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Novo CPC. Coisa julgada inconstitucional e ação rescisória - Revogação do prazo decadencial de seu trânsito em julgado

Qualquer decisão transitada em julgado, contrária a acórdão do STF, pode ser rescindida mediante ação rescisória, de acordo com o novo CPC.

26/1/2016

A coisa julgada, firmada no inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição da República, tem como objetivo principal dar segurança jurídica às decisões, as quais não podem ser desconstituídas a não ser em casos especiais, através da ação rescisória, ou querela nulitatis insanabilis ou, de acordo com o novo Código de Processo Civil, quando for ela inconstitucional.

Sendo a Constituição a lei Magna e devendo todas as demais normas legais, bem como decisões judiciais, curvarem-se ao seu entendimento, entende o novo Código de Processo Civil que uma decisão transitada em julgado, contrária ao texto constitucional, será passível de ser sanada mediante ação rescisória, obedecido o prazo bienal para sua interposição em decorrência do próprio princípio de segurança jurídica e em razão da efetividade das decisões judiciais.

Nas decisões do STF, de acordo com a inserção do parágrafo 3º do art. 102 da Constituição Federal de 1988, de acordo com uma das modificações trazidas pela EC 45, foi estabelecido o requisito da repercussão geral para as questões constitucionais em litígio quando da apreciação do recurso extraordinário, artifício estabelecido com o objetivo de diminuir a intensa demanda de processos junto à Corte Suprema.

O parágrafo 2º do mesmo artigo acrescido, disciplina que, a eficácia erga omnes e o efeito vinculante, responsabiliza agente público da administração direta e indireta, na esfera federal, estadual e municipal que descumprir o determinado no julgado.

Dessa forma, qualquer decisão transitada em julgado, contrária a acórdão do STF, pode ser rescindida mediante ação rescisória, de acordo com o novo CPC.

Essa relativização da coisa julgada já estava reconhecida pela Consolidação das Leis do Trabalho no que concerne à execução, afirmando o parágrafo 5º do artigo 884 celetista, ao tratar dos embargos à execução e da sua impugnação, que:

Considera-se inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal.”

Muita crítica decorreu dessa abertura na imutabilidade da coisa julgada material com a possibilidade de perda da imperatividade e dos efeitos do comando da sentença que acoberta.

Nesse sentido já defendia Coqueijo Costa, in Direito Judiciário do Trabalho, Forense, p. 390, 1978:

A coisa julgada é qualidade da sentença e de seus efeitos , e não efeito da sentença. Consiste, pois, em uma qualidade: a imutabilidade da sentença e seus efeitos, ou seja, a autoridade, e resulta dessa imutabilidade.”

Essa alteração constante do parágrafo 5º do artigo 884 da CLT, acrescida também ao parágrafo único do artigo 741 do Código de Processo Civil, quando se trata de embargos do devedor, se fez através da MP 2.180/01, a qual, por inúmeros juristas foi entendida como inconstitucional, não só por afronta à Carta Magna como também no tocante à expedição dessas alterações por Medida Provisória, como bem lecionaram José Augusto Rodrigues Pinto (“A autoridade da coisa julgada diante da Medida Provisória n. 2.180/01” Revista LTr vol. 66,06/02) e Estevão Mallet (“A dupla inconstitucionalidade do parágrafo 5º do artigo 884 da CLT” Revista Ltr 66, 06/02).

Não há dúvidas que a doutrina e a jurisprudência seguem no sentido de privilegiar o devedor em detrimento do credor, da coisa julgada e do título executivo.

Exemplos disso são as exceções de pré-executividade para discutir matéria de mérito, cautelares e medidas de antecipação de tutela em sede de rescisória, ações declaratórias e anulatórias de título executivo e a própria relativização da coisa julgada.

O novo Código de Processo Civil, seguindo nessa esteira, na verdade não relativizou a coisa julgada com possibilidades outras de ser excepcionada fora do contexto do instituto da rescisória, mas maquiou, ao meu ver, a relativização já existente na execução, como uma das viabilidades de afastamento da coisa julgada mediante a referida ação rescisória, ampliando suas hipóteses.

E mais, na verdade possibilita-se a rescisória de forma mais alargada do que os dispositivos que entendem inexigível a coisa julgada na execução, porque os mesmos, elaborados em época anterior à EC 45, admitiam os embargos à execução nos casos específicos em ADIn quando, pelas novas alterações do CPC, caberá rescisória contra todas as decisões que contrariem lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo STF, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo STF como incompatível com a CF, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.

Tratando do cumprimento definitivo da sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa, Capítulo III do novel CPC, diz o artigo 525, parágrafo 12 que:

Para efeito do disposto no inciso III do parágrafo primeiro deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso”,

Estabelecendo o parágrafo 13 do mesmo artigo que, “no caso do parágrafo 12, os efeitos da decisão do STF poderão ser modulados no tempo, em atenção à segurança jurídica”.

E esclarecendo o parágrafo 14 que “A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no parágrafo 12 deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda”.

No alcance desses parágrafos do artigo 525 do novo CPC, estamos a apreciar a viabilidade, já anteriormente existente, de embargar a execução entendendo não ser exequível o título ou exigível a obrigação.

Entretanto, o parágrafo 15 do referido artigo 525 abre os caminhos da rescisória após o trânsito em julgado da decisão exequenda, se a decisão do Supremo Tribunal Federal for posterior ao seu trânsito, conforme se vê abaixo:

Se a decisão referida no parágrafo 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.”

Vejam bem e, na realidade, estamos frente à revogação parcial da coisa julgada: a qualquer momento em que o Supremo Tribunal Federal decidir de forma contrária à coisa julgada, esta poderá ser objeto de ação rescisória, mesmo após os dois anos decadenciais que lhe davam a garantia constitucional de não ser mais alterada, uma vez que esses dois anos serão computados do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF.

______________

*José Alberto Couto Maciel é sócio-fundador da banca Advocacia Maciel.





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