Migalhas de Peso

Aspectos previdenciários da Reforma Trabalhista

A Reforma Trabalhista muito possivelmente provocará um decréscimo arrecadatório.

25/8/2017

No último dia 17 de julho de 2017, o Presidente da República, Michel Temer, sancionou a lei 13.467 ("lei 13.467/17" ou "Reforma Trabalhista"), que alterou diversos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho ("CLT").

Na contramão da lei 13.419/17 ("Lei das Gorjetas"), que produziu um incremento no recolhimento de contribuições previdenciárias para bares e restaurantes, e do decreto 9.101/17, que aumentou a alíquota do PIS/COFINS incidente sobre a gasolina, o diesel e o etanol, a Reforma Trabalhista muito possivelmente provocará um decréscimo arrecadatório.

Confiram-se, nesse sentido, as alterações dos artigos 457 e 458 da CLT:

Art. 457.

(...)

§ 1o Integram o salário a importância fixa estipulada, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador.

§ 2o As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.

(...)

§ 4o Consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.

Art. 458.

(...)

§ 5o O valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio ou não, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares, mesmo quando concedido em diferentes modalidades de planos e coberturas, não integram o salário do empregado para qualquer efeito nem o salário de contribuição, para efeitos do previsto na alínea q do § 9o do art. 28 da lei 8.212, de 24 de julho de 1991.

O impacto de maior relevância nos parece que será a exclusão dos prêmios da remuneração e, consequentemente, da base de cálculo da contribuição previdenciária.

Isto porque muitas empresas possuem suas políticas de remuneração estruturadas de forma a pagar um salário fixo mensal, acrescido de um "prêmio", normalmente atrelado às vendas e/ou desempenho do empregado.

Considerando que o prêmio, atualmente, é comumente pago com habitualidade, é bastante comum que as empresas efetuem os recolhimentos previdenciários sobre o valor pago a esse título.

A Reforma Trabalhista é taxativa ao excluir tais valores da remuneração dos empregados e é igualmente taxativa ao dizer que "não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciária".

Fala-se numa possível migração de remunerações estruturadas em "salário acrescido de comissões", para "salário acrescido de prêmios", justamente com o intuito de diminuir o alto valor das contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de pagamentos.

Com relação às demais verbas, quais sejam: (i) ajuda de custo; (ii) auxílio-alimentação; (iii) diárias para viagem; e (iv) assistência médica ou odontológica, acredita-se que o impacto seja menor, ao menos para fins arrecadatórios, pois são parcelas que, em sua imensa maioria, já não são tratadas como não passíveis de incidência de contribuições previdenciárias pelas empresas.

Em verdade, a nova redação trará uma maior segurança aos contribuintes, que muitas vezes são autuados por fornecerem planos de saúde em modalidades diferentes para os empregados, ou mesmo por não estar devidamente inscritos no PAT – questões estas que tendem a ser superadas com a nova redação do dispositivo legal.

Outra alteração que possivelmente impactará os cofres da União Federal de maneira negativa se encontra na forma de negociação da participação nos lucros ou resultados da empresa ("PLR").

É bem verdade que o artigo 3º da lei 10.101/00 já prevê, de forma taxativa, que "A participação de que trata o art. 2º não substitui ou complementa a remuneração devida a qualquer empregado, nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista, não se lhe aplicando o princípio da habitualidade".

Entretanto, o artigo 2º exige que a PLR seja "objeto de negociação entre a empresa e seus empregados", através de comissão paritária, acordo ou convenção coletiva.

Na prática, os Sindicatos exigem que os acordos de PLR sejam negociados para todos os empregados. Ainda, a maioria das empresas acaba por pagar bônus aos altos executivos, justamente para evitar ter que informar e negociar com os Sindicatos os salários dos altos executivos.

Com a Reforma Trabalhista, empregados com curso superior e remuneração acima de R$ 11.602,20, valor correspondente ao dobro do teto dos benefícios previdenciários, poderão negociar acordos de PLR diretamente com os seus empregadores.

Nesse sentido, confiram-se os artigos 444, parágrafo único e 611-A, XV:

Art. 444.

(...)

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social."

"Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:

(...)

XV - participação nos lucros ou resultados da empresa"

Acredita-se, com isso, que os bônus, anteriormente pagos com incidência de contribuições previdenciárias, passem a ser pagos a título de PLR, já que os altos executivos poderão negociar diretamente com as empresas as metas e valores, o que certamente também produziria uma diminuição na arrecadação.

Por fim, cumpre destacar que apenas a alínea "q" do § 9º do art. 28 da lei 8.212, de 24 de julho de 1991 foi taxativamente alterada pela Reforma Trabalhista, o que certamente produzirá embates entre a fiscalização e os contribuintes, já que as alíneas "b"; "c"; "d.7"; "g"; "h"; "j"; "m"; "r"; e "t"1 também sofrerão impactos decorrentes das alterações introduzidas.

