureza civil, sempre admitido pelo Código Civil.

Evidentemente que o foco da Justiça do Trabalho, ao meu ver, foi sempre equivocado quando proibia a terceirização em determinadas atividades, pois constitucionalmente cabe à Justiça trabalhista verificar o contrato de trabalho e possíveis prejuízos do empregado mas não proibir um contrato que é de natureza civil, entre duas empresas, como vinha fazendo, vedando em tese a contratação de forma geral, presumindo a fraude, como demonstrado, inclusive, em diversas ações civis públicas.

O fato é que vários princípios constitucionais foram violados, conforme demonstrado no julgamento do Supremo Tribunal Federal no recurso extraordinário e na ADPF citados, e esse julgamento, com repercussão geral tem reflexos nos milhares de processos atualmente suspensos no Tribunal Superior do Trabalho, aguardando a publicação do acórdão e baixa dos processos para julgamentos de acordo com as referidas decisões da Suprema Corte.

Resta, porém, verificar como ficarão os processos atualmente em execução, que tratam da tese de terceirização a qual foi proibida pela Justiça do Trabalho em decisões inconstitucionais, conforme se vê dos julgamentos da Corte Suprema.

O artigo 884, parágrafo 5º da Consolidação das Leis do Trabalho, considera inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo tribunal Federal OU EM APLICAÇÃO OU INTERPRETAÇÃO TIDAS POR INCOMPATÍVEIS COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

Depreende-se do referido artigo que se a execução decorre de decisão, transitada em julgado, fundamentada em aplicação ou interpretação tida como incompatível com a Constituição Federal, não pode o título ser executado, pois é ele inexigível.

A inconstitucionalidade do referido artigo 884, parágrafo 5º da Consolidação das Leis do Trabalho, entretanto, foi arguida em Ação Direta de Inconstitucionalidade, 3.740, ainda em tramitação no Supremo Tribunal Federal, por entender a requerente que o referido parágrafo relativiza a coisa julgada.

O processo que está com o relator ministro Gilmar Mendes, é de 2006, ou seja, encontra-se em tramitação faz doze anos e tem parecer da Procuradoria Geral da República no sentido de:

"Pela procedência parcial do pedido, dando-se interpretação conforme a Constituição, de modo que sejam autorizados os instrumentos processuais de contrariedade ao caso julgado apenas nas hipóteses de declaração de inconstitucionalidade emanada em controle abstrato de constitucionalidade das leis".

Também no Recurso Extraordinário 590880 discute o STF a mesma matéria, havendo quatro votos pela constitucionalidade do artigo e pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.

Os Tribunais Regionais do Trabalho, em decorrência de uma orientação ainda não cristalizada pelo Supremo Tribunal Federal, têm julgado a tese de maneira diversa:

Exemplificando no processo AP2844820155070006 o TRT da 7ª Região entendeu que

"A inexigibilidade do título judicial, instrumentalizada na relativização da coisa julgada, art. 884, parágrafo 5º da CLT, restringe-se aos casos em que há manifestação do Excelso Supremo Tribunal Federal em controle concentrado da inconstitucionalidade da lei ou ato normativo ou de interpretação incompatível com a Constituição Federal, o que não é a hipótese em tablado, razão pela qual deve prevalecer a intangibilidade da coisa julgada."

No Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região foi formado um verbete, 08, no sentido da inconstitucionalidade do parágrafo 5º do artigo 884 da CLT e parágrafo único do artigo 741 do CPC, mesmo sem a declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal.

Na 15ª Região o Tribunal Regional do Trabalho de Campinas entende que:

"Ainda que se admita a constitucionalidade da Medida Provisória 2.180/01, que acrescentou o parágrafo 5º ao artigo 884 da CLT, para que se declare ineficaz o título executivo judicial é necessário que o executado comprove, de forma sólida, a alegada incompatibilidade do título com a Constituição Federal. (Ag. De petião 49047/04.)"

A Primeira Região tem o entendimento de que o Supremo Tribunal Federal não concluiu por declarar a inconstitucionalidade do dispositivo contido no parágrafo 5º do artigo 884 da CLT mas tem negado provimento a recursos quando não está demonstrada que a coisa julgada que deu origem ao título judicial ofendeu a qualquer dispositivo constitucional, (Arguição de Inconstitucionalidade 25645120105010000M RJ).

