1 Introdução
Nos últimos meses, temos noticiado com frequência alarmante a ocorrência de diversos crimes contra Oficiais de Justiça. Casos recentes de desacato, roubo, furto, cárcere privado, entre outros delitos, ensejam uma sensação de profunda insegurança nesses agentes públicos responsáveis pela materialização da prestação jurisdicional. Inclusive, infelizmente, nos últimos anos, já houve até homicídios de Oficiais de Justiça no exercício da função e, surpreendentemente, o modelo de trabalho da categoria permanece o mesmo de trinta anos atrás (um servidor sozinho ingressando na residência de desconhecidos, sem qualquer segurança, para realizar todo tipo de ato constritivo).
Neste artigo, pretendemos realizar uma análise sobre os riscos do Oficial de Justiça, bem como tratar dos consectários desse reconhecimento. Inicialmente, trataremos dos perigos da atividade e, nesse contexto, das possíveis providências concretas e urgentes por parte da Administração Pública para mitigar os riscos. Posteriormente, cuidaremos da responsabilidade da União pela omissão na garantia de segurança aos servidores, da aposentadoria especial, do adicional de periculosidade ou insalubridade devido aos Oficiais, do adicional de fronteira e do afastamento das Oficialas das atividades de risco e insalubres. Encerramos com as considerações finais. Convidamos os interessados a aprofundar o debate em torno do tema com críticas, sugestões, elogios e, sobretudo, união e disposição para a luta em torno da efetivação desses direitos. Boa leitura!
2 Os riscos inerentes ao cargo e as providências para mitigá-los
Os casos de crimes contra Oficiais de Justiça no exercício de suas atribuições se apresentam em uma frequência tão elevada que este tópico poderia até ser dispensado. Não obstante, diante da falta de conhecimento generalizada sobre a atividade do Oficial, algumas questões precisam ser tratadas.
O primeiro aspecto a ser ressaltado alude ao próprio modelo de trabalho do Oficial. Com o aumento vertiginoso da violência nas últimas décadas, as diversas categorias de servidores públicos encarregados de realizar atividades externas e a praticar atos constritivos foram desenvolvendo técnicas de segurança para se proteger de delitos. Assim, os policiais, os auditores, os fiscais, os agentes de trânsito, entre outros, passaram a exercer suas atribuições com dois ou mais agentes, com porte de arma, mecanismos de comunicação rápida (rádio, por exemplo), investigação prévia dos riscos da diligência, levantamento de antecedentes criminais dos destinatários da diligência etc.
Entretanto, o Oficial de Justiça continua recebendo uma quantidade de mandados incompatível com uma atividade segura e sem qualquer informação acerca do ambiente da diligência ou do destinatário do ato. Ademais, a quantidade de mandados impede o trabalho em dupla ou com mais servidores.
De outro lado, o efetivo da Polícia Militar é insuficiente para o apoio do Oficial em todas as diligências, restringindo-se a diligências muito específicas (como a condução coercitiva, por exemplo). Outrossim, os agentes de segurança também não possuem pessoal suficiente para acompanhar os Oficiais nas diligências, além de, em alguns locais, não haverem recebido os equipamentos necessários para tanto.
Com isso, a despeito de toda violência social, os Oficiais se dirigem à casa de um desconhecido (que pode responder processos ou mesmo ter sido condenado por homicídio, estupro, roubo, entre outros crimes, ou por todos esses tipos penais) para realizar atos que causam uma grande insatisfação, como afastamento do lar, penhora, arresto, sequestro, busca e apreensão, despejo, reintegração de posse etc. Caso aconteça algo na diligência, ninguém do Tribunal terá conhecimento enquanto o Oficial não se desvencilhar da situação de perigo.
A atividade do Oficial de Justiça acaba se aproximando muito daquela realizada pela polícia judiciária no que diz respeito aos riscos. Enquanto na fase de inquérito, os policiais realizam as intimações com todo o aparato de segurança (no mínimo, dupla de policiais, armados, treinados, com coletes balísticos e viaturas oficiais, e com pesquisas prévias dos riscos), por exemplo, na fase judicial, esse mesmo ato é praticado por Oficiais de Justiça sozinhos, sem arma e equipamentos de segurança, sem treinamento e sem qualquer informação sobre os riscos envolvidos.
