Sumário
1. Introdução
2. A advocacia pública
3. A edificação do capítulo da advocacia pública no novo Código de Ética e Disciplina da OAB
4. O novo capítulo da advocacia pública
5. Conclusão
1 Introdução
Em 2016 entra em vigor o novo Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil (CED/OAB). Aprovado na sessão de 19 de outubro de 2015, este foi conformado após incansáveis sessões ordinárias e extraordinárias do Conselho Federal da OAB (CFOAB). Na construção do novo ordenamento disciplinador da atuação ética da advocacia brasileira, os conselheiros federais estiveram diante de homéricos debates oriundos de controvérsias resultantes da atuação dos advogados brasileiros durante os longos 85 anos da instituição, revolvendo a história da advocacia e as polêmicas originadas do Código de Ética vigente desde fevereiro de 1995.
O restabelecimento de um amplo debate sobre a atuação da OAB e da advocacia brasileira sob o olhar disciplinar e ético após mais de 20 anos de vigência do atual (mas não novo) CED reluziu o valor institucional da OAB para a manutenção do Estado Democrático de Direito – fato que incontroversamente a OAB com frequência reafirma em seus atos – e, em especial, reacendeu as lamparinas principiológicas que norteiam a conduta do advogado brasileiro, como a luta por justiça, pelo cumprimento da Constituição e das leis, revestido da beca da lealdade, da boa-fé, da independência, da dignidade, da probidade, da ética e do domínio da ciência jurídica.
Neste emaranhado de ações, o Conselho Federal, na batuta do presidente Marcus Vinicius Furtado Coêlho, avançou na história para superar uma mal delineada fenda escavada no âmbito da OAB e que somente com ousadia – ingrediente essencial para mover as pessoas e o mundo – pôde ser superada pelo novo CED. O caminhar foi em favor da aprovação de um capítulo específico para a advocacia pública e nele expressamente prever a observância do Código de Ética como meio para assegurar o respeito às prerrogativas e a independência técnica indispensável para o exercício da função. Um paradigma que merece ser historiado em homenagem a todos os que contribuíram para sua escrituração.
2 A advocacia pública
A Carta de outubro de 1988 estabeleceu um capítulo próprio para tratar das funções essenciais à justiça, nela fixando o munus advocatu para cada uma delas. Essas funções são invocadas (vocatus) para ajudar (ad) na tarefa (munus) em defesa do Estado, da sociedade e do cidadão. O exercício do advocatus tem um sentido muito maior e engloba, além da advocacia privada, também a advocacia pública em seu sentido lato, tais como: a advocacia pública stricto sensu, identificada como a “advocacia de Estado”, que se encontra descrita para a Advocacia-Geral da União (art. 131), para os procuradores de Estado e do DF (art. 132) e implícita para os procuradores municipais1 (art. 1º), bem como abarca o MP (art. 127) e a Defensoria Pública (art. 134).
Cada função exerce seu papel fundamental e competente na preservação da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses do Estado, da sociedade e do cidadão. Como esclarece Moreira Neto (2012), são três espécies funcionais de advocacia pública, todas criadas pela Carta Política, que caracterizam diferentes ministérios públicos da advocacia: a advocacia das entidades públicas, exercida pela advocacia pública stricto sensu (advogado de Estado); a advocacia da sociedade, exercida pelo MP; e a advocacia dos hipossuficientes, exercida pela Defensoria Pública.
Na América do Sul os modelos de advocacia pública lato sensu se alternam, ora separando, ora unificando as funções das instituições que exercem o munus advocatu público. O modelo tripartite adotado pelo Brasil, respeitadas as características próprias de cada Estado Nacional, também é seguido pela Bolívia, Chile, Equador, Paraguai e Venezuela. No entanto, há os que adotam um modelo bipartite (Argentina e Peru) ou unipartite (Colômbia e Uruguai), e, como bem observado por Vieira e Faro (2014, p. 33), os países
"que não adotam uma separação de funções a partir de órgãos distintos – para fiscalizar, para defender ou para enfrentar o Estado – constituem um paradigma primitivo, desatento à evolução histórica cada vez mais premente de proteção específica e concentrada de interesses".
