Em meados de 2016, num dos últimos atos de Dilma Rousseff na presidência da República, foi sancionada e publicada a lei 13.287/16, acrescentando o artigo 394-A à CLT.
O artigo 394-A assim dispõe, após o veto proposto e mantido:
"Art. 394-A. A empregada gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a gestação e a lactação, de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres, devendo exercer suas atividades em local salubre.
Parágrafo único. (VETADO)."
Ainda, antes da sanção foram ouvidos os Ministérios da Fazenda e das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, que manifestaram apoio ao veto ao parágrafo único, que dispunha sobre "o pagamento integral do salário que vinha percebendo, incluindo o adicional de insalubridade", durante o período de afastamento para gestação ou lactação. As razões de veto assim foram consignadas:
"Ainda que meritório, o dispositivo apresenta ambiguidade que poderia ter efeito contrário ao pretendido, prejudicial à trabalhadora, na medida em que o tempo da lactação pode se estender além do período de estabilidade no emprego após o parto, e o custo adicional para o empregador poderia levá-lo à decisão de desligar a trabalhadora após a estabilidade, resultando em interpretação que redunde em eventual supressão de direitos."
Por ser tema recente, a jurisprudência é escassa, mas o artigo 394-A da CLT tem sido reconhecido como fundamento para condenação em danos morais, a exemplo da decisão prolatada nos autos do processo ROPS-0011046-82.2016.5.03.0109, onde foi anulada a sentença de primeiro grau que não se manifestou sobre a incidência e aplicação do artigo em debate:
b) pedido de pagamento de indenização por danos morais, em outros 2 fundamentos, quais sejam: 1. a obreira trabalhou em local insalubre durante todo o período gravídico, o que restou comprovado pelo pagamento do adicional de insalubridade por todo o período, em clara violação ao disposto no artigo 394-A da CLT.
(...)a anulação da decisão que julgou os aclaratórios da reclamante (ID f68a590) é medida que se impõe, com o retorno dos autos à origem, para que seja proferido novo julgado, com exame completo e fundamentado das questões suscitadas pela reclamante nos embargos de declaração (ID 56e45e3), conforme se entender de direito. Fica, por decorrência lógica, prejudicada a análise do apelo ofertado pela ré e a apreciação dos demais temas insertos no recurso da autora, os quais deverão ser renovados, no momento oportuno, caso seja de interesse das partes."
Com efeito,
TRT-03, Processo 0011046-82.2016.5.03.0109, Rel. Des. Adriana França Marques, 6ª Turma, DEJT 08/02/2017
Há entendimento, por outro lado, de que se a empregada nas condições previstas no artigo 394-A da CLT solicita permanecer na função e o adicional é pago regularmente, nem mesmo danos morais são devidos, conforme decisão recente do TRT da 18ª Região (GO).
"Analisando o comando do artigo 394-A da CLT, incluído pela lei 13.287/16, que entrou em vigor na data de sua publicação, observo que a recorrente não tem razão em seu apelo. Eis o teor do artigo:
Art. 394-A. A empregada gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a gestação e a lactação, de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres, devendo exercer suas atividades em local salubre. (Incluído pela lei 13.287/16)
O contato com produtos químicos caracteriza a insalubridade do ambiente, o que é admitido pela defesa, sendo que a reclamante recebia o adicional respectivo.
No entanto, a reclamante admitiu a alteração de função após a apresentação do atestado médico, ocasião em que foi designada para retirar a roupa da secadora e dobrar e não mais lavar a roupa (quando tinha contato direto com os produtos químicos). A partir daí, disse que passava mal pois o ambiente era quente e tinha resquícios no ar dos produtos químicos utilizados.
E a testemunha apresentada pela reclamada, apesar de se confundir um pouco com as datas, o que é comum, comprovou que a própria reclamante solicitou para permanecer na lavanderia, dizendo que já estava se sentindo melhor."TRT-18, Processo 0011360-77.2016.5.18.0281, Rel. Des. WELINGTON LUIS PEIXOTO, Diário Oficial da Justiça, publicado em 6/2/2017
É pacífico, contudo, que o artigo 394-A da CLT somente passou a viger após 11/5/2016. Vejamos:
Observe-se que, mesmo após a empregadora ter ciência do estado de gravidez, a reclamante continuou a laborar no mesmo serviço, recebendo adicional de insalubridade, já que não há notícia nem prova em contrário nos presentes autos, e, quando do ajuizamento da ação, ainda no ano de 2014, não existia vedação legal para que a gestante laborasse em ambiente insalubre, pois a inclusão do art. 394-A na CLT se deu apenas pela lei 13.287/16.
Desse modo, não há como excluir, no caso em apreciação, o valor relativo ao adicional de insalubridade da base de cálculo da indenização, por não existir, à época do período de estabilidade, vedação legal à sua percepção.
TRT-06, Processo 0000788-82.2014.5.06.0017, Rel. Des. IVAN DE SOUZA VALENÇA ALVES, DOJ, publicado em 23/1/2017
Por outro lado, a situação de gestantes ou lactantes deverá ser comprovada através de atestado médico do pediatra responsável, em analogia ao disposto no §3º do artigo 72 da lei de benefícios da Previdência.
Oportuno notar que manter gestantes e lactantes trabalhando em condições insalubres sujeitará o empregador à fiscalização dos órgãos do Trabalho e da Previdência.
Assim, embora o risco judicial seja menor quando devidamente quitados os adicionais, há maior risco relacionado aos órgãos de fiscalização do trabalho e da previdência, com possibilidade de imposição de multas e regularização da situação das empregadas gestantes e lactantes (CLT, artigos 201 e 156).
Ainda, vale ressaltar que a lei menciona o afastamento das atividades insalubres, o que seria equivalente a uma reabilitação temporária da empregada, a qual deverá permanecer afastada de qualquer atividade insalubre até que possa ocupar função em atividade salubre, assim considerada aquela que não se relaciona com agente insalubre ou na qual houver neutralização devidamente reconhecida por perito em segurança e medicina do trabalho (artigos. 191 e 195 da CLT).
Por fim, vale apontar que referido artigo não resulta em extensão da estabilidade, sendo certo que ao fim do período de estabilidade pós-gestação – previsto no artigo 10, inciso II, alínea "b", dos ADCT – não há impedimentos para a dispensa da empregada, se não houver função compatível com sua situação na estrutura do empregador.
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*Ricardo Di Sessa Amaro é advogado sênior do escritório Cerdeira Rocha Advogados e Consultores Legais.