I. Introdução
Este artigo pretende tratar dos incentivos fiscais concedidos ao "Esporte" mediante revisão teórica acerca do instituto, bem como das legislações – Federal, Estadual e Municipal (alguns municípios) - que regulam a matéria.
Frequentemente deparamo-nos com artigos jurídicos abordando o tema dos benefícios fiscais – assim compreendidos a isenção, a imunidade, a alíquota zero, as reduções (base de cálculo/alíquota), a concessão de créditos presumidos -, como sendo favores do Estado em benefício do contribuinte, caracterizados pela redução ou eliminação do ônus tributário. A maioria deles se inicia definindo a expressão "benefícios fiscais" ou discorrendo sobre o impacto econômico gerado pelo implemento de tais medidas, analisando-as pela óptica da ordem econômica, política ou social, em detrimento de uma análise jurídica; evidenciam apenas os efeitos que resultam da implementação dos benefícios, sem considerar que se tratam de institutos juridicamente distintos.
Analisaremos, aqui a questão dos benefícios fiscais, mais especificamente o instituto da isenção num contexto estritamente jurídico, fundando alicerces na Filosofia da Linguagem, à propósito de uma concepção linguística do Direito, o que de pronto exigirá algumas reflexões.
A Filosofia da Linguagem surge com o movimento denominado Giro Linguístico, nos meados do século XX, em contraposição ao Neopositivismo Lógico - este, um movimento originado no início do século XX, em Viena, que toma a linguagem como um instrumento para "descrever" o resultado do conhecimento adquirido, exercendo o homem, a função de simples observador da realidade.
A Filosofia da Linguagem rechaça este paradigma, tomando a linguagem não mais como um instrumento para comunicar o resultado do conhecimento (função descritiva da linguagem), mas, como condição de possibilidade para o próprio conhecimento (função constitutiva da linguagem).
Significa dizer que o homem, por meio da linguagem, passa a "constituir" a própria realidade. Isto implica a mudança de outro paradigma: o da verdade por correspondência, haja vista que a linguagem não mais se limita a descrever aquilo que nos é dado a conhecer, mas a constituir o objeto do conhecimento.1
Quanto às premissas teóricas, adota-se aqui, aquelas que conformam a Teoria Comunicacional do Direito. Entender o direito nesse contexto significa admiti-lo como um corpo de linguagem prescritiva que constitui a realidade jurídica, pretendendo regular as condutas intersubjetivas de uma determinada sociedade, em determinado tempo.
Como um fato comunicacional, manifesta-se por atos de comunicação, mediante uma linguagem acordada pela própria sociedade.2 Entende-se, então, o Direito Positivo como um sistema de significações3 objetivado em linguagem própria – linguagem competente ou prescritiva -, cujos elementos são as normas jurídicas.
A necessidade deste recorte metodológico é imprescindível dado à impossibilidade de se emitir proposições acerca de um objeto sem que se estabeleça o sistema de referência no qual se sustentarão tais proposições.4 Diante disso, estabelecemos como nosso sistema de referência o "jurídico", tendo como pano de fundo o processo de positivação das normas jurídicas.
O objetivo específico do estudo é trazer à baila pontos relevantes atinentes às normas isenção. Estabelece-se, portanto, como ponto de partida, o sistema do Direito Positivo, considerando o subsistema do Direito Tributário e seus elementos – as normas jurídicas -, sob as perspectivas estática (proposição normativa) e dinâmica (processo de positivação).
Para alcançar tal objetivo, utiliza-se o método analítico-hermenêutico, adotado pelo Construtivismo lógico-semântico5, como forma de aproximação para o que, aqui, se pretende conhecer: a isenção tributária.
-
Leia aqui a íntegra do artigo.
_______________
1 SCARVINO, Dardo. A filosofia atual: pensar sem certezas, tradução Lucas Galvão de Brito, São Paulo: Noeses, 2014, Introdução, p.XII: “[...] falar de um "giro linguístico em filosofia significa aqui que a linguagem deixa de ser um meio, algo que estaria entre o eu e a realidade, e se converteria em um léxico capaz de criar tanto o eu como a realidade". E mais adiante, p.XIII: "O "Giro linguístico converte-se então em uma espécie de construtivismo radical, doutrina segundo a qual as teorias científicas ou discursos metafísicos não descobrem a realidade, mas sim a criam."
2 CARVALHO, Aurora Tomazini. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico, São Paulo: Noeses, 2009, p.158-160.
3 VILANOVA, Lourival. Causalidade e relação no direito, 4ª ed. rev, atual. e ampl., São Paulo: Editora revista dos tribunais, 2000, prefácio à 4ª edição, p. 11: “Um sistema de significações sem um sistema de linguagens, que permeia todos os subsistemas sociais, permaneceria em estado ideacional: ficariam desprovidos de objetivação, sem a relação estável entre o símbolo e seus referentes, inviabilizando a comunicação.”
4 CARVALHO, Paulo de Barros. Fundamentos jurídicos da incidência tributária, 7ª ed. rev., São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1-3: "a ideia de sistema de referência toma posição dominadora em todo conhecimento humano. Sem sistema de referência, o conhecimento é desconhecimento". E mais adiante, "Quando se afirma algo como verdadeiro, portanto, faz-se mister que indiquemos o modelo dentro do qual a proposição se aloja, visto que será diferente a resposta dada, em função das premissas que desencadeiam o raciocínio."
5 Construtivismo lógico-semântico é um método científico de aproximação do sistema Jurídico que se preocupa com a sintática e a semântica do direito para melhor interpretá-lo. Tem por base o Direito como um corpo de linguagem, razão pela qual o método analítico é apropriado para aproximação do seu objeto. Diz-se "Lógico" porque se utiliza da Lógica como sobrelinguagem do discurso do direito, formalizando-o, dele retirando todo conteúdo semântico, substituindo as palavras por símbolos isentos de ambiguidades e vaguidades, no intuito de investigar possíveis contradições do discurso, bem como analisar as relações lógicas do sistema normativo (relações estruturais ou sintáticas); "Semântico" porque, em seguida, desformaliza a linguagem lógica, imputando conteúdo semântico (valor) aos termos lógicos da proposição normativa, construindo um significado.
*Sílvia Regina Zomer é mestre e doutoranda pela PUC/SP. Professora Seminarista e Conferencista no Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET. Autora do livro "Análise da Norma Individual e Concreta Pela Óptica do Construtivismo Lógico Semântico", publicado pela Editora Intelecto.
*Marcio Cesar Costa é mestre e doutorando pela PUC/SP. Professor Seminarista e Conferencista no Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET. Ex. Conselheiro Titular no Conselho Municipal de Tributos em São Paulo. Autor do Livro "A Responsabilidade Tributária dos Sócios", publicado pela Editora Intelecto.