Esse modelo de trabalho torna o Oficial extremamente vulnerável às reações agressivas dos destinatários da diligência. Inclusive, mesmo com muitos casos registrados, ainda identificamos uma cifra oculta, caracterizada pela existência de muitas situações sem registro. Isso porque o Oficial está submetido a uma sobrecarga de trabalho tão extenuante, que não consegue “perder tempo em uma Delegacia”. Naturalmente, o ideal é que todos os fatos sejam registrados para forçar os Tribunais a adotar as providências necessárias a fim de garantir segurança aos servidores.
Até o presente momento, os Tribunais não resolveram esse problema. Dessa forma, tendo como foco prioritário a segurança e a saúde dos Oficiais e, levando em consideração, nossa linha combativa, mas propositiva, passamos a arrolar sugestões para aprimorar nossa atividade.
2.1 Redução e limite de mandados
Uma das maiores conquistas dos trabalhadores ao longo da história consiste no limite da jornada de trabalho. No Brasil, esse direito de estatura constitucional, também encontra habitat na legislação que trata dos servidores públicos, incluindo os do Judiciário Federal, como, por exemplo, na lei 8.112/90 e na regulamentação interna dos Tribunais.
Entrementes, por mais incrível que possa parecer, o Oficial de Justiça não possui limite de trabalho. Ainda hoje, prevalece o entendimento de que todos os mandados expedidos devem ser cumpridos, independentemente da quantidade. Há dez anos isso significava um número até possível, mas hoje essa cifra foi triplicada com a ampliação do acesso à Justiça, tornando a carga insuportável.
Evidentemente, esse entendimento de cumprimento de todos os mandados padece de qualquer respaldo legal e os Oficiais não podem se submeter a uma jornada excessiva. Caso o cumprimento dos mandados extrapole a jornada dos demais servidores, os mandados remanescentes devem ser retidos para cumprimento posterior, mesmo porque os Oficiais sequer recebem o pagamento de horas extraordinárias (e estas também são limitadas no ordenamento jurídico).
Para se avançar na questão da segurança, a redução da já excessiva quantidade de mandados e a limitação a um número fixo (compatível com a jornada dos demais servidores) se mostra medida urgente. A questão do cumprimento de todos os mandados é um problema dos Tribunais e da União Federal e não dos servidores.
A solução perpassa pela contratação de mais Oficiais, pela otimização do trabalho (com envio obrigatório de citações e intimações pelo correio, pela utilização de sistemas eletrônicos para atos de comunicação de Procuradorias e grandes empresas, criação e ampliação de núcleos de investigação patrimonial etc.) e pela instrumentalidade processual, com a realização da citação e intimação em qualquer pessoa da família ou nas portarias, tratando-se de condomínio edilício, à guisa de ilustração.
Enfim, diversas providências são possíveis (e muitas já foram formalmente apresentadas), mas ficam a cargo dos Tribunais, que até agora não se esforçaram nesse sentido. No entanto, nós não somos gestores, razão pela qual o problema de cumprir todos os mandados é dos Tribunais. O nosso compromisso é com os Oficiais de Justiça e a prioridade absoluta é a segurança. A desculpa da quantidade de mandados jamais será justificativa idônea para expor a vida do servidor a risco.
A título de ilustração, o problema da segurança pública é crônico no Brasil, mas ninguém cogita obrigar um policial a trabalhar sozinho para combater o crime. Essa cultura de observar um protocolo de segurança deve ser estendida para os Oficiais. Portanto, a redução e o limite da quantidade de mandados distribuídos são medidas imprescindíveis para garantir a segurança dos Oficiais de Justiça.
2.2 Trabalho em dupla e utilização de mecanismos tecnológicos
A segunda medida para construir um modelo de trabalho mais seguro para os Oficiais de Justiça diz respeito ao trabalho, no mínimo, em dupla. Com a experiência que temos no trabalho policial (já que fui por quase sete anos policial rodoviário federal, com inúmeros cursos de abordagem, armamento, tiro, defesa pessoal etc), sabemos que quanto mais servidores envolvidos na diligência, menor o risco de reação pela parte. Ademais, as estatísticas apontam no sentido de que os assaltantes optam, preferencialmente, por agir contra pessoas sozinhas, principalmente mulheres. Assim, imprescindível que nenhum Oficial seja forçado a trabalhar sozinho.