Em suma, a Reforma Trabalhista, sem dúvidas, deve gerar uma redução de recolhimentos previdenciários. Cumpre destacar que o Presidente Michel Temer prometeu, como garantia para aprovação, a edição de Medida Provisória que alterará pontos polêmicos da lei. Resta saber se a Medida Provisória alterará os dispositivos citados, bem como qual será o posicionamento da fiscalização sobre os temas aqui tratados.

__________

1 Art. 28. (...)

§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
a) os benefícios da previdência social, nos termos e limites legais, salvo o salário-maternidade;
b) as ajudas de custo e o adicional mensal recebidos pelo aeronauta nos termos da Lei nº 5.929, de 30 de outubro de 1973;
c) a parcela "in natura" recebida de acordo com os programas de alimentação aprovados pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, nos termos da Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976;
d) as importâncias recebidas a título de férias indenizadas e respectivo adicional constitucional, inclusive o valor correspondente à dobra da remuneração de férias de que trata o art. 137 da Consolidação das Leis do Trabalho-CLT;
e) as importâncias:
1. previstas no inciso I do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
2. relativas à indenização por tempo de serviço, anterior a 5 de outubro de 1988, do empregado não optante pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço-FGTS;
3. recebidas a título da indenização de que trata o art. 479 da CLT;
4. recebidas a título da indenização de que trata o art. 14 da Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973;
5. recebidas a título de incentivo à demissão;
6. recebidas a título de abono de férias na forma dos arts. 143 e 144 da CLT;
7. recebidas a título de ganhos eventuais e os abonos expressamente desvinculados do salário;
8. recebidas a título de licença-prêmio indenizada;
9. recebidas a título da indenização de que trata o art. 9º da Lei nº 7.238, de 29 de outubro de 1984;
f) a parcela recebida a título de vale-transporte, na forma da legislação própria;
g) a ajuda de custo, em parcela única, recebida exclusivamente em decorrência de mudança de local de trabalho do empregado, na forma do art. 470 da CLT;
h) as diárias para viagens, desde que não excedam a 50% (cinqüenta por cento) da remuneração mensal;
i) a importância recebida a título de bolsa de complementação educacional de estagiário, quando paga nos termos da Lei nº 6.494, de 7 de dezembro de 1977;
j) a participação nos lucros ou resultados da empresa, quando paga ou creditada de acordo com lei específica;
l) o abono do Programa de Integração Social-PIS e do Programa de Assistência ao Servidor Público-PASEP;
m) os valores correspondentes a transporte, alimentação e habitação fornecidos pela empresa ao empregado contratado para trabalhar em localidade distante da de sua residência, em canteiro de obras ou local que, por força da atividade, exija deslocamento e estada, observadas as normas de proteção estabelecidas pelo Ministério do Trabalho;
n) a importância paga ao empregado a título de complementação ao valor do auxílio-doença, desde que este direito seja extensivo à totalidade dos empregados da empresa;
o) as parcelas destinadas à assistência ao trabalhador da agroindústria canavieira, de que trata o art. 36 da Lei nº 4.870, de 1º de dezembro de 1965;
p) o valor das contribuições efetivamente pago pela pessoa jurídica relativo a programa de previdência complementar, aberto ou fechado, desde que disponível à totalidade de seus empregados e dirigentes, observados, no que couber, os arts. 9º e 468 da CLT;
q) o valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, despesas médico-hospitalares e outras similares, desde que a cobertura abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa;
r) o valor correspondente a vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos ao empregado e utilizados no local do trabalho para prestação dos respectivos serviços;
s) o ressarcimento de despesas pelo uso de veículo do empregado e o reembolso creche pago em conformidade com a legislação trabalhista, observado o limite máximo de seis anos de idade, quando devidamente comprovadas as despesas realizadas;
t) o valor relativo a plano educacional que vise ao ensino fundamental e a cursos de capacitação e qualificação profissionais vinculados às atividades desenvolvidas pela empresa, desde que todos os empregados e dirigentes tenham acesso ao mesmo;
t) o valor relativo a plano educacional que vise à educação básica, nos termos do art. 21 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e a cursos de capacitação e qualificação profissionais vinculados às atividades desenvolvidas pela empresa, desde que não seja utilizado em substituição de parcela salarial e que todos os empregados e dirigentes tenham acesso ao mesmo;
t) o valor relativo a plano educacional, ou bolsa de estudo, que vise à educação básica de empregados e seus dependentes e, desde que vinculada às atividades desenvolvidas pela empresa, à educação profissional e tecnológica de empregados, nos termos da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e:
1. não seja utilizado em substituição de parcela salarial; e
2. o valor mensal do plano educacional ou bolsa de estudo, considerado individualmente, não ultrapasse 5% (cinco por cento) da remuneração do segurado a que se destina ou o valor correspondente a uma vez e meia o valor do limite mínimo mensal do salário-de-contribuição, o que for maior;
u) a importância recebida a título de bolsa de aprendizagem garantida ao adolescente até quatorze anos de idade, de acordo com o disposto no art. 64 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990;
v) os valores recebidos em decorrência da cessão de direitos autorais;
x) o valor da multa prevista no § 8º do art. 477 da CLT.
y) o valor correspondente ao vale-cultura.

__________

*André Rodrigues Schioser é advogado do escritório Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima Advogados.

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