Em países ibéricos, como a Espanha e a Itália, a advocacia de Estado teve sua formação ainda no século XIX, consolidando-se como carreira indispensável à ordem jurídica e acessível mediante processo de seleção pública. Destarte, mesmo diante de paradoxos ainda existentes, segundo Cortese (apud SCINO, M. A., 2006, apud 2014, p. 144), é muito frequente a afirmação dos intérpretes de que a Avvocatura dello Stato é
"um órgão de colaboração – contenciosa e consultiva – de todas as administrações, colocado ‘fora da hierarquia burocrática’ e, portanto, dotado de autonomia específica, muito próxima da autonomia da magistratura".
No Brasil, diferentemente do MP, que alçou autonomia originariamente na Constituição brasileira, e da Defensoria Pública, que a conquistou em recente emenda constitucional, a advocacia de Estado não detém autonomia e vem conquistando o reconhecimento institucional e da sociedade no caminhar de sua própria edificação, tendo a OAB como sua principal parceira.
No Brasil a advocacia de Estado não detém autonomia.
Nos últimos anos, com o avanço da atuação da Comissão Nacional de Advocacia Pública (CNAP), instituída pelo CFOAB, constituída de representação de profissionais de todos os entes federados, mas, em especial, com o amoldamento de que na direção deverá ser observada a alternância entre os representantes da União, do Estado e dos municípios, conferiu-se uma nova roupagem ao órgão colegiado e, com isso, uma nova visibilidade.
A CNAP tem desempenhado um papel especial ao dar suporte aos advogados públicos de todos os confins deste país. Uma das atuações de grande relevância exercida pela CNAP foi a aprovação de súmulas2 específicas relativas à atuação do advogado público. Referidos enunciados têm, inclusive, amparado decisões judiciais para sustentar a atuação e defesa do advogado público.
O Conselho Federal, por meio de sua Diretoria e de seus membros, e a CNAP da OAB, por meio dos advogados públicos que a compõem, são órgãos fundamentais na construção de uma advocacia pública livre e independente, compromissada com a defesa judicial e extrajudicial dos entes federados e com a efetivação de políticas públicas para assegurar a concretização dos direitos e garantias fundamentais.
É sob este manto que nasceu o inaugural capítulo em favor da advocacia pública stricto sensu no novo CED/OAB.
3 A edificação do capítulo da advocacia pública no novo Código de Ética e Disciplina da OAB
Durante muitas décadas o advogado público foi visto como "um ser estranho" ao "verdadeiro" exercício da advocacia, chegando ao cúmulo de termos visto manifestações políticas institucionais de que somente "advogado de verdade" poderia gerir a OAB. Nos bastidores do exercício da função também se propagou a crença de distinção entre o "advogado público" e o "advogado puro". Para alguns (talvez, muitos), há um falso juízo de que advogado somente é advogado se for “puramente advogado”, ou seja, sem vínculo de trabalho com o Estado.
Atitudes como esta fomentaram durante muitas décadas uma zona cinzenta institucional, quase um fosso, entre os advogados inscritos na OAB. Pautado nesta falsa ideia, o procurador-geral da República (PGR) propôs uma ADIn contra a inscrição do advogado público na OAB. Em seu fundamento, o PGR argumentou que as atividades dos advogados públicos “sujeitam-se a regime próprio (estatuto específico), não necessitando de inscrição na OAB, tampouco a ela se submetendo”, e, assim sendo, a exigência no Estatuto da Advocacia (art. 3º, caput e § 1º, da Lei nº 8.906, de 1994)3 viola os arts. 131, 132 e 134 da CF.