Mesmo as diligências consideradas mais simples, como intimações, demandam o trabalho em dupla. Isso porque o risco da atividade do Oficial não se restringe à violência pelo destinatário da diligência, mas também pelo local perigoso a que o Oficial é obrigado a ir, inclusive em horários e dias mais arriscados, como à noite ou muito cedo, em finais de semana e feriados.
O trabalho em dupla – é importante destacar – não significa abdicar da flexibilidade de horário, necessária para cumprir os mandados. As duplas devem ser formadas por colegas que tenham afinidade e que gostem de trabalhar em horários parecidos. Não há nenhum prejuízo para o Oficial.
De outro lado, diante de um cenário com inúmeros recursos tecnológicos que podem auxiliar o Oficial, não podemos continuar trabalhando sem informações. Desse modo, estamos engajados no âmbito do TJ/DF em um aplicativo desenvolvido e instalado em tablets, que estão sendo entregues para os Oficiais.
O sistema ainda está sendo desenvolvido, mas estamos trabalhando para que algumas funcionalidades úteis sejam colocadas à disposição dos Oficiais. Faremos referência a três, que tratam da segurança, objeto deste artigo.
A primeira funcionalidade que solicitamos se refere ao botão do pânico. Assim, caso os Oficiais (já estamos pensando no trabalho em dupla) enfrentem uma situação de perigo, apertam um botão no tablet e imediatamente a Secretaria de Segurança do Tribunal, a Polícia Militar e os Oficiais de Justiça serão informados. Desejamos que alguém chegue no local em cinco minutos para cessar tempestivamente a situação de risco.
O segundo quesito de segurança que requeremos aos desenvolvedores do aplicativo remonta à pesquisa automática dos antecedentes criminais do destinatário da diligência. Caso haja registros, sem precisar de qualquer consulta do Oficial, uma luz amarela deve ser acesa, a fim de que o Oficial solicite o apoio da Segurança do Tribunal ou da Polícia Militar para a diligência.
A terceira funcionalidade alude ao acesso ao mapa de criminalidade das Secretarias de Segurança Pública. Ao selecionar o mandado para cumprimento, o Oficial já deve receber a informação se o local do endereço possui alto índice de crimes, incluindo os horários e dias mais comuns das ocorrências.
O aplicativo envolve diversas outras questões que podem apresentar benefícios ao trabalho do Oficial, como utilização da tecnologia do e-hailing para cumprimento do mandado pelo Oficial mais próximo do endereço (semelhante ao Uber), coleta de informações em sites de classificados para sugerir um valor ao Oficial no caso de avaliações de bens, bloqueio de endereços diligenciados anteriormente etc. Mas trataremos desses temas em um trabalho futuro.
2.3 Transferência das conduções coercitivas para a Polícia
Outra questão que precisa ser alterada para garantir a segurança dos Oficiais concerne às conduções coercitivas. Com a natureza jurídica de uma prisão processual cautelar, no modelo atual não há segurança para os Oficiais realizarem esse ato.
Ainda que alguns Tribunais tenham regulamentado o apoio obrigatório da Polícia Militar para a diligência, o fato é que após levar a testemunha, vítima ou mesmo o réu (neste caso, a depender do entendimento) recalcitrante, de maneira forçada para a audiência, o Oficial de Justiça retorna para a mesma localidade de onde retirou a pessoa à força, só que sem a companhia da polícia.
Isso gera um risco muito alto de retaliação, além de se mostrar desnecessário. Se a polícia já irá comparecer obrigatoriamente na diligência, ela mesma poderia conduzir a pessoa sem a necessidade da presença do Oficial de Justiça, que apenas se expõe. Portanto, da mesma forma como ocorreu com as prisões, mesmo as de natureza civil, neste momento as conduções coercitivas devem ser transferidas para cumprimento pelos órgãos policiais.
2.4 Parceria com órgãos policiais
A parceria com os órgãos policiais também se mostra de grande relevância para a construção de um modelo mais seguro para os Oficiais de Justiça. Inclusive, já estamos em contato com instrutores da Academia Nacional da Polícia Federal para nos auxiliar no desenvolvimento de um método de trabalho para os Oficiais de Justiça, de maneira a mitigar os riscos da atividade.
Ademais, pretendemos a realização de diversas palestras e cursos para os Oficiais, demonstrando o tipo de abordagem que reduzirá ao máximo os perigos. Essa parceria deve ser permanente. Assim, solicitaremos que os Tribunais realizem convênios com o objetivo de facilitar essa troca de experiências.
