O Jornal O Globo publicou matéria no dia 21/3/18 sobre o aumento do número de profissionais médicos em atividade e a má distribuição dos mesmos para melhor atender a sociedade. As maiores concentrações estão nas capitais dos estados, com destaque para São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Em contrapartida, os estados do Norte e Nordeste contam com a menor distribuição por mil habitantes do país.
É importante acrescentar a essa discussão trazida pelo jornal um viés pouco falado no âmbito acadêmico e até mesmo em fóruns pautados pelos CRMs. Trata-se do necessário estudo jurídico por parte dos acadêmicos de medicina e dos médicos já formados.
Digo estudo jurídico que abrange o conhecimento do Código de Ética – disciplina já obrigatória -, o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto do Idoso, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, dentre outras normas e princípios do direito que farão parte do dia a dia desse profissional.
No mundo que vivemos, onde a informação é facilmente disseminada através das redes sociais, é fundamental que o estudante de medicina tenha o mínimo de conhecimento jurídico sobre a sua profissão e o impacto na sociedade.
A sua responsabilidade é objetiva ou subjetiva? O que pode e o que não pode fazer com o paciente e seus familiares? E terceiros envolvidos? O sigilo médico é pleno? E o respeito à morte digna, deve ser considerado? Devo fazer a transfusão de sangue em um paciente cuja crença está voltada para Testemunhas de Jeová?
Muitas profissões devem ser adequadas aos novos conceitos buscados pela sociedade, e a medicina certamente é uma que merece essa atenção pelo menos com um objetivo: fazer com que o estudante de medicina tenha maior conhecimento sobre os impactos periféricos que podem influenciar a aplicação do seu conhecimento técnico. E não digo só quanto à parte jurídica, mas também – e isso se aplica a outras profissões –, por exemplo, o lado econômico-financeiro da sua profissão, a gestão da sua carreira, dentre outros conhecimentos necessários que devem margear a técnica.
A notícia do aumento de médicos em nosso país é uma excelente conquista para a população – que hoje, segundo a reportagem, conta com 2,18 médicos para cada mil habitantes, frente a 2,3 no México e 2,7 no Canadá -, e pode ser ainda melhor se o ensino nas faculdades for acompanhado do conhecimento jurídico basilar para o exercício da profissão.
Em tempo que se discute a desjudicalização no país - que conta com mais de 100 milhões de processos judiciais – e o aumento do número de processos envolvendo profissionais da medicina, preparar e capacitar o profissional médico sobre os seus direitos e deveres, assim como dos seus pacientes, é uma forma de contribuir para uma sociedade menos litigiosa e de mais interlocução.
"Aos doentes tenha por hábito duas coisas – ajudar, ou pelo menos não produzir danos". Hipócrates
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*Alexandre Boccaletti é advogado especializado em Direito Médico e Saúde e Vice-Presidente da ABRAMGE RJ/ES.