Migalhas de Peso

Honorários advocatícios e o novo Código de Processo Civil

Breves apontamentos sobre o instituto e sua disciplina legal no CPC/2015.

8/5/2017

Os honorários advocatícios nada mais são do que a contraprestação devida ao advogado pela execução dos seus serviços profissionais. No decorrer do tempo, a temática já foi alvo de amplas discussões pela doutrina e jurisprudência, que resultaram nas mais diversas alterações, tanto de ordem interpretativas, quanto materiais.

Levando em consideração a extrema relevância da matéria e a sua relação com o exercício da advocacia, faz-se imperiosa a análise da evolução de sua disciplina em nosso ordenamento jurídico, tendo em vista que o novo Código de Processo Civil também trouxe consigo expressivas modificações a respeito deste tema.

Em seu Capítulo II – Dos Deveres das Partes e de Seus Procuradores, na Seção III – Das Despesas e das Multas, o CPC/73 já previa a figura dos honorários advocatícios, estabelecendo-os como uma espécie de despesa processual, que deveria ser paga ao fim da demanda pela parte vencida à parte vencedora.

Mais tarde, o Estatuto da Advocacia e da OAB, dedicando o seu capítulo VI exclusivamente aos honorários advocatícios, estabeleceu em seus artigos 22 e 23, respectivamente, que além dos honorários convencionados, os devidos ao fim da demanda pela parte sucumbente também são um direito privativo dos advogados, consistindo em espécie de verba remuneratória, rompendo com o conceito de verba de despesa disposto no Código Buzaid.

Conforme mencionado, diversas questões relacionadas aos honorários já haviam sido alvo de reiteradas discussões em todos os tribunais do país, a exemplo da sua natureza jurídica, que na oportunidade do julgamento histórico do Recurso Extraordinário nº 146318/SP em 13 de dezembro de 1996, o STF decidiu ser alimentar:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. PAGAMENTO NA FORMA DO ART. 33, ADCT. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS: CARÁTER ALIMENTAR. ADCT, ART. 33. I. Os honorários advocatícios e periciais têm natureza alimentar. Por isso, excluem-se da forma de pagamento preconizada no art. 33, ADCT. II. R.E. não conhecido1.

O Superior Tribunal de Justiça também fixou diversos entendimentos acerca de matérias envolvendo os honorários advocatícios, tais como: a possibilidade de serem devidos na fase de cumprimento de sentença, conforme o julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.134.1862, que mais tarde originou a súmula nº 5173; a hipótese de seu levantamento pela sociedade de advogados da qual o patrono faz parte, consoante a decisão proferida no julgamento do Recurso Especial 552710/DF4; dentre outras.

O Código de Processo Civil de 2015 atentou-se especialmente aos honorários advocatícios, instituindo previsão legal à alguns desses entendimentos já cristalizados pelos tribunais superiores, bem como pacificando antigas controvérsias relacionadas ao tema.

O novel diploma legal, igualmente rompendo com o instituído no Código Buzaid, ratificou o posicionamento dos artigos 22 e 23 do EAOAB, positivando expressamente no caput do seu artigo 85 que “a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”, o § 14 do mesmo dispositivo também corrobora com esse entendimento, instituindo que “os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação trabalhista”. Dessa forma, o CPC/2015 também pacificou uma antiga discussão a respeito da natureza jurídica dos honorários.

Sob o ponto de vista de Scarpinella Bueno5, os honorários advocatícios podem ser divididos em três espécies: convencionados, arbitrados e sucumbenciais.

A primeira espécie diz respeito aos honorários ajustados entre as partes e seus patronos no momento anterior ao ajuizamento da demanda. O Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, no caput do seu artigo 25, determina que esses honorários, como o próprio nome já sugere, devem ser convencionados contratualmente, em conjunto de todas as suas especificações e formas de pagamento.