A ADIn foi proposta no dia 19 de junho de 2015, momento em que se encontrava em apreciação no CFOAB a proposta do novo CED. A ação sobreveio após a sessão extraordinária do dia 14 de junho, realizada em um domingo brasiliense, quando havia sido proposta pela presidente da CNAP a inclusão de um capítulo próprio para a advocacia pública, com objetivo inicial de preservar o advogado público das mazelas vividas na labuta diária nos vários âmbitos federativos, constantemente denunciadas na CNAP.
O fato é que a atividade exercida no Conselho Federal permite aos seus membros identificar e até vivenciar situações em que o advogado subordina-se para o exercício do seu munus advocatício. Esta oportunidade também permitiu conhecerem a verdadeira advocacia pública. A própria advocacia de Estado contribui para esta visibilidade ao aproximar-se da OAB, mostrando a sua cara, os ambientes em que exerce suas atividades, alguns até degradantes, quando não violadores da atuação profissional e funcional em seu aspecto mais relevante: a independência.
Foi reconhecendo o contexto real da advocacia pública que surgiu a ideia de um capítulo próprio no Código de Ética em apreciação, como maneira de assegurar a prerrogativa e responsabilidade do advogado público e dos gestores de órgãos públicos jurídicos da Administração Pública. Na construção da redação, os advogados públicos que integram as instituições representativas de classe, os membros da CNAP, advogados públicos de todos os entes federados e os que integram o CFOAB foram fundamentais para a apresentação e aprovação da proposta. O fato é que, nos últimos anos, o movimento por uma advocacia pública unificada,4 apesar das divergências peculiares, tem contribuído de forma acentuada para a obtenção dos resultados positivos e de grande relevância.
Contudo, foi sob a batuta do presidente que os debates aclararam a inópia da advocacia pública brasileira. Como sabiamente ressaltou o presidente Marcus Vinicius Furtado Coêlho, no encerramento do Encontro Nacional Conjunto Anpaf-Unafe, em outubro de 2015, logo após a aprovação do Código de Ética pelo CFOAB, a Ordem é forte porque é única e:
“Os advogados públicos devem ter na OAB a acolhida de suas bandeiras. Valorizar esses profissionais é missão estatutária, não deve haver qualquer distinção entre públicos e privados senão a natureza dos clientes. No âmago do exercício da profissão não há nenhuma diferença. A inviolabilidade é para todo e qualquer advogado”.
Neste contexto histórico germinou o capítulo, a partir dos debates de advogados de todas as classes, origem, gênero, idade, crença e convicções que compõem o CFOAB.
Foram três os dispositivos aprovados que constituem o atual e inaugural capítulo da advocacia pública no Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados brasileiros. Surgiu a partir de uma proposta inicialmente apresentada à Comissão Especial do CED/OAB, mas que, ao ser abraçado pela CNAP, foi apresentado como uma proposta de capítulo próprio e, ao seu tempo, prevenindo o conselheiro federal das mazelas sofridas pela advocacia pública brasileira e da importância da preservação da independência dos profissionais da advocacia de Estado.
4 O novo capítulo da advocacia Pública
"CAPÍTULO II DA ADVOCACIA PÚBLICA
Art. 8º - As disposições deste Código obrigam igualmente os órgãos de advocacia pública, e advogados públicos, incluindo aqueles que ocupem posição de chefia e direção jurídica.
§ 1º - O advogado público exercerá suas funções com independência técnica, contribuindo para a solução ou redução de litigiosidade, sempre que possível.
§ 2º - O advogado público, inclusive o que exerce cargo de chefia ou direção jurídica, observará nas relações com os colegas, autoridades, servidores e o público em geral, o dever de urbanidade, tratando a todos com respeito e consideração, ao mesmo tempo em que preservará suas prerrogativas e o direito de receber igual tratamento das pessoas com as quais se relacione.”
