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Atuação cooperativa dos advogados e sua repercussão na fixação dos honorários sucumbenciais

Nesse contexto, seria possível correlacionar a atuação cooperativa do causídico com a fixação de sua verba sucumbencial? Entendemos que sim.

26/2/2018

O CPC/15 trouxe importantes alterações na parte relativa aos honorários sucumbenciais. Em linhas gerais, os parágrafos do art. 85 encampam alguns entendimentos jurisprudenciais sedimentados na vigência do CPC/731, esclarecem questões de ordem prática2 e autorizam a fixação de honorários sucumbenciais recursais3.

Além disso, em boa hora, o legislador previu – diferentemente do diploma revogado – que, mesmo nas causas em que "não houver condenação" (art. 20, § 4º, CPC/73), deverá o juiz fixar a verba sucumbencial entre o percentual mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º). O código é claro ao estabelecer que os limites e critérios ali previstos "aplicam-se independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito" (art. 85, § 6º).

Portanto, com exceção daqueles casos envolvendo a Fazenda Pública (em que há regramento próprio – art. 85, §§§ 3º a 5º), de processos em que o proveito econômico for inestimável ou irrisório, ou o valor da causa for muito baixo (hipótese em que a fixação da verba sucumbencial deve ser feita de forma equitativa – art. 85, § 8º), do processo de execução e de alguns procedimentos especiais (que possuem normas específicas4), o julgador deverá fixar os honorários dentro da moldura de dez a vinte por cento.

Quanto aos critérios para a definição do respectivo percentual, não houve alterações. Permanecem os mesmos standards: grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço.

É com base nesses critérios que o julgador deve fundamentar e justificar o percentual da verba sucumbencial (arts. 93, IX, da Constituição Federal e 11 e 489, § 1º, CPC/15).5

Pois bem, assentadas tais premissas, propõe-se uma questão para reflexão: a atuação cooperativa dos advogados pode repercutir na fixação da verba sucumbencial?

Como se sabe, o artigo 6º do CPC/15 estabelece que todos os sujeitos processuais devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.6

Nesse contexto, seria possível correlacionar a atuação cooperativa do causídico com a fixação de sua verba sucumbencial? Entendemos que sim.

Apesar da cooperação – norma estruturante do processo civil – não estar expressamente prevista nos incisos I a IV do § 2º do art. 85, ali estão estampados alguns conceitos jurídicos indeterminados que se conectam à atividade colaborativa.

Por exemplo, no que tange ao "grau de zelo do profissional", entendemos que o juiz, além de analisar se o causídico tutelou de forma devida os interesses de seu cliente, poderia avaliar se o mesmo cooperou para a entrega de uma prestação jurisdicional célere (arts. 4º e 6º) e eficiente (art. 8º). Ou seja, o seu "grau de zelo" com a própria jurisdição. Afinal, como pontuam Dierle Nunes e Alexandre Bahia, todos devem cooperar para "o resultado final".7

Nesse particular, entendemos que o advogado que propõe demanda ignorando a existência das chamadas cláusulas de paz; apresenta petições ineptas ou ininteligíveis; destrata colegas, partes e serventuários da justiça; interpõe recursos destituídos de fundamento; revolve teses jurídicas já definidas em precedentes qualificados, sem fazer o distinguishing; retarda o processo com o recolhimento equivocado de custas; provoca dilações de prazo sem necessidade; entre outros, não age, evidentemente, de forma zelosa e cooperativa, expondo, ainda, seu cliente às penas por litigância de má-fé.

Por outro lado, aquele advogado que estimula os métodos adequados de resolução de conflitos (art. 3º, § 3º, do CPC/15); indica precedentes vinculativos em suas petições, explicando de forma objetiva sua incidência no caso concreto; se preocupa em delimitar as questões controvertidas facilitando o saneamento pelo juiz8; não intervém em depoimentos sem autorização (art. 361, parágrafo único); cumpre seus prazos regularmente, entre outros, atua com zelo e espírito colaborativo.

Sob outro prisma, em relação à expressão "trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço", pensamos que o juiz poderia considerar não apenas a atuação do causídico no âmbito do processo judicial, mas também na esfera pré-processual.

Explica-se.

Vamos imaginar, por exemplo, que um advogado, antes de judicializar a questão, proponha uma mediação extrajudicial ou tente buscar um acordo, formalizando suas tentativas por e-mail ou mesmo sugerindo reuniões. E que, mesmo não sendo possível a autocomposição, ainda resolva enviar uma notificação extrajudicial franqueando ao futuro adversário uma última oportunidade para a composição consensual.