Mais adiante, já no que diz respeito à fixação do valor dos honorários, o artigo 36 do EAOAB estabelece que os causídicos devem sempre agir com moderação, levando ainda em consideração: sua competência, renome e habitualidade com a matéria, o trabalho dispendido, a complexidade das questões, o valor da causa, o lugar da prestação dos serviços, dentre alguns outros parâmetros.

A segunda espécie compreende os honorários fixados por arbitramento judicial, quando não houve um consenso na sua fixação entre o causídico e o seu cliente no instante prévio à propositura da demanda. Nessa hipótese, segundo o artigo 22, §2º do EAOAB, cabe ao juiz determinar o quantum debeatur correspondente aos honorários devidos pelo constituinte, sempre se atendo aos valores estabelecidos na tabela de honorários organizada pela OAB.

Ressalta-se que caso o arbitramento e/ou a cobrança judicial dos honorários advocatícios façam-se necessárias, o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil determina em seu artigo 43 que “deve o advogado renunciar ao patrocínio da causa, fazendo-se representar por um colega”.
Por fim, a terceira e última espécie, consiste nos honorários fixados pelo juiz ao final da demanda, resultantes da atuação processual do causídico, sendo devidos ao mesmo pela parte perdedora. O CPC/73 dispunha a forma como esses honorários deviam ser arbitrados nos §§ 3º e 4º do seu artigo 20, qual seja:

Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.
[...]
§ 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos:
a) o grau de zelo do profissional;
b) o lugar de prestação do serviço;
c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
§ 4º Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior.

Como pode se denotar, as únicas exceções ao arbitramento de honorários advocatícios na faixa de dez a vinte por cento sobre o valor da condenação se davam: nas causas de pequeno valor, hipótese na qual era defeso ao julgador arbitrar honorários acima do percentual de vinte por cento; de valor inestimável; contra a Fazenda Pública, caso em que a jurisprudência dominante orientava os julgadores a evitarem o arbitramento no percentual máximo e, eventualmente, permitia-os a fixar honorários abaixo dos dez por cento mínimos; e ainda nas ocasiões em que não houvesse condenação, à exemplo das sentenças terminativas, declaratórias, constitutivas, nas execuções, dentre outras.

Em todas essas circunstâncias, cabia ao julgador da causa utilizar-se de uma apreciação equitativa, baseada nos parâmetros fixados nas alíneas contidas no § 3º do artigo 20 do CPC/73.

Ao prever no seu artigo 85, § 2º que: “os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa”, o CPC/2015 estabelece parâmetros mais objetivos para o arbitramento dos honorários. O artigo 20, § 8º, do novel diploma legal, restringe a hipótese de fixação dos honorários por apreciação equitativa do julgador apenas aos casos em que “for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo”.

Ainda tratando da mesma espécie de honorários, o CPC/2015 revogou a súmula 453 do STJ6, que vedava o ajuizamento de uma ação autônoma para cobrança dos honorários advocatícios omitidos na sentença transitada em julgado, dispondo no seu artigo 85, § 18 que “caso a decisão transitada em julgada seja omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor, é cabível ação autônoma para a sua definição e cobrança”.

No artigo 85, § 1º, o novo Código de Processo Civil prevê expressamente todas as hipóteses em que são devidos os honorários advocatícios, quais sejam:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 1o São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.

Diferentemente do artigo 34 do CPC/73, que obstante à sentença, só determinava serem devidos os honorários advocatícios nos casos de reconvenção, oposição e ação declaratória incidental, o CPC/2015 inovou, prevendo expressamente, além das referidas hipóteses, a fase de cumprimento de sentença, execução, bem como os recursos interpostos, de forma cumulativa. No seu artigo 520, § 2º, o referido códex também prevê o cabimento de honorários sucumbenciais em sede de execução provisória.

A possibilidade de majoração dos honorários advocatícios no caso de interposição de recursos, ressalvando-se que a soma dos honorários arbitrados em primeiro e demais graus sempre seja limitada ao máximo de vinte por cento, contida no aludido dispositivo representa uma das novidades mais significativas trazidas pelo novo CPC.