Os dispositivos aprovados foram estrategicamente alocados após o primeiro capítulo do Título I do CED/OAB, que dispõe sobre a “ética do advogado”, ou seja, logo após o capítulo “dos princípios fundamentais” e precisamente para iluminar a verdade constitucional: o advogado público integra a OAB e submete-se ao seu Estatuto.
Aliás, muito mais que comprovar o induvidoso, as disposições que entrarão em vigor afetam a atuação dos advogados públicos e também os que ocuparem alguma posição de chefia e direção de órgão jurídico, ainda que não integrantes da carreira.
Enfim, a proposição constante do art. 8º, ao abarcar também os advogados dirigentes, vincula todo aquele profissional, seja advogado público ou não, que assumir a posição de chefia ou direção de órgão jurídico na Administração Pública.
É próprio do sistema político que o dirigente de órgão público tenha uma afinidade política com a autoridade nomeante e é quase uma característica intrínseca que esta relação contagia sua responsabilidade (não necessariamente de forma negativa). Com o novel Código de Ética, pretende-se que, mesmo no exercício de função pública, o advogado assuma sua responsabilidade ética com a advocacia, respeitando e também garantindo a independência técnica dos advogados públicos subordinados.
Além de a independência técnica ser uma característica imanente do munus advocatu, estando inclusive expressamente descrita na lei estatutária da OAB em vários dispositivos, através do Provimento nº 114, de 2006, a OAB restaurou que
“é dever do advogado público a independência técnica, exercendo suas atividades de acordo com suas convicções profissionais e em estrita observância aos princípios constitucionais da administração pública”.
Com o novel Código de Ética, pretende-se que o advogado assuma sua responsabilidade ética com a advocacia.
Naquele momento buscava-se reafirmar o compromisso do advogado público, hoje, no entanto, busca-se garanti-lo como direito. Eis, portanto, que a CNAP deu novo contorno em favor da independência técnica, desta vez, revigorando-a como prerrogativa inerente ao exercício da função:
“Súmula 2 - A independência técnica é prerrogativa inata à advocacia, seja ela pública ou privada. A tentativa de subordinação ou ingerência do Estado na liberdade funcional e independência no livre exercício da função do advogado público constitui violação aos preceitos Constitucionais e garantias insertas no Estatuto da OAB”.
Como lembra o conselheiro Federal Aldemário Araújo Castro (2015, p. 80 e 99), após citar as normas vigentes, “vale destacar que as referências em questão limitam-se a consagrar ou afirmar a independência técnica”, tal como já o fez o Supremo Tribunal Federal na ADIn 4.261, em que foi relator o ministro Ayres de Britto, mas a independência técnica está relacionada “com a atuação de cada profissional no manejo das técnicas para as quais está habilitado acadêmica e profissionalmente”.
O advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, assim foi constitucionalizado no Estado Democrático de Direito instaurado em 1988, e é assim que anseia o novo CED/OAB. Inteirou-se o § 1º do art. 3º da lei 8.906/94, explicitando que a sujeição à OAB é de todo advogado que assuma atividade jurídica na Administração Pública, inclusive os que não ascenderam à função de carreira típica de Estado.
A independência é fundamento básico para o exercício do direito à liberdade do exercício da profissão prescrita no inciso XIII do art. 5º da CF, permitindo que efetivamente possa contribuir para a solução ou para a redução de litigiosidade. Leonardo Accioly, presidente da Comissão Nacional de Prerrogativas e Valorização da Advocacia, ilustra que “o caráter essencial, inviolável e independente da nossa profissão, longe de ser um privilégio, na verdade se constitui como uma garantia da democracia brasileira que protege, de forma canina, o sagrado direito de defesa”.
Destarte, é explícito que o dispositivo tem como objetivo precípuo defender a liberdade profissional do advogado público, já tão criminalizado nos últimos anos, pois, conforme ressaltamos em artigo que reflete sobre o tema (GALANTE, 2015, p. 179 e 189), “a natureza intelectual da atividade somado a garantia de um ambiente de liberdade profissional e de independência técnica propiciam o exercício legitimado da advocacia pública”, porquanto, como já reafirmado em Plenário do CFOAB em parecer da lavra do conselheiro Patriota (AL),5
“os Advogados Públicos de todos os entes da federação, só podem exercer a sua atividade, [...] se tiverem a liberdade para atuar, sem o qual pode ser tudo, menos Advogado”.