Ora, por que não considerar esse trabalho do advogado e o tempo dedicado ao tema (objeto da futura ação) no momento de fixação dos honorários na fase judicial? Por que não prestigiar condutas colaborativas pré-processuais, quando a demanda for patrocinada pelo mesmo causídico (ou pela sociedade da qual faz parte) que se ocupou do assunto na fase extrajudicial?

Claro que, para a definição do percentual de honorários, o juiz deve levar em consideração todos os critérios legais (previstos no § 2º do art. 85, CPC/15), mas o que estamos propondo é a releitura de alguns conceitos ali indicados, à luz da cooperação.9 O que se pretende, em última análise, é premiar condutas colaborativas.

Essa lógica10, ao menos em tese, também teria o condão de fomentar uma atuação mais cooperativa dos advogados das partes durante toda a marcha processual. Sim, porque como os honorários não podem mais ser compensados (art. 85, § 14), o juiz, em caso de sucumbência recíproca, – se constatada a atuação colaborativa dos causídicos11 e observados os demais requisitos legais –, poderia aplicar, de forma fundamentada, um percentual acima do mínimo legal para cada profissional, ou mesmo de forma individualizada à luz da atuação de cada um.

Em suma, é preciso avançar, ainda que timidamente, em direção a uma interpretação mais consentânea com os vetores estruturantes do processo civil contemporâneo.
___________________

1 Como, por exemplo, a natureza alimentar dos honorários, a fluência dos juros moratórios a partir do trânsito em julgado da decisão, a aplicação do princípio da causalidade, o reconhecimento de que a verba pertence aos advogados, e não à parte, entre outros.

2 Possibilidade de pagamento dos honorários em favor da sociedade de advogados que integra na qualidade de sócio

3 Art. 85, § 11.

4 Por exemplo, art. 701 do CPC/15.

5 Embora alguns juízes insistam, mesmo depois do CPC/15, em fixar genericamente os percentuais, sem motivar o patamar escolhido. São inúmeras as decisões nesse sentido. Vide, a propósito, a sentença proferida por magistrada carioca no processo 0168163-76.2016.8.19.0001 em 24.10.2017.

6 Para uma análise mais vertical do tema, sugerimos o nosso MAZZOLA, Marcelo. Tutela Jurisdicional Colaborativa: a cooperação como fundamento autônomo de impugnação. CRV: Curitiba, 2017.

7 NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Processo e República: uma relação necessária. Disponível em: <clique aqui>. Acesso em 07.02.18.

8 Como destacam Humberto Dalla e Tatiana Alves, a cooperação não é apenas agir com boa-fé. Na sua percepção, agir com boa-fé significa se abster de incidir em alguma das condutas tipificadas como atos de improbidade processual, enquanto que agir de forma colaborativa pressupõe uma conduta proativa. “É um fazer quando o agente poderia, simplesmente, se omitir.” PINHO, Humberto Dalla Bernardina de; ALVES, Tatiana Machado. A cooperação no novo Código de Processo Civil: desafios concretos para sua implementação. Revista Eletrônica de Direito Processual –REDP. Vol. 15. Janeiro a Junho de 2015, p. 252.

9 Como lembra Fredie Didier, a exigência de cooperação na órbita processual “não é um fato isolado no universo jurídico; antes é um corolário das transformações pelas quais passou o direito positivo durante o século XX, notadamente o reforço da ética das relações jurídicas”. DIDIER JR., Fredie. Fundamentos do Princípio da Cooperação no Direito Processual Civil Português. Coimbra: Coimbra, 2010, p. 102

10 Também aplicável quando o juiz tiver que fixar os honorários sucumbenciais por equidade.

11 Além das condutas já citadas, outros exemplos de atuação conjunta – e colaborativa – dos advogados das partes são a delimitação consensual das questões de fato e de direito, a ser homologada pelo juiz, para o julgamento da causa (art. 357, § 2º, do CPC), e a distribuição diversa do ônus da prova por convenção processual (art. 373, § 3º), que inclusive pode ser realizada antes do processo.
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*Marcelo Mazzola é sócio do escritório Dannemann Siemsen Advogados. Mestre em Direito Processo Civil pela UERJ e vice-presidente de Propriedade Intelectual do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA).

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