Naturalmente, o intuito não é transformar o Oficial de Justiça em um policial. Todas as técnicas serão adaptadas para as necessidades e características do cumprimento de mandados por parte de servidores do Judiciário. No entanto, diante do interesse científico dos especialistas em segurança dos órgãos policiais e da possibilidade de contribuirmos com a exposição da nossa realidade, certamente chegaremos a um formato seguro e possível.
2.5 Porte de Arma e equipamentos de segurança
Como já noticiamos amplamente, estamos trabalhando pela aprovação de alguns projetos de lei no Congresso Nacional para conquistar o porte de arma funcional aos Oficiais de Justiça (MP 693/15 e PL 3.722/12). Não obstante, enquanto esse direito não for concedido, os Tribunais podem solicitar à Polícia Federal o porte para os Oficiais que desejarem e que realizarem os cursos necessários para tanto.
Os Tribunais ainda devem oferecer treinamento para os Oficiais, como tiro, manutenção de armamento, cuidados com a arma na abordagem (técnicas para que a arma não seja tomada), manutenção básica etc. O porte de arma é necessário e requer um preparo constante de maneira a atingir sua finalidade.
Da mesma forma, os equipamentos de segurança (como coletes balísticos e armas de choque, por exemplo) são absolutamente necessários para conferir segurança aos Oficiais. Assim, os Tribunais devem fornecer imediatamente esses itens de segurança. Não podem os Oficiais continuarem a ser os únicos agentes públicos sem colete balístico, mesmo nas diligências mais arriscadas.
2.6 Viaturas caracterizadas e motoristas para Oficiais que desejarem
Diante de um cenário de completa depreciação da indenização de transporte dos Oficiais de Justiça, muitos colegas têm apresentado a demanda de renunciar ao valor pago pelos Tribunais para compensar os gastos com o cumprimento dos mandados em veículo próprio. Desse modo, os Tribunais devem oferecer veículo caracterizado e motorista para o Oficial de Justiça que quiser dispensar a indenização de transporte.
Com efeito, evidentemente, não há qualquer obrigação de o servidor colocar o patrimônio particular à disposição do Estado. Soaria absurdo que um policial fosse obrigado a realizar diligências em seu veículo particular, no entanto esta é a realidade do Oficial de Justiça.
Também a legislação é muito evidente no sentido da natureza facultativa do cumprimento das diligências em veículo próprio. Nesse sentido, o art. 1º do decreto 3.184/99, ainda que tratando do Poder Executivo, dispõe expressamente sobre a opção do servidor. No edital do concurso de Oficial de Justiça, ademais, em relação ao qual a Administração fica vinculada, não há qualquer obrigatoriedade de o candidato possuir veículo e sequer de possuir carteira de habilitação.
Contudo, na prática os Oficiais possuem acúmulo de função, já que também são obrigados a desempenhar a função de motoristas. Os Tribunais não oferecem motoristas, nem veículos, e o transporte público não é capaz de permitir o cumprimento de nem 10% dos mandados distribuídos atualmente, além de expor os Oficiais a mais riscos. Portanto, aos Oficiais que desejarem, imprescindível o fornecimento de veículos caracterizados e de motoristas para viabilizar o cumprimento dos mandados.
3 Responsabilidade pela Omissão dos Tribunais
Aprofundando sobre o tema da segurança dos servidores, uma questão deve ficar muito clara: a responsabilidade para garantir a integridade dos servidores é dos Tribunais. Não há qualquer dúvida, seja no plano legislativo, jurisprudencial ou doutrinário, de que o empregador deve adotar todas as providências para mitigar os riscos das atividades perigosas, sob pena de responsabilidade objetiva.
O amplo conhecimento sobre os riscos da atividade não exime o empregador na adoção de medidas de segurança. Muito pelo contrário. Neste caso, as providências se tornam ainda mais necessárias e de natureza cogente. A lei 8.112/90, em seu art. 69, estabelece que haverá permanente controle das atividades de risco, o que não é cumprido hoje em relação aos Oficiais de Justiça. Não temos notícia sequer de levantamento de estatísticas dos Tribunais a esse respeito.
