Disputas em torno do direito de manutenção do ex-empregado demitido sem justa causa ou aposentado no plano de saúde oferecido por sua ex-empregadora, com base na Lei dos Planos de Saúde, continuam inundando o Judiciário. Muito se ouve falar sobre a discussão do valor da mensalidade a ser paga pelos ex-empregados nesses casos e, sem dúvida, esse ponto é bastante relevante, pois, mais do que o seu mero cálculo, envolve questões de ordem social, previdenciária, regulatória e econômica.
Contudo, antes de mais nada, é preciso verificar se o ex-empregado faz ou não jus a esse direito. Para tanto, é preciso verificar se ele contribuía para o custeio do plano de saúde, requisito indispensável para desfrutar desse direito, conforme expressamente estabelece a Lei de Planos de Saúde.
Diante do impasse quanto à interpretação do requisito da contribuição, já em 2011, a Agência Nacional de Saúde Suplementar ("ANS"), após contar com a participação da sociedade, representantes do setor, das empresas e dos consumidores, editou a Resolução Normativa 279, que definiu contribuição como qualquer valor pago pelo empregado, inclusive com desconto em folha de pagamento, para custear parte ou a integralidade do plano de saúde.
Dessa forma, indiscutível que o exercício do direito de extensão do plano de saúde pós-emprego está condicionado à contribuição do ex-empregado enquanto na ativa, que consiste na participação financeira do ex-empregado para o custeio do plano. Logo, o ex-empregado que teve seu plano de saúde 100% custeado pela ex-empregadora não faz jus ao benefício.
Apesar disso, inúmeros julgados dos Tribunal Estaduais vinham concedendo o direito mesmo nos casos em que a empresa custeava 100% do plano de saúde, ou seja, quando não havia a contribuição do ex-empregado. A fundamentação era de que o requisito da contribuição seria dispensável, pois o plano de saúde teria natureza de salário ou, ainda, que a coparticipação seria equiparada à contribuição.
Mais recentemente, contudo, essa matéria foi apreciada e julgada pelo Superior Tribunal de Justiça ("STJ"), prevalecendo entendimento contrário ao que vinha sendo adotado pelos Tribunais Estaduais. Nesses precedentes proferidos pelo STJ nos Recursos Especiais 1.592.581/SP, 1.608.346/SP e 1.594.346/SP restou clara a posição da Corte de que a contribuição é indispensável para assegurar ao ex-empregado o direito de permanecer no plano de saúde que era oferecido pela sua ex-empregadora.
A esse propósito, no REsp 1.592.581/SP, a ministra Nancy Andrighi enfatiza que a contribuição deve ser interpretada como o valor pago pelo empregado para o plano de saúde, conforme já havia sido definido pela ANS. E, nos recursos 1.608.346/SP e 1.594.346/SP, os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Luis Felipe Salomão reforçam que contribuir para o plano é pagar uma mensalidade. Ademais, os Ministros ratificam a aplicação da expressa disposição legal do artigo 458, inciso IV, §2º da Consolidação das Leis do Trabalho ("CLT") de que o plano de saúde não se considera salário, pois é um benefício concedido pelas empresas com o intuito de garantir a assiduidade, a eficiência e a produtividade dos empregados. Igualmente, afastam a tese de que a contribuição para o plano de saúde seria dispensável, visto que esse benefício configuraria salário indireto.
Outra questão relevante elucidada pelo STJ é a diferença entre coparticipação e contribuição, validando a regulamentação da ANS existente. A coparticipação é um fator moderador que busca estimular o uso consciente do plano de saúde, inibindo o uso abusivo dos serviços de assistência à saúde. Quando há coparticipação, o empregado paga um percentual da consulta, exame e/ou procedimento. A contribuição, por sua vez, é um valor pago pelo empregado, descontado na folha de pagamento, para custear parte do plano de saúde coletivo empresarial oferecido pela empresa.
O esclarecimento desses conceitos jurídicos relacionados à aplicação e interpretação da Lei de Planos de Saúde protegem o próprio consumidor que, muitas vezes, é ludibriado com a promessa de que o Poder Judiciário lhe assegurará um suposto direito que, na verdade, é contrário à lei.
Por fim, esses precedentes do STJ sinalizam que, além do direito do ex-empregado ou aposentado à manutenção do plano de saúde pós emprego, zelou-se pela segurança jurídica e cumprimento da Lei de Planos de Saúde em prol não só das operadoras de assistência de saúde, mas também dos empregadores que financiam os planos coletivos empresariais. Isso definitivamente contribui para a sustentabilidade do setor de saúde suplementar no país.
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*Théra van Swaay De Marchi é sócia da área contenciosa, com ênfase em saúde suplementar do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Luciana Mayumi Sakamoto é associada da área contenciosa, com ênfase em saúde suplementar do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Camilla Fernandes Cardoso Marcellino é associada da área contenciosa, com ênfase em saúde suplementar do escritório Pinheiro Neto Advogados.
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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