Assunto que deixou muitos de cabelo em pé recentemente foi a possibilidade de limitação de dados nos planos de internet fixa no Brasil.
Neste novo modelo, o consumidor passa a ter um limite de uso mensal (denominado franquia), que, quando ultrapassado, autoriza a redução da velocidade ou até mesmo o cancelamento da conexão. Trata-se de modelo previsto pela Anatel, que já tem regulamentadas normas acerca do tema: é preciso que as empresas disponibilizem ferramentas para que o usuário acompanhe o consumo e alertem quando o uso se aproximar do limite contratado.
O anúncio desta possível mudança ocorreu em março deste ano, e, em pouco tempo, um site promoveu uma petição pública que atingiu a marca de 1,2 milhões de assinaturas contrárias. Por outro lado, as operadoras se defendem. A assessoria de imprensa da NET se manifestou no sentido de que “o emprego de franquia visa preservar a experiência de uso, tanto de quem usa moderadamente como de quem usa de forma intensiva”. A Oi alegou que já possui um limite de dados definido em contrato, mas “não costuma reduzir a velocidade” dos usuários que ultrapassam o plano contratado. A Vivo, que recentemente adquiriu a GVT, informou que a medida é uma tendência, e o objetivo é proporcionar a melhor experiência ao cliente.
Fato é que as franquias na internet fixa já ocorrem em outros países, como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, entre outros. E este tem sido um argumento utilizado pelos defensores do modelo. A grande diferença, no entanto, não é levantada por estas mesmas pessoas: a maturidade do mercado. As empresas internacionais que aplicam limites oferecem uma internet com velocidade absurdamente superior à oferecida no Brasil, e por preços absurdamente inferiores.
Em meio à euforia dos consumidores e de muitas instituições (como o Idec e a OAB, que também se colocaram contrárias ao modelo), em 18 de abril a Anatel, em medida cautelar, proibiu que as operadores procedessem os limites até que disponibilizassem mecanismos efetivos de controle de tráfego. A proibição teria validade por 90 dias. Contudo, quatro dias depois, um novo capítulo desta novela foi ao ar: a Anatel proibiu os limites “por tempo indeterminado”. Em tese, a proibição vigora até que a agência analise a questão após as reclamações. Não ficou claro quais seriam os motivos para a alteração do prazo, mas revelou uma inconsistência no posicionamento da Anatel.
O tema é bastante complexo e permite algumas ponderações e indagações. As operadoras que, a princípio, aderiram ao modelo de franquia são também donas de tvs por assinatura. E não é segredo que os serviços de streaming reduziram em muito o uso deste serviços. Por que pagar (e pagar caro, diga-se) pela tv fechada se é possível assistir uma infinidade de programas via internet? Neste ponto, vale lembrar que a TIM, que desde o início informou que não aderiria ao novo modelo, não tem serviços de TV paga (estaria, portanto, imune ao prejuízo que as demais vem sofrendo).
Mas o assunto vai muito além de Netflix, Youtube, Spotify e jogos online. Atualmente, grandes empresas dependem das conexões online. A tão falada globalização permitiu que uma pessoa residente no Brasil trabalhe para um empregador nos Estados Unidos. Ou na China. Ou vice versa. E todo o trabalho é entregue quase que 100% via internet.
Outro ponto importante também (e sobre o qual não se viu grandes considerações) é a forma como a educação expandiu com os cursos online. São milhares (quem sabe milhões) de novos alunos fazendo cursos em suas casas. Cursos profissionalizantes, cursos preparatórios, cursos livres. A maioria dos cursos, localizados em grandes centros, não está acessível aos moradores dos mais distantes interiores. Pode-se achar aulas de quase tudo hoje em dia. Limitar o uso da internet é limitar a educação.
Muito além dos lucros das teles, o tema precisa ser avaliado por tantos outros lados. E não nos parece que todos os lados desta moeda estão sendo cogitados.
*Luciana Pimenta é coordenadora pedagógica no IOB Concursos, advogada e revisora textual.