Então, na medida em que os Tribunais não adotaram providências suficientes para mitigar os riscos a que expõem os seus Oficiais de Justiça, devem indenizar por danos, materiais e morais, as vítimas de delito no exercício da atividade. Portanto, as entidades devem propor ações coletivas que visem à reparação dos colegas.
Para além disso, a medida judicial deve ainda requerer obrigação de fazer, no sentido de que os Tribunais passem a adotar medidas efetivas que garantam a segurança dos seus servidores, sob pena de multa. O direito dos servidores se mostra absolutamente cristalino e os Tribunais não podem continuar atuando como se nada estivesse ocorrendo.
4 Aposentadoria Especial
Também já divulgamos diversas vezes o trabalho que realizamos pela aprovação do projeto de lei que cuida da aposentadoria especial dos Oficiais de Justiça (PLP 330/06). Trata-se de medida justa e necessária para uma categoria que corre tanto risco quanto aquelas já beneficiadas com o tempo reduzido de contribuição.
O desgaste físico e mental decorrente da atividade de risco impõe a compensação para o servidor. O benefício para a sociedade do exercício da atividade do Oficial de Justiça enseja uma medida compensatória para aqueles que se submetem a condições insalubres e perigosas.
Ressalte-se que a sujeição a essas condições de trabalho prejudiciais à saúde deve ter um tempo reduzido, sob pena de dar azo à incapacitação do servidor. Cuida, outrossim, de medida atrelada ao postulado da isonomia, uma vez que balanceia as condições de trabalho para a aposentadoria (seria injusto que um servidor submetido a condições mais desgastantes para a sua saúde se aposentasse com o mesmo tempo de contribuição do que aquele que exerce atividades em um ambiente normal).
Digno de registro, a esse respeito, que sentimos falta da atuação institucional dos Tribunais para que a categoria logre êxito nesse intento, absolutamente justo. A valorização dos servidores também beneficia o Poder Judiciário. Não é à toa que o projeto de lei de remuneração dos servidores do Judiciário é de iniciativa exclusiva do Presidente do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores e dos Tribunais de Justiça (art. 96, II, “b”, da Constituição Federal). Assim, importante que os diversos órgãos do Poder Judiciário ajudem na aprovação do projeto de lei que concede a aposentadoria especial aos Oficiais de Justiça.
5 Adicional de Periculosidade ou Insalubridade
Outro corolário do reconhecimento do cargo de Oficial de Justiça como atividade de risco alude ao pagamento do adicional de periculosidade ou de insalubridade. Atualmente, os Oficiais Federais não recebem qualquer desses adicionais sob a alegação de que a Gratificação de Atividade Externa já compensaria esses fatores. No entanto, essa afirmação não encontra respaldo na legislação, senão vejamos
A Gratificação por Execução de Mandados (GEM) foi instituída pela lei 10.417/02 sob o fundamento da dedicação integral e exclusiva ao cargo, bem como dos riscos inerentes. Todavia, com o advento da lei 11.416/06, a Gratificação por Execução de Mandados foi substituída pela Gratificação de Atividade Externa (GAE; art. 16), sem qualquer menção aos pressupostos da lei anterior. Essa lacuna precisa ser preenchida pelo intérprete, pelo que atribuimos para a GAE a compensação pelos inconvenientes da atividade externa (sol excessivo, chuva, poeira da estrada, mosquitos de zonas rurais, doenças associadas aos riscos ergonômicos por passar diversas horas dentro do veículo, diligências em locais com esgoto a céu aberto, horas sem um banheiro com um mínimo de higiene, falta da estrutura protetora do ambiente forense, com colegas, seguranças e policiais à disposição etc).
Trata-se de valor atinente às próprias dificuldades do cargo. A distinção dos adicionais de periculosidade e de insalubridade em relação à GAE é tão evidente, sob o ponto de vista jurídico, que esta gratificação possui natureza permanente, ao passo que os adicionais cessam com a eliminação das condições ou riscos que os ensejaram, conforme a dicção do § 2º do art. 68 da lei 8.112/90.
Assim, o adicional de periculosidade ou de insalubridade deve ser pago imediatamente aos Oficiais de Justiça. Nos termos do art. 68 da lei 8.112/90, os servidores que laboram com habitualidade em locais insalubres ou exercem atividade perigosa, fazem jus ao pagamento de um adicional sobre o vencimento.
A seu turno, a Lei nº 8.270/91, em seu art. 12, fixa os percentuais dos adicionais de insalubridade e de periculosidade. Por essa razão, os Oficiais também devem ser beneficiados com esse diferencial na remuneração.
