A Varig e a bilionária destruição de valor
Jorge Queiroz*
Todos os que acompanham o setor aeronáutico, inclusive boa parte dos funcionários, sindicatos, fundos de pensão, fornecedores e credores da Varig, reconhecem que esta vem de um longo e ininterrupto processo econômico-financeiro degenerativo há mais de uma década, mais acentuadamente nos últimos cinco anos, sem lograr reverter o dramático quadro que atingiu seu apogeu recentemente quando, pasmos, assistimos sua quase paralisação geral - falência geral de seus órgãos.
A principal causa recai sobre a questão de gestão e governança. Os esforços empreendidos não devolveram a saúde econômico-financeira da empresa apesar do vultoso volume de recursos despendido com um sem-numero de consultorias nacionais e internacionais anos a fio (Alvarez and Marsal como a última empresa de reestruturação e a Deloitte como Administrador Judicial) e das várias alterações em sua diretoria (mais de 10).
O que teria faltado para que se concluísse em tempo hábil, há vários anos, que a melhor opção seria a alienação da empresa ou atração de novos investidores? Seus balanços financeiros demonstravam claramente que a empresa encontrava-se em queda livre com uma acelerada dilaceração de valor (patrimônio líquido negativo estimado de R$7.2 bi, endividamento de R$7.9bi, receita líquida de R$6.6bi e prejuízos de R$1.5bi em 2005). Porque razão deixar que se chegasse a uma recuperação liquidatória, com todas as características de uma falência, uma vez que já não detinha forças ou credibilidade suficientes para realizar uma recuperação real? O fato de haver apenas uma única parte interessada com algum capital para arrematar seus resquícios a valor residual, significativamente inferior ao preço mínimo estipulado de USD 860 milhões não deixa dúvidas quanto aos erros estratégicos cometidos.
O segundo aspecto é a questão universal do direito da substância versus a forma. A estrutura de Varig Nova e Varig Velha desenhada foi a forma encontrada para permitir a liquidação do negócio principal da empresa na tentativa de evitar os efeitos sucessórios trabalhistas e fiscais e a formalização da falência cujos componentes já se encontravam factualmente caracterizados e as respectivas cominações legais.
Denominar os ativos reais e legítimos dos credores de “ativos podres”, deixou todos atônitos, pois constitui uma violação aos direitos dos mesmos e confirma o temor dos investidores quanto à questão da segurança jurídica e os respectivos direitos dos credores nem sempre praticados no Brasil. Além disso, declarar que se a Varig quebrasse seria culpa de um de seus credores, argumento comumente adotado pelos dirigentes de empresas em fim de linha, é tentar de maneira inútil e malograda eximir-se de responsabilidade. É inegável que o tratamento dado aos stakeholders da Varig não observou alguns dos principais ditames da Nova Lei de Recuperação 11.101/05.
Por último, mas não menos importante, há um aspecto de extrema relevância sobre o qual não vimos qualquer menção e que não pode ser olvidado, que é o da aferição e imputação de responsabilidades, inclusive de realização de um trabalho forense para aferir eventuais irregularidades para a tomada das medidas legais cabíveis. Da mesma sorte, deve-se utilizar todo o material levantado e eventuais irregularidades praticadas para se realizar os ajustes regulatórios e legislativos apropriados para evitar que tragédias empresariais como esta voltem a ocorrer <_st13a_personname w:st="on" productid="em nosso País. O">em nosso País. O Judiciário nacional deve igualmente fazer uma reflexão quanto aos eventuais erros cometidos nesse emblemático caso, em sua qualidade de peça central e imparcial do processo recuperatório judicial.
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*Presidente do Instituto Brasileiro de Gestão e Turnaround (IBGT), especialista em recuperações de difícil solução
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