A inclusão no ordenamento da técnica processual do parcelamento de débito teve como intuito modificar o anterior tradicional procedimento de execução, a fim de promover sua celeridade, dando efetividade à tutela jurisdicional executória e atendendo ao princípio da execução do devedor pelo meio menos gravoso (art. 620, CPC/73).
A técnica do parcelamento de débito foi inserida no CPC de 1973 pela lei 11.382/06 com o art. 745-A, o qual permitia, no prazo de apresentação dos embargos à execução, que se reconhecesse o débito exequendo por meio da realização do depósito de 30% do valor devido, parcelando-se o restante em até 6 (seis) vezes, cujo montante seria atualizado e corrigido até a data do respectivo pagamento.
Caso não fosse corretamente adimplida a dívida, incidir-se-ia multa de 10%, bem como se prosseguiria com os atos de execução forçada quanto ao montante ainda devido, na forma do parágrafo segundo do mesmo dispositivo legal.
Ante a ausência de qualquer disposição contrária no CPC de 1973 e tendo em vista a aplicação subsidiária prevista no art. 475-R do mesmo diploma processual, referida técnica também passou a ser utilizada no cumprimento de sentença de obrigação de pagar quantia certa, sendo vasta a jurisprudência que reconheceu sua aplicabilidade1, estendendo-a, inclusive, à Justiça do Trabalho2.
As vantagens do parcelamento de débito judicial se mostraram cada vez mais claras, sendo certo que tal técnica muito contribuiu para que se evitassem meras execuções infrutíferas que se amontoavam no Judiciário.
Por tal motivo, a doutrina chegou a defender que tal dispositivo era, de fato, direito potestativo do devedor3, uma vez que se tratava de facilitação das condições de adimplemento da dívida4.
A lei 13.105/15, contudo, trouxe inovação sobre o tema em seu art. 916, §7º, prevendo que o parcelamento da dívida por iniciativa do devedor "não se aplica ao cumprimento da sentença".
Tal inovação revela um retrocesso, podendo contribuir para o aumento de execuções inócuas no Judiciário.
Isso se torna mais nítido quando se constata a posição que vem sendo assumida pelos juízes trabalhistas.
Conforme previamente mencionado, a técnica do parcelamento de débito judicial foi adotada pela justiça do trabalho como método de garantir maior celeridade às execuções, tendo em vista a natureza alimentar do crédito e a ausência de procedimento específico na CLT; o que foi suprido pela subsidiariedade atribuída ao CPC no art. 769 da CLT.
Considerando-se o contexto socioeconômico do País, contudo, os juízes trabalhistas vêm permitindo a aplicação do parcelamento do débito executório, o que está sendo mantido pelos TRTs, a despeito da citada expressa vedação legal do art. 916, §7º, do CPC/15; consoante se verifica do recente julgado:
"EMENTA: EXECUÇÃO. PARCELAMENTO DO DÉBITO. APLICAÇÃO DO ART. 745-A DO ANTIGO CPC. POSSIBILIDADE. O procedimento tratado no artigo 745-A do antigo CPC (atualmente previsto no art. 916) pode ser aplicado ao processo do trabalho quando se verificar, em cada caso concreto, que tal medida possibilita maior efetividade da tutela jurisdicional."5
Em tal julgado, sustenta-se que eventuais incidentes da execução poderiam protelar a tutela jurisdicional executória, razão pela qual caberia ao juiz trabalhista aplicar o parcelamento do débito judicial nos casos em que verificasse que tal medida possibilitaria maior efetividade à execução.
Sob esse fundamento, os juízes do TRT da 10ª Região aprovaram no início de 2016, em evento realizado pela sua Escola Judicial, uma série de enunciados, dentre eles um que trata sobre o tema:
"Enunciado 44. EXECUÇÃO. PARCELAMENTO DO DÉBITO. POSSIBILIDADE. A vedação expressa de parcelamento do débito nas execuções fundadas em título judicial (CPC, art. 916, § 7º) retira do executado o direito subjetivo líquido e certo a esse modo de facilitação de pagamento. Contudo, dentro da amplitude de poderes conferidos ao juiz na execução (CPC, art. 139, IV), poderá o magistrado, nas execuções de difícil solução, mediante decisão devidamente fundamentada, autorizar o pagamento parcelado do débito, com juros e correção monetária, com ou sem o consentimento do exequente."
A posição acima descrita e adotada pela Justiça do Trabalho está em conformidade com o espírito das normas fundamentais do NCPC. Os arts. 4º e 8º do referido diploma ratificam a imprescindibilidade da razoável duração do processo e da obtenção da tutela satisfativa e orientam os juízes, como sujeitos processuais, a aplicar o processo atendendo "aos fins sociais e às exigências do bem comum", bem como "resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência".
Além disso, o NCPC incentiva posturas cooperativas entre os sujeitos processuais, conforme dispõe seu art. 6º, de modo que, nos termos do art. 805, parágrafo único, a execução deve ser efetiva, mas também caminhar de forma menos onerosa, privilegiando-se a postura de cooperação entre todos os sujeitos processuais, dentre eles o devedor.
Nesse sentido, as recentes posições da Justiça do Trabalho podem ser apontadas como um interessante mecanismo para interpretação do art. 916, §7º, do CPC, em linha com as normas fundamentais do CPC vigente, razão pela qual se deve autorizar o parcelamento de débito executório também na fase de cumprimento de sentença.
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1. “(...) 2. A efetividade do processo como instrumento de tutela de direitos é o principal desiderato das reformas processuais engendradas pelas leis 11.232/05 e 11.382/06. O art. 475-R do CPC expressamente prevê a aplicação subsidiária das normas que regem o processo de execução de título extrajudicial, naquilo que não contrariar o regramento do cumprimento de sentença, sendo certa a inexistência de óbice relativo à natureza do título judicial que impossibilite a aplicação da norma em comento, nem mesmo incompatibilidade legal. Portanto, o parcelamento da dívida pode ser requerido também na fase de cumprimento da sentença, dentro do prazo de 15 dias previsto no art. 475-J, caput, do CPC. (...)” (REsp 1264272/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 22/06/2012).
2. “AGRAVO DE PETIÇÃO. PARCELAMENTO DO CRÉDITO EXEQUENDO. ART. 745-A DO CPC. O parcelamento do débito prestigia os princípios da economia e celeridade processual e representa a possibilidade do executado, para garantir a sua subsistência, quitar seu débito de forma parcelada, ainda que sem anuência do credor, pois não há redução do seu crédito e o dispositivo não faz nenhuma menção em necessidade de concordância do exequente. Trata-se de ato discricionário do juiz da execução, amparado na livre direção do processo. Agravo de petição a que se dá parcial provimento.” (TRT-2 - AP: 00108000620045020313 SP 00108000620045020313 A20, Relator: MARGOTH GIACOMAZZI MARTINS, Data de Julgamento: 20/01/2015, 3ª TURMA, Data de Publicação: 27/01/2015)
3. ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. São Paulo: RT, 2012, pag. 556.
4. DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Execução. Vol 5. 4º ed. Salvador: Juspodivm, 2012.
5. TRT-3 – AGRAVO DE PETIÇÃO: 00987-2013-036-03-00-9-AP MG, Relator: LUIZ ANTONIO DE PAULA IENNACO, Data de Julgamento: 02/08/2016, 11ª TURMA, Data de Publicação: 11/08/2016.
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*Elias Marques de Medeiros Neto e Eginaldo de Oliveira Silva Filho são advogados do departamento jurídico da Cosan.