6 Adicional de Fronteira
Outra questão decorrente dos riscos da atividade do Oficial remete ao pagamento do adicional de penosidade para aqueles lotados em região de fronteira, conforme previsto no art. 70 da lei 8.112/90. Naturalmente, esse benefício deve ser estendido para todos os servidores que laboram nesses locais, contudo os Oficiais sofrem especialmente com essas lotações porque trabalham na rua, expondo-se mais aos riscos.
Esse tema já foi objeto de debate na Fenajufe e vem recebendo a atuação de sindicatos combativos. No entanto, faz-se mister a união de várias entidades para que esse projeto saia do papel. É inadmissível que a omissão do governo em regulamentar um direito por mais de vinte anos seja utilizado como desculpa para a negativa aos servidores.
No âmbito do MPF, o adicional de atividade penosa já foi regulamentado pela Portaria 633/10. Assim, para os servidores daquele órgão que trabalham em faixa de fronteira (150 km da fronteira), em regiões da Amazônia Legal e com população inferior a 200.000 habitantes e nos Estados do Acre, Amapá, Roraima e Rondônia, é pago o adicional na razão de 20% do vencimento básico.
Desse modo, de grande relevância a regulamentação desse direito pelo Poder Judiciário. Isso irá beneficiar os Oficiais de Justiça e os demais servidores que se sujeitam a condições de vida mais difíceis para oferecer justiça a toda a população.
7 Afastamento das Oficialas gestantes/lactantes das atividades perigosas
O último consectário do reconhecimento do risco dos Oficiais se refere ao direito das Oficialas de Justiça gestantes ou lactantes a se afastarem das atividades perigosas ou insalubres durante esse período. Conforme a previsão do parágrafo único do art. 69 da lei 8.112/90, as Oficialas nessas condições possuem a prerrogativa de, durante a gestação e a lactação, exercerem suas atividades em locais não perigosos e salubres.
Portanto, também esse direito deve ser cobrado dos Tribunais. Não se pode admitir que uma Oficiala de Justiça gestante passe, com toda a sensibilidade que esse especial estado envolve, pelos riscos inerentes a uma reintegração de posse de imóvel. O próprio sistema jurídico veda essa situação.
8 Considerações Finais
A segurança dos Oficiais de Justiça tem sido negligenciada há muitos anos. Assim, as entidades representativas devem atuar de forma unida e articulada para consolidar o reconhecimento do cargo de Oficial de Justiça como atividade de risco, bem como lutar pelas suas consequências jurídicas.
A atuação deve englobar medidas judiciais (ação de indenização contra a União ou os Estados, por danos materiais e morais, além da obrigação de fazer, adotando providências de segurança sob pena de multa), medidas políticas (com utilização da recente Frente Parlamentar em Defesa dos Servidores do Judiciário da União e do Ministério Público da União), medidas institucionais internas (dialogando e propondo medidas para os Tribunais), medidas institucionais externas (com apoio da OAB, do Ministério Público, da Defensoria Pública e das Procuradorias Federais, Estaduais, Distrital e Municipais; providências relevantes para reduzir a carga de trabalho dos Oficiais), e diálogo com a imprensa e com a população (com matérias tratando do tema, palestras, congressos e realização de audiências públicas).
Ademais, além de todas as providências referidas ao longo do texto, torna-se de grande relevância o levantamento estatístico dos crimes contra Oficiais, com um diagnóstico das situações mais arriscadas para atuarmos estrategicamente na mitigação dos riscos. Para qualquer caso de violência, imprescindível a devida divulgação, de maneira a chamar a atenção dos Tribunais e exigir providências.
Mas a grande preocupação é que esse tema esteja sempre na pauta. Não existe uma fórmula mágica para garantir a segurança dos servidores. Medidas precisam ser adotadas e, frequentemente, avaliadas para verificar se estão atingindo os seus objetivos.
Nesse sentido, por todas as razões acima expostas, entendemos que a segurança dos Oficiais de Justiça deve ser sempre um tema prioritário da Fenajufe, da Fenassojaf, dos Sindicatos de base e das diversas Associações de Oficiais. Temos uma fé inabalável de que juntos conseguiremos construir um novo modelo que resguarde a vida e a integridade dos dedicados Oficiais.
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