Primeiro ainda estudante, membro da Academia de Letras da Faculdade, Cadeira Castro Alves. Depois, já tendo sido Presidente da República, como colaborador especial.
Nenhuma surpresa. Presidi a Academia de Letras nos duros anos de 1967/1968 e sabia das incursões poéticas janistas.
São versos de esforçado pretendente parnasiano. Tecnicamente rigorosos. Quadras de decassílabos com rimas de preciosidade elaborada, substantivos rimando com verbos e adjetivos, sem concessão nenhuma a rimas pobres, como aquelas de verbo com verbo e eco final de sufixos adverbiais. Cuidadosa a métrica, recaindo as sílabas tônicas ao rigor das regras.
Vale reviver os versos de Jânio poeta juvenil. Para a lembrança biográfica de um Presidente da República e para a recordação dos grandes nomes que passaram pela Academia de Letras da Faculdade de Direito – os primeiros quando ainda nem existia a USP, nem havia outras Faculdades no Estado, quando era simplesmente a Faculdade de Direito de São Paulo!
EVOCAÇÃO1
Meu São Paulo querido! Eu te revejo
pequenino, brumoso, frio, tristonho...
E humilde, São Paulo, e sertanejo,
eras grande no amor! Grande no sonho!
Eu me lembro, São Paulo. Uma janela
Se ilumina na bruma, e, de repente,
Abre-se, e à luz incerta de uma vela,
a moça escuta a serenata quente.
Há romances no ar! Baila no espaço
um cheiro de aventura, e, na taberna,
os boêmios recitam no compasso
eternos versos da poesia eterna.
Corre um rumor longínquo. E a bruma fria
traz vozes de poesia e de oração...
-- Um estudante canta a Academia,
outro estudante prega a Abolição!
Passam vultos sombrios, e distante,
no silêncio da noite, alguém dedilha,
uma canção de amor à linda amante
que se oculta, medrosa, na mantilha.
Meu São Paulo querido! Eu te revejo
pequenino, brumoso, frio, tristonho...
E humilde, São Paulo, e sertanejo,
Eras grande no amor! Grande no sonho!
LUA LONDRINA2
Não surge, não. Apenas dilacera
o negrume da urbe fumarenta
e a espreita entre o carvão, o pó e a hera,
semi-oculta, sorturna, macilenta.
Reponta outra vez, e agora espera
alcançar toda a Londres sonolenta,
as docas, Piccadilly e, se pudera
a infindável metrópole cinzenta.
Lua londrina que prescruta o mundo
no terror do que vê e foge, presto,
da babel de um planeta moribundo.
Tímida lua que espelha no asfalto
a tragédia, a miséria, a morte e o resto
da humanidade que não olha ao alto.
Lembrei-me da clássica "Antologia dos Poetas Bissextos Contemporâneos" de Manuel Bandeira. Que tal tentar um dia tentar uma "Antologia dos Políticos Poetas Bissextos" -- ou, ao menos, "Políticos à Procura da Poesia"?
_____________
1 "Arcádia", órgão da Academia de Letras da Faculdade de Direito da USP, 1938, vol. 8, pág., 27.
2 "Arcádia", órgão da Academia de Letras da Faculdade de Direito da USP, 1972, n. 2, pág. 29.
_____________