Além da indispensável independência técnica, é fundamental que o advogado público preserve a urbanidade com os colegas, com as autoridades, com os servidores e, essencialmente, com o cidadão, o legítimo mantenedor e recebedor dos serviços públicos.
O dever de urbanidade6 – que também se estende ao dirigente do órgão jurídico – objetiva assegurar o tratamento com respeito e consideração e o direito de receber igual tratamento das pessoas com as quais se relacione. Atuando para assegurar o seu direito e o de outros, o advogado público harmoniza o meio ambiente profissional tornando-o sadio e apto a instrumentalizar muitos outros direitos por meio das políticas públicas. Afinal, a real função do advogado de Estado é de satisfação do interesse geral, contribuindo com o seu conhecimento jurídico para a construção de soluções legais, respeitando os princípios norteadores e atingindo-a de forma mais eficaz e eficiente.
A advocacia pública é essencial à concretização da justiça social, tal como a advocacia da sociedade (MP) ou a advocacia do cidadão hipossuficiente (Defensoria Pública), e, como dito, integra um complexo de funções essenciais que emerge da fecunda advocacia, estando muito mais próxima da materialização das políticas públicas indispensáveis para a realização de uma vida digna para o cidadão e a coletividade. Deste modo, como lembra Binenbojm (2014, p. 118):
“O engajamento do Advogado Público na realização de políticas públicas não é um engajamento político-partidário. É um engajamento institucional. E para que ele possa realizar as políticas públicas, de um lado, e mantê-las dentro do quadro da juridicidade, de outro, é preciso que ele tenha garantias institucionais e garantias funcionais. Com isso, o Advogado não será reduzido ao papel de mero Advogado do governo”.
Enfim, o fortalecimento do advogado público é o fortalecimento do Estado, da cidadania e da coletividade, posto que é amplo o seu desígnio na defesa e na realização do interesse público, peça fundamental para a concretização das políticas públicas asseguradoras dos direitos fundamentais.
5 Conclusão
A inserção de um capítulo próprio para a advocacia pública no novo Código de Ética do Advogado brasileiro é a “cereja do bolo” sob dois aspectos: o primeiro é para a Diretoria Nacional e o CFOAB, que no ano de 2016 concluiu o mandato com um resultado surpreendente em favor da advocacia pública – reconheceu o Conselho Federal a importância de assegurar a defesa das prerrogativas de todos os advogados, inclusive as dos advogados de Estado; o segundo é para o Movimento Nacional pela Advocacia Pública, que, pela primeira vez, reuniu a advocacia pública de todos os âmbitos federados em um único projeto, a conquista da autonomia e da real liberdade institucional como instrumento de garantia de defesa da probidade na execução da atividade do Estado.
Além do novel capítulo da advocacia pública no Código de Ética e Disciplina, merecem menção as inúmeras vitórias obtidas pela advocacia pública a partir do papel incansável da Diretoria da OAB e dos conselheiros federais, tais como a regulamentação dos honorários advocatícios no novo CPC, a aprovação pelas Comissões do Congresso Nacional de proposições legislativas de interesse da advocacia pública, o apoio na formação de um novo precedente no Superior Tribunal de Justiça quanto à responsabilização de advogado público na emissão de parecer e, dentre outros, o recente Provimento 167/15, dispensando os advogados públicos de Exame de Ordem se tiverem sido aprovados em concurso público de provas e títulos com a efetiva participação da OAB.
