Embora um conceito simples de ágio possa ser caracterizado pela diferença entre o valor pago e o valor nominal de um título, as discussões que envolvem atualmente o uso do ágio são muito mais complexas do que às da década de 1980. Muito comum em operações de M&A (do inglês para Mergers & Acquisitions – fusões e aquisições), o chamado ágio de investimento (ou goodwill), chama muita atenção da administração tributária pelos impactos, da ordem dos bilhões de reais, que traz na tributação do lucro.
As demonstrações financeiras de uma empresa buscam demonstrar, em um período de 12 meses, o chamado exercício social, o tamanho de seu patrimônio, quais são seus bens e direitos, suas dívidas e obrigações, se dá lucro, dentre outras informações. Contudo, mesmo a mais apurada e fidedigna demonstração financeira não consegue demonstrar, com absoluta precisão, o patrimônio real de uma empresa, leia-se seu valor de mercado. Mais difícil ainda seria projetar esse valor de mercado para o futuro. Basta lembrar a quantidade de empresas que lideraram seus seguimentos e hoje nem sequer existem mais.
Até 2007, a forma de contabilização dos investimentos de uma empresa em outra(s) se dava pela Patrimônio Líquido Contábil ("PL – Contábil") que, como já adiantamos, na maioria das vezes não representa o "valor de mercado" da empresa investida. O patrimônio intangível (como o valor de sua marca) sequer constava no PL – Contábil. Se a empresa "A" adquirisse a empresa "B" por um valor maior do que o seu PL – Contábil, "A" contabilizava essa diferença como sendo o ágio da operação. Parece muito simples, imaginemos que a empresa "A" tenha adquirido por R$ 10 milhões a empresa "B", cujo PL – Contábil naquele momento era R$ 8 milhões, o "ágio" dessa operação seria, portanto, R$ 2 milhões e, dependendo do que ocorresse após à aquisição e que obedecidos alguns critérios temporais, o ágio pago era deduzido da base de cálculo dos tributos incidentes sobre o lucro da empresa investidora, Imposto de Renda (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). O ágio em discussão hoje me dia no CARF decorre, em sua grande maioria, das operações de M&A realizadas até 2007. Na visão dos auditores, o único objetivo dessas operações foi o de não pagar (ou pagar menos) impostos, pela falta de um "propósito negocial".
Com a publicação da lei 11.638, em 2007, e a introdução do International Financial Reporting Standars (IFRS) aos princípios contábeis brasileiros, as amortizações do ágio sofreram profunda alteração. Atualmente, não é mais possível amortizar o ágio na apuração do lucro e o patrimônio intangível deve estar contabilizado, ainda que pelo seu valor de custo. Os parâmetros para a contabilização dos investimentos de sociedades investidoras, com influência significativa nas sociedades investidas, deverão fazer uso da avaliação econômica do patrimônio líquido da investida ("PL a Valor Justo"), trazidos pelo pronunciamento técnico do Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC 15 – Combinação de Negócios (IFRS 3) e CPC 46 – Mensuração do Valor Justo (IFRS 13), do Comitê de Pronunciamentos Contábeis.
O ágio atual, portanto, não contempla mais o intangível, que foi solucionado pelo IFRS. O ágio nas operações de hoje envolve outros tipos de análises, como sinergias (redução de custos, aumento de capacidade produtiva, controle, etc.) bloqueio a novos concorrentes (fatia de mercado) dentre outras inúmeras variáveis, que a operação poderá trazer para a sociedade investidora.
Mesmo com as alterações trazidas pelo IFRS não é possível afirmar que as discussões bilionárias envolvendo as amortizações de ágio irão desaparecer, porém, tendem a diminuir, principalmente nas operações ocorridas após a lei 12.973, de 2014, que alterou a legislação tributária federal sobre IRPJ, CSLL e PIS/COFINS.
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