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Máquinas e inteligência artificial: O poder e o possível papel do direito

Além de influenciar em decisões políticas as inteligências artificiais já são criadas para uniformizar jurisprudências, para padronizar petições, como é o exemplo do Victor, um software que é resultado de uma iniciativa do Supremo Tribunal Federal.

23/8/2018

Em 1950 Isaac Azimov apresentava ao mundo o seu ideário tecnológico, os robôs. Por meio do livro "I, Robot"1, Azimov encontrou um meio de contar o que ele imaginava para o futuro e através da literatura previu muitas das máquinas e tecnologias que temos hoje. Porém, Azimov foi mais fundo, além de imaginar personas e personagens, ele cunhou o termo Robótica e criou as 3 leis da, hoje, inteligência artificial.

Para o autor as Leis da Robótica, são as regras básicas que embasam a convivência entre robôs e seres humanos, para que assim possam coexistir em harmonia. A primeira lei dita que um robô não pode ferir um ser humano ou, por ócio, permitir que um ser humano sofra algum mal, aqui pode-se observar que a vida do seu humano vale muito mais do que da máquina. A partir desta lei consegue-se traçar o objetivo de existência das tecnologias, servir o homem, sempre, em qualquer circunstância.

A segunda lei descreve que um robô deve obedecer às ordens que lhe sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei. Mais uma vez pode-se enxergar que a vida humana é, de toda e qualquer forma, indisponível. Na terceira lei está escrito que um robô deve proteger sua própria existência, desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira e Segunda Leis.

Algum tempo depois, a autor criou uma quarta lei, que denominou de Lei Zero, a qual diz: "Um robô não pode fazer mal à humanidade e nem, por inação, permitir que ela sofra algum mal".

Mesmo que não pareçam muito úteis e que estas leis estejam no campo da literatura elas são, de fato, levadas em consideração pelos estudiosos e pesquisadores da robótica e da inteligência artificial.

As leis criadas por Azimov são tão importantes que, por exemplo, os juramentos dos cursos de engenharia têm em seu trecho a seguinte frase "...prometo que, no cumprimento do meu dever de engenheiro, não me deixarei cegar pelo brilho excessivo da tecnologia, lembrando-me completamente de que trabalho para o bem do homem e não da máquina. Colocarei todo o meu conhecimento científico a serviço do conforto e desenvolvimento da humanidade...", que relembram ao homem a quem e para que as máquinas foram criadas.

Mas, nesse momento, é preciso atentar-se para o medo humano do descontrole, sabe-se que as inteligências são criadas e programadas pelo próprio homem, e mesmo assim, esse criador precisa se blindar de normas que o tornem sempre superior às suas criaturas, é nesse momento que o direito é invocado.

Quando se fala em novas tecnologias e principalmente em inteligências artificiais temos uma ruptura nas áreas humanas, e também, na jurídica.

É difícil prever o que poderá acontecer quando o desenvolvimento tecnológico evoluir ao ponto de proporcionar a criação de um robô tal qual Azimov imaginou, uma máquina que consiga superar e transcender as habilidades humanas por meio de uma avançada inteligência artificial. É difícil prever, mas talvez a humanidade não esteja tão longe assim, ou até já tenha chegado lá, mas os freios da ética e do bom senso o impedem de colocar tal tecnologia "nas ruas".

No cenário criado por Azimov as máquinas são humanoides, com feições e trejeitos humanos, que podem provocar mudanças de paradigmas e não se sujeitar mais às leis humanas, podendo estar, até mesmo, à frente do comando da sociedade.

No conto, Evidência, a penúltima narrativa do livro Eu, Robô, o autor nos apresenta ao candidato a prefeito Stephen Byerley que é acusado por seu rival de ser um robô disfarçado.

Como a população é, quase que em sua maioria, avessas à ascendência do mercado robótico, não há nada mais ultrajante e amedrontador do que ser governado por uma máquina. A acusação significaria, então, o fim da campanha de Stephen.

Nesse momento, a psicóloga roboticista dra. Calvin é chamada para averiguar a situação, pois, as evidências apontadas para acusar Byerley de ser um robô é a de que ele nunca foi visto comendo. A psicóloga começa então a investigar se Byerley é realmente um robô ou se a acusação é apenas uma estratégia com interesses políticos.

Distante? Eu diria que não muito...

A única grande diferença é de que as máquinas de Azimov tinham feições humanas, mas os reais, que estão entre nós, podem não possuir essas características, mas, estão igualmente servindo à interesses políticos, como foi o caso da eleição americana na qual foram utilizados o sistema "big data"2 e psicologia para segmentar os eleitores indecisos.

Aqui no Brasil, nas próximas eleições de outubro já se sabe que a utilização desse tipo de inteligência será muito presente. Em reportagem a um jornal mineiro, pesquisadores da FGV relataram que um exemplo da ação e presença de robôs foi em um dos primeiros embates políticos de 2018, durante o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Tribunal Regional Federal. A equipe de pesquisa registrou 1,2 milhão de menções em menos de 24 horas nas redes sociais, sendo que 35 mil interações foram disparadas por perfis automatizados, tanto prós como contra ao ex-presidente.3

Além de influenciar em decisões políticas as inteligências artificiais já são criadas para uniformizar jurisprudências, para padronizar petições, como é o exemplo do Victor, um software que é resultado de uma iniciativa do STF.4

Atualmente, de acordo com o site do STF, Victor está na fase inicial do projeto, e irá ler todos os recursos extraordinários que sobem para o referido Tribunal e, assim, identificar quais estão vinculados a temas de repercussão geral. A inteligência artificial ainda está na fase de construção de suas redes neurais para aprender a partir de decisões já proferidas a respeito da aplicação de diversos temas de repercussão geral.

Ou seja, as "máquinas" estão presentes seja para substituir o homem ou mais do que isso, para se passar por ele. Mas será que na chamada pós-humanidade será necessário criar o Direito para os robôs? Ou o Direito será o mesmo adaptado para ambas as formas de inteligência?

Para solucionar esses conflitos é preciso mais do que normativas jurídicas, é preciso enxergar esse mundo novo por meio de novas ideias, é preciso criatividade. Em tempos de padronização é preciso se destacar e fazer o diferente, afinal, o que nos diferencia das máquinas é justamente o poder de criar e inventar tal qual criou e inventou Isaac Azimov.

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1 I, Robot (em português Eu, Robô) é uma coletânea de contos escrita pelo russo Isaac Asimov, lançada em 2 de dezembro de 1950.

2 Big Data refere-se a um grande conjunto de dados armazenados.

3 Presença de robôs nas redes sociais deve influenciar eleições.

4 Inteligência artificial vai agilizar a tramitação de processos no STF.

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*Karlo Messa Vettorazzi é mestre em Direito Socioambiental, professor de Direito e Criatividade da FAE Centro Universitário. Editor do @direitoecriatividade.

*Julia de Mello Bottini mestranda em Direito Socioambiental, professora de fundamentos do direito na UNIFACEAR. Editora do @direitoecriatividade.

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