A OAB agiu atenta ao seu papel institucional de buscar a valorização do advogado público, vence a sociedade e o cidadão. Agora, igualmente resta aos advogados públicos cumprir o papel de promover e proteger a nossa independência, buscando o aperfeiçoamento e a defesa dos instrumentos que a garantam, assegurando, sem medo, o exercício da capacidade criativa inerente a “ser advogado”.
Um merecido avanço para a advocacia pública será a criação de uma lei orgânica comum às três esferas de Estado, em um documento que reúna deveres, garantias e prerrogativas comuns, unificando todos os entes federados em um objetivo comum: a realização do interesse público.
Por derradeiro, se puder resumir todo o trabalho executado, é digno de menção que a inclusão de um capítulo próprio voltado à advocacia pública no Código de Ética da Advocacia brasileira extraiu, de uma vez por todas, o marco que ilusoriamente separava a advocacia privada da pública. Somos todos advogados e por isso obtivemos o apoio incondicional dos membros que compõem o CFOAB, em especial, na figura de nosso presidente, por sua nobreza na condução da confirmação de que, independentemente de sua nomenclatura, só existe um profissional integrante da OAB: o advogado.
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1 Como leciona Alochio (2009, p. 325), advogado público que contribuiu para a construção do capítulo, a advocacia pública municipal está prevista na Constituição por força do princípio da simetria. “Por este princípio, as normas constitucionais são aplicáveis aos entes da Federação. [...] Enquanto pedra angular do edifício federativo brasileiro, enquanto valor especialíssimo deste federalismo, o primado municipalista é tão caro que sequer precisa estar expresso na literalidade da Norma Fundamental. Os valores por si valem. Enquanto as meras regras precisam, aí sim, estar expressas ritualística e textualmente.”
2 Disponível em: https://www.oab.org.br/noticia/24762/conselhofederal-traca-diretriz-em-defesa-da-advocacia-publica.
3 “Art. 3º - O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), § 1º - Exercem atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime desta lei, além do regime próprio a que se subordinem, os integrantes da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas entidades de administração indireta e fundacional.”
4 O Movimento Nacional pela Advocacia Pública foi oficialmente lançado no dia 3 de setembro de 2013 e conseguiu reunir todas as entidades de classe da advocacia pública brasileira, a municipal (ANPM), a estadual (Anape) e a federal (Anajur, Anauni, Anpaf, Anpprev, Apbc, Sinprofaz e Unafe).
5 Processo nº 49.0000.2014.008029-8, que apurou o caso de uma ação penal proposta em face de um advogado público por emissão de parecer em licitação e julgou as medidas a serem adotadas contra a criminalização do exercício da advocacia pública.
6 O dever de urbanidade é inerente ao exercício da advocacia e está expresso no Estatuto da OAB como um dos deveres que devem ser observados pelo advogado (parágrafo único do art. 33). No novo CED, o dever de urbanidade também está regulado no art. 27, enaltecendo que, além de dever, é um meio para assegurar a preservação de direitos e prerrogativas do advogado, exigindo que também deva ser observado nos atos e manifestações relacionados aos pleitos eleitorais no âmbito da OAB, constituindo infração ético-disciplinar sua inobservância.
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Bibliografia
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VIEIRA, Pedro Gallo; FARO, Julio Pinheiro. Um inventário sobre a Advocacia de Estado no direito comparado sul-americano. In: PEDRA, Adriano Sant’Ana; FARO, Julio -Pinheiro; VIEIRA, Pedro Gallo (Org.). Advocacia Pública de Estado: estudos comparativos nas democracias Euro--americanas. Curitiba: Juruá, 2014.
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*O artigo foi publicado na Revista do Advogado, da AASP, Ano XXXVI, de Abril de 2016, nº 129.
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*Elisa Helena Lesqueves Galante é procuradora municipal. Presidente da Comissão Nacional de Advocacia Pública do CFOAB em 2014-2015. Doutoranda em Direitos e Garantias Constitucionais Fundamentais (FDV). Mestre em Direito na área Políticas Públicas e Processo (FDC). Professora da Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim (FDCI).