No Tribunal Superior do Trabalho encontramos alguns agravos de instrumento dos executados em que as revistas não foram admitidas por tratar a execução de matéria de legislação federal, ou seja, aplicação do artigo 884, parágrafo 5º da CLT, não havendo, assim, tese de mérito constitucional a respeito do tema (AIRR 243000920085110004).

No entanto, no Ag RR 185.700-86-2006.5.15.0134, relator ministro Alexandre Agra Belmonte, o TST aplicou o dispositivo do parágrafo 5º, do artigo 884 da CLT dizendo o acórdão na ementa:

"Agravo de Instrumento. Recurso de revista. Execução. Coisa julgada. Título executivo inexigível. Base de cálculo do adicional de insalubridade. Salário contratual. Nos termos de r. despacho do e. presidente e o excelso Pretório., fixando a inteligência do julgamento que ensejou a edição da súmula vinculante 4 – o adicional de insalubridade deve continuar sendo calculado com base no salário mínimo, enquanto não superada a inconstitucionalidade (art. 192 da CLT) por meio de lei ou convenção coletiva – reclamação 6266 DF). Nesse contexto, não poderia a Egrégia Corte Regional ter estabelecido outra base de cálculo para o adicional de insalubridade que não o salário mínimo. No presente caso, consta do título executivo o pagamento da diferença do mínimo. Correta a inexigibilidade do título com base no disposto no art. 884, parágrafo 5º da CLT Indene o art. 5º XXXVI da CF/88. Agravo de Instrumento não provido."

A doutrina trabalhista não tem enfrentado constantemente o tema sobre a relativização da coisa julgada, mas Manoel Antônio Teixeira Filho, em seu Curso de Direito Processual do Trabalho II, já assim se pronunciava:

"Com efeito, já nas primeiras edições do livro Ação Rescisória no Processo do Trabalho (São Paulo Ltr 4, ed. 2005) chamávamos a atenção ao fato de que o atributo da imutabilidade da coisa julgada – derivante da necessidade de estabilização das relações sociais e jurídicas – pressupunha que ela se houvesse formado em consonância com a ordem constitucional. Deste modo, fazer-se respeitar a autoridade e a imutabilidade da res iudicata implicava, ipso facto, defender-se a supremacia do texto constitucional. Invertendo o raciocínio, sustentávamos que quando a coisa julgada se formasse contra a Constituição, erla, longe de constituir um instrumento de pacificação das relações sociais e jurídicas, consistia, isto sim, um elemento de perturbação dessas mesmas relações, pois não apenas na mente do vencido pelo provimento jurisdicional, mas, sobretudo, na consciência coletiva, jamais se acomodaria a aceitação de prevalência da coisa julgada diante do texto constitucional por esta violado.."

Também Rodolfo Pamplona Filho e Tércio Souza, in "curso de Direito Processual do Trabalho" fls 622, entendem que:

"Mas há ainda a possibilidade de a parte suscitar a inexigibilidade do título como matéria de defesa contra a pretensão executiva. Com efeito, é possível que o direito pretendido esteja sob condição ou termo e à parte executada incumbirá sustentar a inexigibilidade do crédito, por não atenção àquelas condições.

Nesse mesmo sentido há que se pontuar que o título fundado em preceito reputado inconstitucional pelo STF pode ser inexigível a teor do artigo 884, parágrafo 5º da CLT, sendo o mesmo regime do CP ."

Verifica-se, assim, que o parágrafo 5º do artigo 884 da Consolidação das Leis do Trabalho está plenamente em vigor não sendo exigível o título judicial fundado em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal.

Poderá se alegar que as decisões atualmente transitadas em julgado e em execução são anteriores às decisões do Supremo Tribunal Federal que considerou a terceirização constitucional em qualquer atividade e que, portanto, não seriam a elas aplicável o referido parágrafo 5º.

É necessário, porém, entender que a Corte Suprema quando decidiu sobre a terceirização e sua constitucionalidade, não julgou uma matéria com reflexos para o futuro, pois nesse aspecto existe a própria lei 13.467/17 que regulamenta a terceirização em todas as atividades.

Não, o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal foi que o fenômeno da terceirização, considerado seu aspecto jurídico, nunca foi proibido em nenhuma atividade, ou seja, nem no presente, nem no passado, sendo que os Tribunais Trabalhistas condenaram ilegalmente a pagamentos indevidos, mediante teses contrárias a diversos princípios constitucionais.