A questão dos honorários sucumbenciais em face da Fazenda Pública também recebeu profundas alterações pelo novo Código de Processo Civil, já que durante a vigência do CPC/73, acabava dando-se certa margem para o aviltamento dos honorários sucumbenciais devidos à parte que venceu a Fazenda Pública, tendo em vista que cabia ao julgador fixa-los por meio de uma apreciação equitativa.

Ao estabelecer uma tabela com percentuais exponenciais a depender do proveito econômico obtido e, alternativamente listar uma série de critérios estritamente objetivos a serem analisados pelo julgador nas hipóteses em que não haja condenação principal ou não seja possível determinar o proveito econômico para a fixação dos honorários, o CPC/15 aparentemente pôs fim à problemática.

Ainda nessa esteira, os advogados públicos, defensores dos interesses da Fazenda Pública, também foram contemplados pelas inovações trazidas pelo novo CPC, considerando que seu artigo 85, § 19 dispõe expressamente que “os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência nos termos da lei”, obstando quaisquer discussões a respeito de sua legitimidade para tal.

O Código Buzaid, em seu artigo 21, também previa a compensação dos honorários advocatícios nos casos de sucumbência recíproca das partes, hipótese na qual seriam “proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas”. Essa previsão ainda deu origem à súmula 306 do STJ, dispondo que “os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte”.

Com o advento do EAOAB e a consequente alteração na titularidade e natureza dos honorários advocatícios, que passaram a ser devidos ao patrono, e não mais à parte vencedora da demanda, tanto o artigo 21 do CPC/73, quanto a súmula 306 do STJ, acabavam por impor uma compensação entre créditos e débitos de credores e devedores distintos, violando expressamente o disposto no artigo 368 do Código Civil, que por sua vez, determina que “se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem”.

O novo Código de Processo Civil, pôs fim a essa controvérsia vedando expressamente a compensação de honorários advocatícios na hipótese de sucumbência recíproca, adequando-se ao disposto no Código Civil de 2002.

O CPC/2015 também prevê expressamente no artigo 85, § 15, a possibilidade da cobrança de honorários sucumbenciais pela sociedade de advogados da qual o advogado do credor faça parte, positivando o entendimento já consolidado pelo STJ.

Conforme pode se auferir, o novo Código de Processo Civil, trouxe uma série de extensas modificações à sistemática dos honorários advocatícios, rescindindo com diversas das disposições já consagradas pelo CPC/73 e/ou pela jurisprudência à sua luz, que por sua vez, não se faziam mais condizentes à realidade processual contemporânea.

Tais alterações se mostram profundamente pertinentes ao momento atualmente vivido no país, já que possuem o fito de adequar o processo à realidade da própria sociedade brasileira, que nada mais é do que a principal destinatária do poder jurisdicional estatal.

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1. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 146318/Sp. Recorrente: Estado de São Paulo. Recorrido: Manoel Pires de Campos. Relator: Relator: Min. Carlos Velloso. Brasília, DF, 13 de janeiro de 1996. Diário Oficial da União. Brasília, 04 abr. 1997.

2. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.134.186/RS. Recorrente: Brasil Telecom S/A. Recorrido: Sônia Carvalho Leffa Lumertz. Relator: Relator: Min. Luis Felipe Salomão. Brasília, DF, 09 de junho de 2011. Diário da Justiça Eletrônico. Brasília, 21 out. 2011.

3. Súmula 517: "São devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, haja ou não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se inicia após a intimação do advogado da parte executada.

4. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.002.817/Pr. Agravante: União. Agravado: Adriano Fagundes de Lima e outros. Relator: Ministra Laurita Vaz. Brasília, DF, 16 de janeiro de 2008. Diário da Justiça Eletrônico. Brasília, 09 fev. 2009.

5. BUENO, Cesar Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 276-278

6. Súmula 453: Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria.

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*Matheus Levy é advogado e membro das Comissões de Jovens Advogados e de Direito do Consumidor da OAB/MA.

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