O Brasil vive um momento muito particular em sua história recente. Os escândalos de corrupção, as operações da Polícia Federal e as prisões de empresários e políticos têm trazido à discussão valores como ética e honestidade.
Corrupção não é novidade no Brasil. O que é novo, de fato, é a resposta e a mobilização da sociedade e das autoridades competentes.
Independentemente das operações policiais e da atuação do Ministério Público, o Brasil busca um novo arcabouço para combater a tão conhecida corrupção.
Não à toa, a Lei 9.613/98, que trata dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, foi significativamente alterada em 2012.
No mesmo sentido, a Instrução CVM 301/99, que dispõe sobre a mesma matéria, vem sofrendo alterações quase anuais.
Com o intuito de combater com mais eficiência a lavagem de dinheiro e o terrorismo, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) acaba de divulgar o Ofício-Circular SIN nº 5/2015.
O documento traz orientações relativas aos procedimentos de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo a serem observados por administradores de carteira, agências de rating, consultores e prestadores de serviços de representação e custódia de investidores não-residentes.
A CVM informa ser incorreta a prática usual de reporte a apenas uma autoridade, via de regra, o Banco Central ou a própria CVM. O COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) também deve ser comunicado.
A Autarquia esclarece que a lavagem de dinheiro costuma ser realizada por meio de diversas operações ou estruturas fragmentadas com o objetivo de dificultar a visualização do todo pelas pessoas e instituições fiscalizadoras. Assim, a análise de apenas parte da estrutura pode ser insuficiente para identificar a prática da lavagem de dinheiro. Daí a necessidade de reporte ao COAF de quaisquer operações suspeitas, nos termos descritos na Instrução CVM 301.
Em relação aos representantes e custodiantes de investidores estrangeiros, a CVM reforça a necessidade de um processo mais rígido de acompanhamento de operações envolvendo tais clientes, especialmente (mas não exclusivamente) nos casos de trusts e sociedades com títulos ao portador.
Esse "tratamento especial" deve ser dedicado também aos investidores de private banking, as chamadas pessoas politicamente expostas e aos cotistas de fundos de investimento exclusivo, especialmente em razão da possibilidade de influência na gestão de seu patrimônio.
A verificação de indícios de lavagem de dinheiro deve ser realizada mesmo nas operações em bolsa, já que o direcionamento de recursos é possível em operações de baixa liquidez. Ademais, de acordo com a CVM, o COAF já recebe informações de indícios de lavagem de dinheiro em operações em bolsa. Em outras palavras, não prospera o argumento de que o ilícito não ocorreria em tal ambiente por não ser viável a identificação da contraparte da operação.
No caso específico de fundos de investimento, a obrigação de acompanhamento e reporte aplica-se tanto ao administrador quanto ao gestor. Afinal, a verificação satisfatória de operações suspeitas muitas vezes depende da atuação coordenada de ambos.
Cabe ao gestor do fundo (ou da carteira administrada) fazer as devidas análises relativas à lavagem de dinheiro e terrorismo nas negociações e operações. Isso significa, por exemplo, analisar a contraparte e monitorar a faixa de preço dos ativos. Ainda, o gestor deve manter adequado programa de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.
O Ofício também reforça a obrigação de o gestor (pessoa jurídica) reportar inclusive as informações suspeitas realizadas por seus sócios e funcionários, sem prejuízo das medidas tomadas pela instituição contra tais indivíduos. Nas palavras da CVM, "a comunicação de operações suspeitas realizadas por determinado participante do mercado, mesmo quando envolvam seus funcionários, não representa uma evidência da prática de irregularidades pelo comunicante, mas, muito pelo contrário, apenas reforça e corrobora a existência e a manutenção de controles internos robustos, efetivos e adequados ao que dispõe a Lei".
Por fim, o Ofício ainda traz esclarecimentos sobre o conteúdo e forma dos reportes a serem feitos ao COAF e sobre a declaração negativa anual a ser prestada pelas pessoas que não tiverem feito nenhum reporte no ano anterior.
Em suma, o documento expõe o entendimento da área técnica da CVM sobre as principais questões que norteiam e permeiam o combate e a contínua prevenção à lavagem de dinheiro e ao terrorismo. Em tempos de inúmeros escândalos de corrupção, trata-se de importante diretriz ao mercado.
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*Ricardo dos Santos de Almeida Vieira é advogado do escritório Barcellos Tucunduva Advogados e especialista em mercado financeiro e de capitais.