Resta uma dúvida que deve ser enfrentada pois em muitos processos de execução já decorreu o prazo de impugnação nos embargos à execução, previsto no artigo 884 da Consolidação das Leis do Trabalho. Nesses casos, seria possível demonstrar a inconstitucionalidade do título executivo?

Não verifico jurisprudência sobre a tese , nem doutrina na área trabalhista. Porém, comentando o parágrafo 12 do artigo 525 do Código de Processo Civil, Teresa Arruda Alvim e outros, nos "Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil, fls 526, expressa que:

"Ao que parece algumas polêmicas envolvendo tal dispositivo continuarão vivas. Indaga-se, por exemplo: após o prazo para impugnação poderá ser alegado tal vício ou haverá preclusão? A nosso ver, tal vício não pode ser objeto de preclusão, de forma que poderá ser suscitado após findo o prazo para impugnação, em sede de ação rescisória ou mesmo ação declaratória de inexistência".

E certamente a matéria não é objeto de preclusão porque trata de manter-se a coisa julgada contra o texto constitucional, o que, ao meu ver, poderá ser, inclusive, decidido de ofício pelo magistrado uma vez que toda a estrutura de nosso direito é baseada na obediência à Constituição Federal.

Por tais razões é que entendo que os títulos judiciais fundados em decisões sobre a proibição de atividades na terceirização , por atentarem contra interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal de acordo com o Supremo Tribunal Federal, são inexigíveis se a execução se der após o trânsito em julgado da decisão do Supremo sobre a matéria, ou cabíveis de ação rescisória se anteriores ao referido trânsito em julgado.

Isto porque no julgamento da terceirização no STF, terminado no dia 30 de agosto , em que entendeu a Suprema Corte, com repercussão geral a validade da terceirização em todas as atividades, ficou constando do voto do relator da ADPF, ministro Roberto Barroso, que a tese não alcançaria a coisa julgada, a não ser mediante ação rescisória, sendo esclarecido pelo ministro Alexandre de Moraes que nos casos em que a coisa julgada atinge interesses futuros esses seriam efetivamente cancelados.

Considerou o ministro Luiz Fux , relator do Recurso Extraordinário, que os processos julgados antes da decisão do Supremo Tribunal Federal não poderão ser influenciados pela coisa julgada, especialmente com relação à sua inexequibilidade, mas serão passíveis de ação rescisória, conforme parágrafo 15 do artigo 525 do Código de Processo civil.

O prazo de rescisória, conforme artigo 525, parágrafo 15 do Código de Processo Civil, é o de dois anos, a partir do trânsito em julgado da decisão proferida no Supremo Tribunal Federal.

É certo que, da publicação do acórdão dessa decisão do STF haverá embargos de declaração para esclarecer alguns aspectos complexos dessa decisão, mas não há dúvida que sempre haverá a possibilidade de ação rescisória se a decisão, objeto de execução, for contrária a princípios constitucionais, e se ela tiver como base a súmula 331 do TST, cancelada pelo Supremo porque inconstitucional.

Concluo que, nos casos de execução, será sempre viável o cabimento da ação rescisória, no prazo de dois anos após o trânsito em julgado do acórdão da decisão da Suprema Corte, seja a coisa julgada anterior ou posterior à publicação do acórdão da decisão ora em destaque, bem como possível será a declaração de inexequibilidade do título executivo se executado após o trânsito em julgado do acórdão do Supremo Tribunal sobre a tese.

O dizer que a decisão não atinge a coisa julgada significa que ela continua existindo, embora possa ser objeto das ações próprias passíveis de sua rescisão, como ações declaratórias de inconstitucionalidade do título, se estiver preclusa a possibilidade de alegar sua inexigibilidade porque contrário à norma constitucional, ou entendimento da Suprema Corte, ou, ainda, mediante ação rescisória.

Nem é mesmo possível entender que o Supremo Tribunal Federal, em embargos de declaração, possa declarar a impossibilidade de rescisória, ou de inexequibilidade do título executivo, baseado em decisão inconstitucional, porque seria, certamente, manter decisões contrárias à Constituição, o que não se espera da Corte Suprema que zela pelo primado da Constituição no país.

__________

*José Alberto Couto Maciel é advogado e sócio do escritório Advocacia Maciel.

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